[KAASH PAIGE]
Pequena e concentrada é a única forma de descrever a cantora de Dallas, no Texas, que apesar do pouco público presente não poupou energias na sua estreia fora da América do Norte. Com pouco tempo para fazer a festa, como de resto tem sido regra para as primeiras performances do dia, Kaash Paige dispôs apenas de 20 minutos de tempo de “antena”. Mas aquilo que para muitos pode parecer pouco é mais do que suficiente para quem souber aproveitar a oportunidade e a verdade é que o espeCtáculo ainda nem ia a meio e a cantora já estava nos braços do público.
Com um elenco 100% feminino, a artista apresentou-se em palco só com uma DJ e hype woman que esteve encarregue de animar metade do público enquanto a outra metade carregava o peso da pequena rapper de 21 anos que ao som de “Girlfriend” procurava uma namorada no meio da plateia. Só podemos deduzir que não a encontrou porque minutos depois estava la em cima a entoar mais refrões e a mergulhar novamente sobre a plateia.
Mais tarde e já nos bastidores, Kaash Paige confessou ao Rimas e Batidas que o público a recebeu da melhor forma apesar da distância. Afinal, a maior parte dos fãs europeus ouvem-na desde o Reino Unido – mais concretamente de Londres, disse-nos a própria.
Apesar de ser uma estreia em Portugal, Paige tem uma relação com o Rolling Loud, que considera “parte da sua trajectória”, já que esteve “em todos os seus festivais” enquanto artista, e justifica a atitude que carrega em palco como uma consequência das influências de Travis Scott e companhia, tendo mesmo tatuado “Rage” no pescoço como lembrete.
Mas como uma estreia nunca vem só, Paige trouxe-nos música nova e inédita. “The Fallout” foi o título do tema dado a ouvir aos ouvidos portugueses (mais britânicos) que deixa água na boca em relação a uma carreira que ainda tem muito para mostrar.
“O tema sai este mês ou para o próximo e é sobre duvidar de alguém e como isso, por vezes, se intromete no nosso caminho. Essas pessoas não podem parar a minha vida, sou a favorita de Deus”, explica em relação à história por trás da nova faixa que se deverá fazer acompanhar de outras três ou quatro que deverão ser lançadas até ao final do ano.
– João Daniel Marques
[BABY KEEM]
Não, Kendrick Lamar não apareceu para estreitar “family ties” nem para fortalecer relações entre “range brothers” com Baby Keem. Mas o primo de K-Dot deixa bem patente, desde o início, que o sangue (frio) que lhe corre nas veias vem da mesma matéria rara que compõe o do autor de Mr. Morale & The Big Steppers.
Entra de cara trancada, capuz de um hoodie da Nike SB (desenquadrado com as calças da Prada) na cabeça — que nunca chegou a cair —, expressão corporal inanimada, postura defensiva, entre uma mão colada à cintura e uma impenetrável poker face. A atitude, apesar de anti-clímax, acaba por transparecer uma presença do mais thug que já se viu de um rapper em palco por estes dias. Um homem em missão, compenetrado na sua performance.
O “hooligan” desafia os adeptos à sua frente: “How many day one Baby Keem fans on this motherfucker?” — deixa que nos leva a “Moshpit” e, adivinhe-se, aos ajuntamentos homónimos. Mas o êxtase — sempre do público, nunca do artista — estava reservado para os momentos proporcionados por temas divididos com os grandes. A imprescindível “range brothers”, com Kendrick Lamar, e a inusitada “Praise God”, de Kanye West, prometiam ser os pontos altos de uma actuação consistente e imaculada, até que a grande questão se impõe: “Have you ever been punched in your motherfuckin’ face?” desarma o próprio autor, até então estoicamente inquebrável, que se solta — ligeiramente — e incita aos incontornáveis mosh pits que dão por terminada a sessão de rap puro e duro.
– Paulo Pena
[SKEPTA]
Por motivos óbvios, o concerto de Skepta era um dos mais aguardados da noite, se não de todo o festival. Ao fim ao cabo, o Big Smoke até parecia estar a tocar em casa e a reação a “Bellator”, o primeiro tema, confirmou isso mesmo perante uma plateia que o acompanhou do início ao fim.
O tempo ia passando e o concerto só ia aquecendo enquanto uma plateia já composta se ia comprimindo nas filas dianteiras ao som de hits como “Papi Chulo” ou “Energy”, que espoletou um coro impressionante entre a plateia num dos momentos mais completos do festival até então. E sempre acompanhado por back vocals, o artista é a prova de que um concerto de hip hop em 2022 não tem que ter playback, não parando de “cuspir” do início ao fim.
