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Fotografia: Tomás Oliveira
Publicado a: 13/10/2022

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ProfJam: “O MDID é um álbum denso. Vai demorar algum tempo a digeri-lo”

Fotografia: Tomás Oliveira
Publicado a: 13/10/2022

Nada parece faltar a ProfJam, excepto eventualmente chegar ao céu. Sempre determinado a tocar o intocável e na iminência do lançamento do seu novo álbum, Música de Intervenção Divina, o rapper deu-se ao(s) outro(s) no palco principal do Iminente com um concerto renovado, novidades de deixar água na boca e mensagens que adivinham a possível direcção deste próximo projecto. Já no backstage, o artista respondeu às perguntas do Rimas e Batidas e falou-nos um pouco sobre ser-se uma influência, os seus dogmas e o que esperar de MDID, agora um passo mais perto de ser revelado, com o lançamento do single “AZTECA”, acabado de ver a luz.



Como foi o concerto de hoje, superou as tuas expectativas?

Eu gosto de baixar as expectativas, portanto é fácil superá-las. Mas superou no sentido em que descobri ali uma conexão que é rara; não acontece em todos os concertos e quando acontece é bué boa.

A que nível? Divino?

Sim, aquele espírito de estar em irmandade, sabes? Senti-me compreendido nesse aspecto com a malta. Também tentei dar essa interpretação às coisas, de explicar um bocado o que eu estou a fazer agora e ligar as pontas.

E tiveste muitos convidados também.

Tive o benji [price], o Lon3r [Johny], o Mike El Nite na back, o rkeat na produção lá naquele momento techno.

Cantaste também duas músicas novas, queres falar um pouco sobre elas? Uma creio que se chama “Dakar“-

E a outra é a “Azteca”. Estou a dar aquele teasingzinho, ‘tás a ver? Tenho tocado no final dos concertos a “Azteca” para arranjar maneiras também de comunicar a música.

O que queres passar com essas novas músicas?

Energia, essencialmente. Depois há outras músicas que são mais para decompor, outras são mais para sentir. E este álbum tem um bocado de tudo, um bocado mais do lado de sentir e o lado mais de entender. Há umas músicas mais argumentativas e estou curioso também para ver a reacção, porque vai ser um álbum denso. Mas estou entusiasmado também exactamente por isso, porque acho que vai demorar algum tempo a digerir isso. Vai ser fixe.

Consideras que haverá um equilíbrio? Porque há também estas músicas mais dançáveis como a “Dakar”.

A “Dakar” é um som… é uma roupa, sabes? O som é mais como uma travessia do deserto e o deserto aqui tem o lado religioso, relacionado com fazer uma travessia dos momentos mais desafiantes. Se calhar aqui de repente não dá para captar tudo, mas o som tem uma layer espiritual.

O pessoal vai ter de ir à Genius, para interpretar a cena.

Exacto, exacto [risos]. Vai ter de ir estudar.

Há alguma música de toda a tua discografia que gostes mais de cantar ao vivo?

Isso tem muito a ver com os momentos do espectáculo, não com a música, mas acho que a “Água de Coco” é das minhas melhores músicas, tenho bué orgulho nela por várias razões — com quem fiz as coisas, para quem fiz as coisas, a minha energia, o momento em que eu estava na vida; e acho que foi game changing para mim.

Mas para mim são todas especiais. Isto parece cliché, mas é mesmo verdade. Não é uma questão de preferência, é mais uma questão de análise, acho que é mais isso. Se eu analisar certas músicas, consigo perceber porque é que são mais uma coisa e são menos outra, mas elas vêm todas um bocado do mesmo sítio, que sou eu. E depois tem também a ver como eu as quero mostrar e comunicar. Tem o lado da fashion e da estética, como é que eu quero vestir esta mensagem e tem esse lado muito expressivo da mensagem.

Este ano celebraste os seis anos do teu álbum Mixtakes. O que achas que mudou mais desde essa altura na tua maneira de ser e criar enquanto artista?

