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Publicado a: 23/05/2017

PZ: “Gosto de fazer as pessoas rir com a música”

Publicado a: 23/05/2017

[ENTREVISTA] Ricardo Farinha [VÍDEO/FOTOS] Sebastião Santana [EDIÇÃO DE SOM] Tiago Galvão

Nos tempos livres de gerir com o irmão a editora Meifumado Fonogramas, Paulo Zé Pimenta é PZ. Ou pelo menos talvez fosse essa a ideia, antes de a personagem musical que veste pijamas nos concertos alcançar mais sucesso, conquistar fãs e ocupar cada vez mais tempo. O quarto álbum deste projecto, Império Auto-Mano, foi lançado em Fevereiro. O Rimas e Batidas conversou na Kate Skateshop com o músico do Porto a propósito do novo disco.

 



A tua música é característica por ter bastante humor, ironia, sarcasmo… achas que essa é a melhor forma de criticares ou observares de forma crítica o que te rodeia? É isso que fazes neste Império Auto-Mano ou, na verdade, isso é apenas aquilo que tem sido dito sobre o álbum?

Tenho feito isso ao longo dos meus álbuns todos. Este já é o quarto. Acho que o primeiro, Anticorpos, é mais pessoal: é mais uma crítica a mim próprio, mas também falo do mundo exterior; acho que no Rude Sofisticado já surge a parte mais humorística e nonsense em algumas músicas, como a “Croquetes” ou o “Passeio”. Mas algumas têm mais a ver com a minha observação do mundo, outras são apenas observações corriqueiras e de aspectos da cultura portuguesa que me interessam. Acho que o meu processo de fazer música é não me censurar. Há certas músicas que me levam para um tema… neste Império Auto-Mano tenho uma música que é “Fome de Lulas”. Fiz o beat, toquei o sintetizador e só me surgia “eu tenho fome de lulas”. E apesar de estar a tentar fazer uma coisa mais séria não me saía da cabeça aquele refrão. Então tive de fazer uma música à volta de uma receita de lulas da minha mãe. Mas gosto sempre de tomar temas mais sérios e tentar expô-los de uma maneira simples, irónica, meia nonsense, exactamente para criar um bocado aquele choque e tentar ter um discurso mais directo, quase de conversa comigo mesmo.

Gostas de ver programas de humor ou segues comediantes?

Sim, gosto. Monty Python, por exemplo, é uma influência grande. Mesmo a nova vaga de humoristas portugueses também sigo. Às vezes nem são tanto os comediantes em si. Basta andar na rua para uma pessoa ver sempre coisas absurdas e fazer observações absurdas da realidade. Acho que alguns temas são mais sérios, não me considero um comediante, nada disso. Mas gosto de, na música, fazer rir as pessoas através do nonsense ou do surreal. E até há certas músicas que nem eu próprio sei se estou a brincar ou a falar a sério. Gosto dessa ambiguidade da coisa. Também gosto de gajos americanos de stand up. Quando me rio, gosto de rir a sério. E gosto mais do humor meio nonsense, meio negro, que, apesar de não ser pensado ou consciente, transponho para a minha música.

Diferenciaste um pouco os teus discos quando disseste que o primeiro tinha uma crítica mais pessoal e os outros abordavam mais questões da sociedade, como é que achas que a evolução dos teus álbuns tem sido… este é notoriamente mais maduro?

Tem a ver com as fases da vida. Realmente estou mais maduro, mais velho, já estou estabelecido na minha vida há muito tempo e estou totalmente bem comigo próprio. Acho que neste álbum se calhar tive um cuidado maior na parte da estética musical, mesmo das partes instrumentais, acho que é mais variado e ecléctico. Mas ao mesmo tempo parece-me um álbum mais consistente. Isso é o que penso agora, não quer dizer que depois não possa olhar para trás e pensar “porra, este álbum é uma merda”. Mas neste momento sinto que é o meu melhor álbum e acho que todos os artistas sentem isso quando lançam um álbum, se não não o lançariam. Para quê fazer a mesma coisa? Depende sempre do estado em que estás e neste quis também pôr uma crítica aos tempos modernos no próprio título do álbum, Império Auto-Mano.

 


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O audiovisual tem um papel importante na identidade artística de PZ. Costumas pensar nos vídeos enquanto fazes os temas ou só depois, quando o disco está pronto?