Pelo meio só houve espaço para uma escalada da energia sentida na plateia que culminou em “Praise The Lord”. O rapper britânico interpretou o tema pela primeira de duas vezes ao longo da noite, mas sozinho. O original de A$AP Rocky, que soma já mais de 822 milhões de plays no Spotify, seria mais tarde entoado em equipa, mas só no último concerto do segundo dia.
Ainda assim, um dos maiores representantes do grime apresentou mais convidados do que qualquer artista até então e, durante três temas, entregou o comando do mesmo ao companheiro e amigo Frisco que interpretou “Red Card”, banger que inclui participações de Skepta, Shorty, Jammer e JME, que por esta altura ainda tocava no palco secundário. Cerca de 15 minutos depois, contudo, JME pisaria mesmo o palco principal do Rolling Loud para partilhar “That’s Not Ne”, um clássico de 2014.
Por fim, a actuação terminou como qualquer grande produção deveria encerrar – créditos de arrasar e que fazem abanar a cabeça. Uma espécie de final à blockbuster — que é o que ele é.
– João Daniel Marques
[PLAYBOI CARTI]
Garantiram-nos que a coisa ia começar por “Stop Breathing” e que ia passar, eventualmente, por “Sky”, “Off The Grid” (de Kanye West), “Shoota” (com Lil Uzi Vert) ou “Miss The Rage” (de Trippie Redd). Dito e feito. Mas antes da “coisa” (à falta de melhor termo para resumir o que viria a acontecer na hora seguinte) arrancar, o próprio Tariq Cherif, co-fundador do Rolling Loud, apelou à imensa multidão que se afastasse das grades e que zelasse pela segurança de todos. Basta ver um qualquer concerto de Playboi Carti na Internet para entender este pedido inesperado.
Mal o “vampiro” entra em cena, as precauções ficam de parte e a plateia entra num estado de euforia inédito nesta edição do Rolling Loud. A guitarra espalha o caos com toda a sua distorção e Carti começa a disparar gritos alucinantes sem parar. Vulto negro aos saltos, de rastas no ar e língua de fora, o allien que mudou o paradigma do SoundCloud rap exorciza-se frente às milhares de lanternas apontadas ao seu semblante aterrador. Do pouco que se descodifica desta língua extraterrestre, ouve-se repetidamente “When I go to sleep, I dream about murder”. Não custa mesmo nada a crer nestas palavras.
Ainda assim, após o choque inicial, o entusiasmo vai-se desvanecendo com a uniformidade da excentricidade. Não para o público, é certo. Esse está num patamar ao qual dificilmente há-de voltar no resto do festival. Mas para quem — mesmo com boa vontade — não consegue entrar no universo de Playboi Carti, o show torna-se, imagine-se, aborrecido. Uma energia que só chega a quem parte a quarta parede e entra a fundo nesta dimensão — e, pelos vistos, há mesmo muita gente que já passou, há muito, para o outro lado.
– Paulo Pena
[A$AP ROCKY]
Skepta até podia ser o favorito da maior parte do público, mas era ao gigante A$AP Rocky quem certamente reuniria mais consenso entre a plateia. O concerto arrancou à hora marcada enquanto lá atrás ainda podíamos ouvir Trippie Redd, que ia tocando no palco secundário, em alto e bom som. Talvez por isso houvesse uma estranha sensação de espaço entre as secções adiantadas da plateia que em palco se deparava com um crash test dummy insuflável gigante, e nada mais.
Embora tenha aberto o concerto com um tema menos óbivo, Rocky rapidamente captou a atenção dos mais desatentos com “A$AP Forever”, antecipada por um curto a cappella e seguida de “Praise the Lord”. Skepta acabou mesmo por subir ao palco para interpretar o tema e acabou por ficar para mais umas surpresas.
“Taylor Swift” terá sido uma delas. Este aparenta ser o nome do próximo tema da ligação Londres–Nova Iorque, cujo título julgamos ser bastante descritivo do tema narrado. Mas, como qualquer estreia absoluta ao vivo, deixou o público sem pé. Rocky apercebeu-se, puxou a faixa atrás, ditou palavras de encorajamento e amor próprio e, aí sim, com o público do seu lado, debitou novas rimas.
A atitude manteve-se e, apesar dos mosh pits espontâneos que se iam multiplicando, o rapper não deixou de puxar pelo público entusiástico que chegou a interromper por questões de segurança. Ainda assim, quem assistia não poupou nas manifestações físicas ao som de “Babushka Boi” ou “MAZZA” – o tema de slowthai com participação de Rocky.
“LSD” teria sido uma excelente maneira de terminar o espectáculo, mas só se não tivesse regressado para nos presentear com mais uma bomba – “Sundress”.
– João Daniel Marques