Fui ganhando knowledge e noções de produção áudio. Com a experiência de fazer as coisas vais aprendendo: “para a próxima não vou levar duas baterias, vou levar três por causa das cenas”, esse lado mais técnico. Depois do lado de vivências… de certa maneira o que eu sinto é que tinha lá coisas que hoje em dia consigo entendê-las melhor, ou seja, acho que este álbum, Música de Intervenção Divina, vai ser um actualizar do Mário com 30 anos e onde a minha cabeça está agora, nesse plano mais espiritual. E o Mixtakes foi muito um abrir disso, então acho que não é bem uma diferença, é mais um actualizar. 

E não mudavas nada?

Nada. Até porque não dá para mudar.

Usas várias referências a filmes na tua música, fazes muitas menções do Matrix ou da Alice no País das Maravilhas, por exemplo. Porquê estas referências específicas? 

Mesmo essas duas referências ligam-se. A Alice no País das Maravilhas está no Matrix, o Matrix fala do “White Rabbit”; também tens a cena do Lewis Caroll da Alice em que ela segue o coelho para a toca, portanto eles têm pontos de contacto. Acho que o Matrix também se inspira na Alice no País das Maravilhas e não só. Eu tenho muitas referências a filmes, mas não de uma grande panóplia de filmes, porque eu não sou muito cinéfilo. Vejo filmes várias vezes, mas muitas vezes são repetidos.

E a quais voltas? Porque era isso que ia também perguntar, se recentemente viste algum filme que te inspirou.

Ultimamente o que eu tenho estado a ver são as séries dos Avengers da Marvel. Estive a rever alguns, porque nunca os tinha visto seguidos. Deixei um bocado os filmes e as séries, comecei a ver mais conteúdo como palestras e assim; e depois descobri que a realidade é mais interessante do que a ficção. E que a ficção se inspira na realidade. Entrei agora mais pelo lado da cena “real”. Vejo mais coisas da realidade do que da ficção. Também leio pouco, foco-me mais em ouvir, curto bué de decompor cenas. Vou ver uma aula sobre Friedrich Nietzsche, por exemplo — se quero saber sobre Nietzsche, então vou ouvir um professor catedrático falar sobre ele.

Há alguém que te inspire ou influencie actualmente?

Nesta fase estou muito fechado no meu mundo, não estou a absorver. Agora vou lançar o meu álbum e depois vou voltar a absorver. Portanto, neste momento, não posso dizer que tenha assim alguém que eu ache agora que me está a trazer coisas novas e que estou a retirar disso. Mas agora para a frente vou começar a ouvir mais coisas, os mesmos de sempre também. São fases: em vez de absorver, agora estou a expelir.



Andas a lançar muitos sneak peeks no Instagram que andam a deixar água na boca de quem te acompanha. O que é que nos podes dizer sobre o teu novo álbum e sobre o seu conceito de ser “música de intervenção divina”?

É uma brincadeira entre música de intervenção popular e a música de intervenção divina. E a dica assim resumidamente é: para resolver os problemas da sociedade, temos de ir à raiz e não aos frutos e aos ramos. E eu acho que a intervenção social intervém num ramo, [ou] num fruto, enquanto a intervenção divina intervém numa raiz. Ou seja, o combate à corrupção é feito no coração do justo, não são as leis justas que promovem a justiça, é a justiça que promove as leis justas. 

Algo que tentaste dizer no palco a certo momento também.

 De certa maneira, sim. Era algo parecido. O que estava a dizer lá era algo mais do género: se tu queres a justiça, tens de a querer também para ti. E se não a quiseres para ti, então tens de pedir perdão, tens de aceitar que existe o certo e o errado e pedires desculpa. Não podes afirmar que o mundo é injusto, mas quereres que situações injustas te beneficiem. Tens de acarretar tudo o que a justiça implica, inclusive uma coisa que te possa prejudicar porque tu foste injusto. É um bocado essa a dica. A justiça tem de ser transversal a todos, foi a dica que eu dei no espectáculo.

Esta parece ser uma nova era de ProfJam. O que achas que esperam de ti? E o que podem realmente esperar? 

Eu estou com a pica porque a malta não está bem à espera daquilo que vou fazer. E gosto também de trabalhar no silêncio, porque tenho ideia de que a malta não está bem preparada. Isto é aquela conversa de artista também [risos].

Mas mais a nível de mensagem ou de sonoridade?

Mais da mensagem.

Já pareces ter levantado um pouco o véu com a “Nada Me Falta”.

