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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 16/02/2023

Sobre criar e maturar.

She Co: “Para mim, a magia está mais no processo criativo”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 16/02/2023

She Co é o nome com que Francisco Monteiro assina o seu projeto que o estreia na edição de um disco a solo. She Co é, também, o título de um EP que não se prende a géneros e que reflete anos e anos de decisões e indecisões. O disco é house, é techno, é funk, mas principalmente variações. É seguro dizer que é um trabalho que cresce com o ouvinte. Começamos a escutá-lo num sítio, mas a viagem transforma-nos e ouvimos uma vez. Voltamos a ouvi-lo, as novidades passam a ser outras — já não é o mesmo disco.

Francisco Monteiro é um programador, e acontece também ser um dos fundadores da editora CIGA239, que desde 2020 tem levantado ondas em Coimbra. O Rimas e Batidas esteve à conversa com ele sobre o curta-duração que lançou em Novembro do ano passado.



Como é teres um disco que demorou uma data de anos a fazer finalmente cá fora?

Sinto-me aliviado, porque já saiu, e tu sabes que demorou a sair, também por preguiça e desmotivação. Depois, sei lá, às vezes passa o tempo e eu, sinceramente, não sou uma pessoa muito motivada a lançar, acho que para mim a magia está mais no processo criativo, e não no marketing e etc. Acho que estendi ao máximo o tempo para lançar o disco, estiquei a corda das piores maneiras possíveis para esticar a corda. Se calhar poderia ter feito as coisas de outra maneira, mas o feeling é positivo. Estou feliz com o resultado.

Já é um disco cuja criação demorou mais do que 3 ou 4 anos. 

Sim, é um disco com alguns anos na “cozinha”, mas agora já não tenho assim tanto output como tinha. Se calhar nessa altura produzia muito mais do que produzo hoje… Fazia muitos projetos, muitos projetos de caca, e este disco é uma coletânea de faixas que têm o meu cunho pessoal, não são somente faixas de techno ou de house, mas sim projetos com que me identifico, que são o meu género. Depois de muitos anos a fazer coisas diferentes, queria que estas fossem aquelas que me definem, que classificam as músicas como minhas.

Dentro desse tempo a tua abordagem musical também se alterou, não? Tanto que, desde que começaste a fazer o disco, já devem ter saído mais umas três ou quatro versões do Ableton. Isso se calhar está presente no disco, ou alteraste todo o processo?

Sim e não. Na verdade, algumas das coisas que fazia ou que fiz no início agora já não faço tanto, estou interessado em fazer outras coisas. Tento sempre experimentar e surpreender-me a mim próprio. Para mim não existe um crescimento que seja estritamente linear. Há uma variação de abordagens técnicas, mas também nestes ultimos dois anos em que me propus a terminar o disco, a fazer a mistura de ideias que eram boas mas não estavam no ponto. Acabei por pegar nessas ideias, trabalhá-las e criar um disco com o qual estava confortável e que me sentia bem a lançar.

No disco, nota-se que há muitos recursos de outras músicas e géneros musicais, e tendo tu feito rádio durante muito tempo, como é que achas que essa prática influenciou o teu trabalho?

Seria difícil dizer como é que não influenciou. É praticamente 90 ou 95%, ou seja, a grande marioria das influências que tenho e que uso para samples, muitas delas, ou quase todas, partiram do período em que estive na RUC. Uma das músicas que lá tenho, que se chama “magia negra”, é homenagem a um programa que fiz durante muitos, com o Filipe Cravo e o João Gaspar, que se chama Magia Negra, que é sobre música negra. Foi uma pequena homenagem que fiz, como podia ter feito muitas outras, porque a rádio foi uma grande parte da minha vida durante muitos anos. Decididamente retirei de lá muitas influências. Por isso sim, o resultado é influência direta.

O teu disco tem capa e elementos de design que remetem à infância e a uma área de Coimbra que é o sítio onde cresceste. Parece que, no seu todo, contas uma história.

Sim. Eu não diria que estou a contar uma história, porque eu fui fazendo as músicas, e se calhar ao olhar para trás consigo lembrar-me das cosias que estava a viver na altura, mas não as fiz com um fio condutor do início ao fim. É mais uma seleção de um processo creativo que fui desenvolvendo ao longo dos anos. É um disco muito pessoal, fui tentando fazer algumas colaborações ao longo dos anos, mas a maior parte das coisas que fiz foram sozinho. Então acaba por ser importante, para mim, que aquilo traduza essa realidade que é “eu próprio, eu sozinho”, trazer alguma parte da minha vida, do meu trabalho para esse disco. E era indispensável não mencionar os sitios que serivram para criar a minha experiência.

Contas com poucas colaborações ao longo do teu percurso.

Eu tenho um método em que  começo a trabalhar e só paro quando deixarde ter ideias. E às vezes é-me dificil parar. Quando entro no flow é dificil comunicá-las sem fazer imediatamente, por isso, a não ser que esteja a fazer algo quando estou a colaborar, é bastante difícil para mim comunicar com alguém em estúdio. Se calhar ainda não arranjei o parceiro de colaboração em que as coisas resultem 100%, ou então tenho de alterar o meu método de colaboração. Mas de certeza que eventualmente vai correr bem com alguém. Por isso, não sei bem se é o meu estilo de produção.

E este é um disco que acaba por ser um conjunto de vários momentos.

Eu fi-lo nesse sentido, por isso espero que sim. Agora se as coisas resultam ou não, já vai alguma distância. 

Achas que deve existir essa versatilidade?

Para mim, tinha de ter. Como eu tenho essa dimensão, naquilo que eu faço e naquilo que eu quero mostrar, era obrigatório ter essas dimensões. E eu, sendo uma pessoa que gosta de sair à noite, dançar e ouvir música eletrónica… Essa música que eu ouço acaba por me influenciar e quis traduzir isso neste album, de forma a que isso tivesse a minha voz.

Agora falando no futuro. Há mais alguma coisa que estejas a planear lançar?

Eu tenho alguns trabalhos já feitos. Já pensei em juntar algumas coisas. Mas tenho de voltar para a drawing board. Mas aquilo que me tem chamado mais é o facto de ter desenvolvido o meu processo de produção. Sinto que estou a chegar a algum sítio em termos de metodologia, e isso está-me a chamar mais do que pôr algo cá fora. Ultimamente sinto que tenho feito coisas interessantes e talvez um dia queira perder mais 2 anos a misturar um album. 

Daqui a 5 anos voltamos a falar então…

Sim [risos].


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