Primeiro é fazer as músicas: definir o álbum, as músicas que vão entrar, os beats que estão na gaveta e que vou aproveitando para cantar alguma coisa por cima. Neste caso do Império Auto-Mano, há umas mais antigas do que outras. Fiz algumas em 2016 mas havia outras mais antigas. E esse é todo um processo em que não estou a pensar em videoclipes. No fim, quando o disco está pronto, começo a pensar quais são os singles de que gostava de fazer videoclipes e às vezes nem é bem a questão do single. São músicas em que, dadas as limitações, que tenho de fazer as coisas sozinho, consigo ter ideias simples e que se tornem também diferenciadoras. É um processo que também gosto de fazer, como o das músicas: estar sozinho em casa, sem a pressão de ninguém, totalmente à vontade… danço as danças mais estranhas quando estou sozinho. Mas também gosto de dar essa responsabilidade a outros realizadores, nomeadamente ao Alexandre Azinheira, que é quem normalmente costuma fazer as produções maiores. Mostro-lhe sempre o disco quando está a ser feito e ele começa a ter ideias para as músicas. Às vezes não é uma específica, ele está a ouvir o disco e “olha gostava de fazer esta”. Foi assim que surgiu com a maior parte, como a “Croquetes”, “Caga Nela” e “Neura”. É um pouco as duas vertentes: o do it yourself, sozinho em casa, ou aproveitar o facto de hoje em dia podermos filmar com o telemóvel onde quisermos… foi isso que me levou a fazer a “Olá”, que é apenas selfie mode pelo Porto inteiro, e também em minha casa. Acho que a limitação gera criatividade.

Achas que depois de teres lançado os singles “Cara de Chewbacca” e “Croquetes” tiveste um boom que te fez ter um núcleo mais duro de fãs de PZ?

Sim, acho que essas duas músicas foram as que chegaram a mais pessoas. E depois houve pessoas que foram ver o que eu fazia e começaram a aparecer nos concertos e a comunicar comigo no Facebook. Acho que a “Neura” também foi um bom single. E neste [disco] acho que também está a acontecer isso: se calhar com públicos novos, porque algumas delas são mais diferentes do que eu costumava fazer — não deixando de ser eu —, como a “No Meu Lugar”. É o Império Auto-Mano a invadir Portugal [risos].

 



Sentes que existem pessoas que, não conhecendo o teu trabalho, não percebem a mensagem mais profunda que muitas vezes existe em faixas que podem não aparentar ter esse tipo de conteúdo?

Sim, mas o mais engraçado é que tenho notado que há mais comentários desses, de pessoas a dizerem no YouTube “olha, esta música tem mais do que parece”. Claro que também há pessoas que não percebem, e há sempre os haters. É cada vez mais residual. Mas acho que é um bom sinal, porque obviamente não estou aqui a fazer música para agradar a toda a gente. Estou a fazer música, primeiro, para me agradar a mim próprio, e depois acho que são coisas com que as pessoas se relacionam. Há outras pessoas que se calhar ouvem a música de maneira diferente, eu sei que algumas delas não são fáceis de consumir à primeira, mas tenho tido comentários engraçados. Hoje abri o YouTube, vi um comentário na “Olá” a dizer “gosto e odeio ao mesmo tempo, a minha cabeça está confusa” ou “não era suposto eu gostar disto, o que está a acontecer?” Acho que é um bocado aquela estranheza que leva as pessoas a terem o contacto com a música pela primeira vez a estranharem um bocado. Só espero que depois se entranhe e percebam o que estou a fazer.

Em relação à Meifumado Fonogramas e ao teu trabalho lá, falando do equilíbrio entre o lado mais criativo, de criar música, e o de gerir uma editora, achas que…

É lixado.

São coisas bastante diferentes.

São, mas ao mesmo tempo é terapêutico porque sempre tive um fascínio pela música e por ter uma editora. Não estava à espera é que o meu trabalho de PZ também tomasse tempo. E depois tenho de vestir duas máscaras diferentes. “Agora sou o PZ, agora sou a Meifumado”. Então às vezes até tenho reuniões na minha cabeça, entre a editora e eu próprio [risos]. Mas o facto de ter artistas tão fixes como Corona, Keso, Mind da Gap, Expeão, que me levam também a sair do meu mundo e a envolver-me no trabalho deles, entusiasmar-me e tentar pôr cá fora da melhor maneira possível… Isso até ajuda o meu ego a desinchar [risos], e a não estar sempre focado no PZ ou noutra coisa que eu faça. E dá-me uma perspectiva global da música. Estou sempre à procura de coisas novas que me interessem. O conceito da Meifumado é a criação e edição de boa música. Enquanto isso acontecer, vou estar contente. O objectivo não é tanto vender discos, mas sim criar um conceito musical. Fazemos as coisas por gosto e pela paixão pela música. Enquanto der para subsistir, está tudo bem. Mas já tenho alguma experiência para separar as águas.