Sim, a malta diz que eu ‘tou todo queimado. Pá, se eu ‘tou todo queimado, já ‘tou queimado há bué tempo, portanto não é bem uma novidade. Daí ser um actualizar, ligar pontas, dar uns twists e eu acho que a malta não está bem preparada para me ouvir dizer merdas que já disse. Dizem que eu mudei e eu penso: “Mas espera lá, vê lá se isto agora não foi a mesma coisa que eu já disse”. Tu é que estás a dizer que eu mudei, quando não mudei. 

Se calhar foram elas que não interpretaram da forma esperada.

Ou, então, foram elas que mudaram, não sei. Mas fica para o álbum. 



Noutra das tuas mais recentes faixas “Fax” dizes que tens sonhos de dia e é a isso que chamas vida. Há algum sítio onde queiras chegar que ainda não chegaste?

Ao céu. Às vezes tocamos e sentimos algo parecido com isso, mas gostava de lá chegar.

E como é que lá chegas quando dizes que há momentos em que te sentes próximo?

Aqueles momentos como o que tive por exemplo hoje, no palco. Tive um momento ali no qual senti uma elevação, onde sentes que não tens um controlo da cena, mas que existe um substrato onde há uma ligação e que as pessoas conseguem elevar o espírito para não se odiarem; é isso que eu tento passar, com esforço. Não dá sozinho, temos de ser todos a querer um reino de Deus. Temos de ser nós.

Sentes que é algo guiado pela religião?

Sim, de certa maneira, mas para mim não é uma redução religiosa. Eu posso amar um muçulmano da mesma maneira que ele me pode amar a mim, não tem a ver tanto com isso, tem mais a ver com a intenção de querer um mundo melhor, não através daquele partido ou daquela religião, mas do amor e daquilo que sabemos que o é. Não é preciso explicar, porque dá aquele clique na espinha.

Encontraste paz no divino virando-te para a espiritualidade?

Não me virei, eu vim de lá.

Ainda tens alguma colaboração que gostavas muito de fazer?

Gostava de fazer um som com o Drake.

E porque não? Tivemos Snoop Dogg com David Carreira, foi uma coisa que aconteceu.

Mesmo a sério. Olha, Deus te ouça.

“I’ll never die, eu sou Osíris”. Depois de tudo isto, o que esperas que fique?

Depois de toda a música?

Sim, toda a tua música, todas as pessoas que influencias. És um role model para muita gente, tens muitos fãs que te adoram e respeitam. 

Eu penso muito nisso. Eu tenho uma oportunidade para comunicar com alguém. Eu ainda vou ser pó que aqui está. Então, eu também quero plantar sementes dentro das pessoas; e quando for velho vou estar com pessoas que foram influenciadas por mim; e aí há uma responsabilidade. E não é aquela conversa de que eu também desencaminho — tenho esse lado profano, eu sei disso. Mas, ao mesmo tempo, eu fui influenciado e sei o que é que é ter 16 anos e estar no secundário e ter ideias das quais não tenho assim tanto poder para me defender delas. Então, eu estou também um bocado a dar um escudo, do género: “mano, eu vou-te proteger nesta fase, e estou a tentar pôr-te uma semente que não é para entenderes já se calhar, mas que a minha música cresça contigo para quando tiveres 30 e voltares a ouvir os álbuns do ProfJam isso faça um clique diferente”. Esta é a minha ambição. Eu quero mesmo influenciar as pessoas.

E nessa altura que artistas ouvias?

Valete, o Sam [The Kid], o Regula. Um virado para uma cena mais política, o Halloween mais espiritual, o Sam The Kid mais das raízes da técnica e da mestria. É esse o meu objectivo maior, que o meu trabalho ficasse com o meu nome e quando falasses de Mário Cotrim o fizesses no mesmo nível que um Fernando Pessoa e esses autores. Esse é o meu último level artístico.

Carregas com leveza essa responsabilidade de seres uma influência?

Sim, porque eu também me ilibo, ou seja, a mensagem és tu que a fazes. Eu estou-te a dar força, não te estou a guiar, não quero guiar nada; não deixes é que ninguém te diga que não tens poder, porque tens.  Nem eu, nem ninguém. É essa a ideia.


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