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Fotografia: Pedro Francisco
Publicado a: 23/03/2024

A metamórfica artista irano-neerlandesa fez as delícias no arranque da edição deste ano.

Sevdaliza no Sónar Lisboa’24: brutalismo e sensualidade de mãos dadas

Fotografia: Pedro Francisco
Publicado a: 23/03/2024

Pode até enganar à primeira vista. Em 2024, o Sónar Lisboa está visualmente muito idêntico ao da edição passada. O coração do certame continua a ser o Pavilhão Carlos Lopes e o recinto erguido em torno da sala plantada no Parque Eduardo VII é bastante parecido àquele que nos recebeu em 2023, apenas com alguns cirúrgicos ajustes, todos eles para melhor, como, por exemplo, a nova e mais calma zona de restauração ligeiramente afastada do epicentro das festividades. Voltam a somar-se pontos na estética e no ambiente do festival, mas mantém-se o calcanhar de Aquiles de sempre: a (má) acústica da sala escolhida para receber os principais espectáculos.

Porém, o Sónar Lisboa evoluiu e ganha agora pontuação extra pela mudança de paradigma na programação. Se há um ano a coisa soube a pouco por mais se assemelhar a um aglomerado de DJ sets no centro da cidade, 2024 trouxe vários concertos para um cartaz que por si só, independentemente do formato, é também bastante recheado de nomes sonantes da cena electrónica. Por outro lado, não deixamos de sentir pena do palco da Estufa Fria que se perdeu de uma edição para a outra e que tinha uma vibe muito própria — este ano, esse local ficou resevado para uma instalação da ZABRA patente nos 3 dias do evento entre as 9h e as 22h.

No primeiro e menos movimentado dia, que contava apenas com 6 espectáculos na agenda, estava aquela que era a artista que mais queríamos ver. Sevdaliza foi a grande atracção da noite de 22 de Março e actuou perante uma plateia a meio gás, muito provavelmente pela pouca adesão do público à contida inauguração — há dezenas de outros nomes para ver hoje e amanhã e, por isso, espera-se uma fauna mais bem composta em termos de número de festivaleiros. Ainda assim, com o Pavilhão Carlos Lopes a cerca de metade da sua lotação total, a recepção à metamórfica artista irano-neerlandesa foi bastante calorosa e facilmente se entendia que estávamos rodeados de verdadeiros fãs e não apenas de curiosos. A espera para ver a cantora de volta ao nosso país foi demasiado longa, ainda mais para quem perdeu as oportunidades passadas, como quem aqui vos escreve.

Sevdaliza já não é a mesma que conhecemos em 2015, muito graças ao single “That Other Girl”, que infelizmente não trouxe consigo para o palco SonarClub. Mas isso não é obrigatoriamente mau. A faceta camaleónica que sempre demonstrou na sua música fê-la desdobrar-se pelo lado mais negro e experimental da pop electrónica em início de carreira, mas a maturidade permitiu-lhe abrir os seus horizontes para outro tipo de balanços, algo que retira um certo peso — e umas quantas descargas de bass — às suas prestações ao vivo em 2024. Por um lado, perde-se a toada cavernosa de outros tempos; por outro, este é, de facto, um show bem mais abrangente e capaz de seduzir públicos em qualquer tipo de festival.

A confirmação de Sevdaliza para o Sónar Lisboa’24 foi uma das melhores notícias que tivemos nos últimos tempos, mas confessamos ter tido algum receio que a sua performance não incluísse outros músicos em palco para a auxiliarem a interpretar os temas ao vivo. Felizmente, isso não se verificou, e apesar da parca banda, apenas com mais um baterista e um teclista, o trio em cena foi mais do que suficiente para fazer justiça ao que pedem as canções da artista nascida no Irão e criada nos Países Baixos, que ganham novos contornos aquando tocadas em tempo real.

A sua sedutora postura em cima do palco faz um óptimo contraste com o brutalismo sónico que faz emanar pelas colunas. Sevdaliza consegue roçar a hyperpop sem nunca a ser por completo — embora possa muito bem ser vista como parte dos primórdios desse vibrante novo movimento —, envolver-nos de trevas através de alguns dos seus temas passados e, acima de tudo, misturar todo o tipo de cadências electrónicas dentro de um mesmo espectáculo que ficou a escassos minutos de bater a uma hora de duração, evocando trip hop, techno ou até baile funk sem nunca destoar.

No alinhamento que preparou para voltar a brindar aos seus fãs em Lisboa, não demorou até soltar “Human”, o tema de maior expressão na sua discografia. Houve direito a remisturas, inéditos e até faixas que divide com outros artistas — como Linn da Quebrada, Grimes ou Tokischa —, que obviamente não compareceram no concerto mas cujas vozes se fizeram escutar através de backing tracks. “Oh My God”, “Darkest Hour”, “Ride Or Die” ou “Human Nature” foram algumas das canções que se puderam ouvir, num claro revisitar de praticamente toda a sua obra nestes seus primeiros dez anos de carreira.


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