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Fotografia: Manuel Abelho
Publicado a: 03/03/2021

Em nome da justiça e da igualdade.

RBTV: uma conversa entre Mamadou Ba e Pedro Coquenão

Fotografia: Manuel Abelho
Publicado a: 03/03/2021

Em 2018, o realizador Fábio Silva e o colaborador do Rimas e Batidas Manuel Abelho sentiram a necessidade de promover e gravar um encontro entre o luso-senegalês Mamadou Ba e o luso-angolano Pedro Coquenão, duas vozes activas na luta contra o racismo e a intolerância.

Esta conversa poderia ter sido captada em qualquer altura pelos dois videógrafos, mas houve um tópico quente em concreto nesse ano que os levou a estender o convite a estes activistas para se sentarem à mesa a conversarem na Casa Mocambo, em Lisboa, sobre este contínuo combate anti-racista: o início do julgamento de 17 polícias por agressões a jovens da Cova da Moura na esquadra de Alfragide.

Três anos depois, o panorama nacional assistiu a alguns desenvolvimentos positivos na caminhada para uma sociedade mais justa, mas os atrasos provocados por uma certa agenda ligada à extrema-direita acabaram por trazer à tona os mesmos problemas de sempre. Em declarações prestadas ao ReB, o dirigente do SOS Racismo reflectiu sobre essas mudanças:

“O que mudou foi a capacidade das pessoas racializadas a disputar centralidade política no jogo democrático, conquistando visibilidade e possibilidades de maior representatividade agora e no futuro. Tornou-se impossível manter o tabu do racismo, tornando inadiável o seu combate. Nalguns aspectos estamos melhores, nomeadamente, no que toca à capacidade de luta, mobilização, visibilidade e representatividade. O feito inédito da eleição de três mulheres negras para a Assembleia da República, todas oriundas da mobilização social, simboliza o início desta ruptura com a ordem colonial e racista. Mas também há um retrocesso gigantesco, pois pela primeira vez, em democracia, o fascismo se normalizou e entrou na Assembleia da República, transformando-se no megafone institucional do racismo estrutural. Este retrocesso democrático torna-nos piores enquanto comunidade política porque constitui uma ameaça à solidez democrática do regime, com mais custos para pessoas racializadas negras e ciganas.”

O artista que assina como Batida também examinou os acontecimentos que nos conduziram até 2021 e a uma lamentável petição pública (assinada por mais de 30 mil pessoas) que exige a expulsão de Mamadou Ba de Portugal:

“O debate era praticamente inexistente ainda há poucos anos. Lembro-me das reações epidérmicas ao discurso do General D e à primeira geração de filhos de imigrantes do pós-25 de Abril e do assassinato do Alcindo Monteiro. Lembro-me também da preocupação com os imigrantes de leste e do desconforto com a primeira vaga de brasileiros. Sendo que, durante todo este tempo, a comunidade cigana foi sempre um ponto de encontro para definir os limites do racismo — ‘Não sou racista mas… os ciganos… eles não se integram!’. A crise de 2010 mostrou um país como tantos outros no seu pior: disposto a lavar dinheiro, especialmente angolano, e com visto vendidos oficialmente em troca de investimento. Portugal é depois banhado de turistas, na procura da beleza natural do país, da comida e da segurança que dizem sentir, claro, mas também da ideia de um multiculturalidade que temos dificuldade em assumir como parte da nossa identidade; rapidamente nos submetemos ao lucro sem critério ou respeito pela dita memória que tanto tentamos preservar mas que nos recusamos em restaurar à luz dos valores que dizemos serem a base desta sociedade. Nos últimos anos aconteceram muitas coisas dentro e fora do país mas poucas terão sido tão esclarecedoras como o ataque à comunidade cigana e a recusa da existência de racismo em Portugal como argumentos principais de um candidato à Presidência da República. O meio milhão de eleitores que subscreveram essa linha de pensamento obrigam-nos a pensar. Porque o silêncio, a moderação e a relativização da grande maioria, já cá estão há muito. Desde que Portugal se achou no direito de colonizar, ser o maior transportador de escravos e de se retratar historicamente como um colonizador suave. O que mudou para além disto? Talvez tenha ficado mais claro um sentimento em muitos de nós de que ser neutro é ser cúmplice e de que, em nome do amor, da justiça e de uma sociedade mais igual, temos de ser assertivos e tomar partido. No essencial, não mudou e está nas mãos da maioria moderada definir o que acontece. A nós, os que sentem esta causa como sua, cabe-nos manter a firmeza.”

Em carne e osso contra os discursos de ódio e as suas formas de violência, apresentamos por aqui um vídeo que se propõe a revisitar o passado recente e a despertar alguma sensibilidade sobre a importância de uma comunidade mais preocupada com a inclusão em vez da exclusão.


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