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Fotografia: Cláudio Ivan Fernandes
Publicado a: 15/05/2022

Afinar a máquina e descobrir para onde ir ao vivo.

Rocky Marsiano & Meu Kamba Jazz no Lux Frágil: colocar a primeira pedra

Fotografia: Cláudio Ivan Fernandes
Publicado a: 15/05/2022

Na quinta edição das Noites Azuis, uma primeira vez: a estreia em palco de uma ideia que ainda está em construção. Rocky Marsiano, também conhecido como D-Mars e parte do histórico grupo de hip hop Micro, aceitou o desafio de mostrar a linguagem jazz que anda a desenvolver numa quinta-feira quentíssima na capital portuguesa, juntando-se a Rodrigo Amado, Vicente Booth e António “Toni” Duarte para uma formação inédita.

Inédito não é exagero, como se pôde perceber pelo soundcheck, altura em que ainda se ultimava orientações necessárias para levar o barco a bom porto, ou pelo jantar pré-concerto, momento em que facilmente se percebia que ainda se estava a trabalhar a relação entre os quatro músicos. A certa altura, e enquanto se estreitava laços, os álbuns Fado Bailado (Rão Kyao) e Encontro Com Don Byas (Amália Rodrigues) serviram de bons exemplos de exercícios em que o fado ganhou com a saída dos eixos mais tradicionais e rígidos. Apesar da ligação não ser óbvia com o que se passaria mais tarde, havia ali um ponto relevante: a abertura de todos os membros a não se fecharem em qualquer tipo de caixa e estarem dispostos a cruzar, distorcer e trocar as voltas àquilo em que tocassem.

Nas três pessoas convocadas por Marko Roca, as histórias individuais são importantes para se perceber o que cada um trouxe para a mesa: Booth é guitarrista de banda larga que vai praticando o novo jazzismo português nos Mazarin; Amado, que até contribuiu para The Pyramid Sessions (2005), é músico de topo e notado a nível europeu — e talvez seja o saxofonista preferido de Allen Halloween; Toni foi DJ nos Zona Dread, MC nos Mundo Complexo e actualmente, para além de ser guitarreiro, mantém a chama do percussionismo bem acesa.

Hip hop e jazz já vinham cruzados nestas escolhas de Marsiano, por isso o tom estava definido, e o resultado foi intrigante e envolvente. A apresentar “músicas com títulos de trabalho”, uma alusão a ainda estarem embrionários — “Amigo Meu” e Tens a Mania” são exemplos –, ou até uma dedicatória a Count Basie, os temas foram-se revelando, na sua maioria, com beats a piscarem o olho à década de 90 do rap americano e instrumentações que nos encaminhavam para sítios distantes, que tanto podiam ser quentes e áridos como tropicais e húmidos — houve um momento em que parecia estarmos num ambiente sinistro como o de “Survival of the Fittest” só que com um twist brasileiro nos drums. Difícil de imaginar… mas resultou. E, bem, o knowhow (mais do que explícito no programa Da Raiz ao Ritmo) do produtor e líder de banda é argumento suficiente para comprovar que está a par dos sabores das mais diferentes latitudes — do deserto às ilhas. Não era garantia de que conseguisse fazer resultar, mas deu certo.

Das sessões de 2005 em que ousou experimentar usar o jazz como matéria sampladélica principal saltou apenas “Hold Of Me” para o alinhamento do espectáculo, neste caso com uma versão diferente, mas com a presença em palco de um dos colaboradores originais: Amado aparece nos créditos da última faixa de The Pyramid Sessions.

Num início de noite que, pelas temperaturas (musicais e não só), poderia muito bem ter acontecido no terraço, Rocky Marsiano comandou na MPC Live (e até segurou brevemente no microfone para rimar), António “Toni” Duarte adoçou com percussões imaginativas, Vicente Booth surgiu mais discreto e competente a aplicar a sua camada e Rodrigo Amado funcionou como uma espécie de vocalista (e, sim, a sua voz é o saxofone) que extravasou sem se esquecer que estava a trabalhar para o colectivo. Com uma plateia receptiva (e bailadora), o primeiro teste não se complicou, ficando a promessa que mais concertos e um disco para formalizar as canções só trará mais ângulos positivos para as notas azuis com fundo português.


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