Não entrevistando agora o PZ, mas sim a Meifumado…

Lá está [risos].

Têm projectos para este ano de que possas falar?

Tenho… ainda não está totalmente confirmado, por isso preferia não divulgar. Mas temos ideias interessantes e começámos a série da Meifumado Takeover, que são concertos que vamos fazer. O primeiro [em Março] foi no Plano B: a ideia é pegar nos artistas da Meifumado e amigos, várias pessoas com quem fomos tendo contacto ao longo destes anos, e que têm música de que nós gostamos. Tivemos os Corona e eu estive a fazer um DJ set, como costumo fazer. Tivemos também o DJ Cascais e os 7 Magníficos. E estamos a pensar ter uma edição mais de Verão de Meifumado Takeover com outras bandas e amigos.

 



O objectivo passa também por terem Meifumado Takeovers noutros sítios do país?

Sim, mas como o núcleo da Meifumado é aqui no Porto, vamos começar com calma, sem levantar os pés e fazer coisas megalómanas. Começámos no Plano B, uma casa que conhecemos bem e correu muito bem. O segundo vai envolver o Plano B mas também outro sítio exterior, ainda não confirmado. A ideia é também ir para Lisboa.

A Meifumado também tem estado presente em Lisboa, não é?

Estamos a trabalhar com o Fred, na Kambas. O meu irmão está a trabalhar lá, por isso também se expandiu um bocadinho. É mais a área de produção, mas também de edição — e podem surgir bandas de Lisboa. É um intercâmbio, uma palavra muito moderna e pomposa, entre o pessoal de Lisboa e Porto que se relaciona com a estética da Meifumado.

Voltando ao PZ, ou ao músico Paulo Zé Pimenta, a tua música é bastante experimental no sentido de estares no teu quarto rodeado de caixas de ritmos, sintetizadores, experimentares bastante… por causa dessa vertente há outros projectos de outros tipos de música que gostarias de fazer num futuro próximo, além daqueles que fizeste no passado?

Sim, totalmente. Dentro das experimentações tenho não sei quantos… músicas somente instrumentais, que tenciono editar sob outro nome, brevemente. Agora estou mais focado no Império Auto-Mano e não posso dispersar. Quer dizer, estando no estúdio, no meu laboratório, a palavra de ordem é dispersar e fazer o que vem à cabeça. E às vezes as letras e os beats surgem muito do improviso, e mesmo alguns solos de sintetizador ou bases rítmicas. Também tenho outro projecto, Paco Hunter, que foi em 2008 que fiz com o meu irmão e aí estou a tocar guitarra e a cantar e está o meu irmão a tocar os outros instrumentos todos. Foi música que nos veio à cabeça: desde country a rock a funk cantado em inglês. Às vezes nem estou a cantar nada, ou sobre uma cidade a que nunca fui… adorei fazer esse álbum e foi um processo totalmente diferente. Tive outro, que já acabou, a Zany Dislexic Band… era totalmente improvisado, com uma estética meio electrónica mas eram, basicamente, jam sessions, muito à base de coisas psicadélicas. E também fiz outra coisa com o João Salcedo, também cantado em português mas totalmente acústico, que também tenciono lançar… por isso, o PZ é o meu escape pessoal, mas não quero que me consuma totalmente. Gosto de fazer outras coisas e espero fazer um Paco Hunter novo. Já tenho várias ideias para um novo álbum. E também tenho… há uma música que está no YouTube, a “For Sure”, cantada em inglês… o PZ não gosta muito das cenas em inglês, mas já tenho várias músicas que gostava de editar, se calhar através de singles. Vamos ver. A minha cabeça está sempre a pensar em música e quando quero escapar tenho a Meifumado que também trata de música mas pelo menos tira-me um bocado daquilo que é um bocado martírio de ter tanta coisa e querer acabá-la [risos]. Às vezes a parte mais difícil é a decisão do que se vai fazer a seguir e de como se vai fazer.

 


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