[TEXTO] Núria R. Pinto [FOTO] Direitos Reservados
Nem só com Pulitzers e Grammys se faz jus à importância que o rap conquistou no mercado actual (e no mundo) mas a verdade é que Pulitzers e Grammys muito contribuíram para que “quem de direito” voltasse a encarar o género como uma manifestação social com missão pedagógica sem grandes precedentes.
Depois de Kendrick Lamar ter recebido o prémio que galardoa os melhores projectos na área da composição musical, do jornalismo e da literatura pelo “virtuoso conjunto de canções unidas pela autenticidade vernacular e pelo dinamismo rítmico, que captam a complexidade da vida afro-americana moderna”, eis que surgem do Brasil notícias não menos animadoras. E não, ninguém recebeu um prémio. Foi muito melhor que isso.
Sobrevivendo no Inferno, o álbum de 1997 dos gigantes Racionais MC’s, viu a sua leitura, ou melhor, escuta, tornar-se obrigatória num dos exames de acesso à Universidade Estadual de Campinas, uma das melhores e mais importantes faculdades públicas, não só do Brasil como de toda a América Latina. O álbum é uma das três obras de “leitura obrigatória” na categoria de poesia ao lado das obras A Teus Pés, da poetisa brasileira Ana Cristina César e, nada mais nada menos, que Luís de Camões, com sonetos seleccionados pela Unicamp.
Se é verdade que não é a primeira vez que faixas de rap brasileiro “saem” em exames ou provas de acesso ou que outros álbuns, como é o caso de Tropicalia ou Elis & Tom, integram (embora raramente) as leituras obrigatórias de acesso a universidades brasileiras, é também verdade que colocar um álbum de rap como uma obra de leitura obrigatória coloca o género musical num patamar de excelência.
Num momento de tensão sócio-económica preocupante no país, talvez olhar para a realidade através dos versos de quem a canta possa ser um bom presságio. Nunca se sabe quando é que um Ministro da Educação pode estar a ler o que escrevemos por aqui…