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Fotografia: Hugo Lima/NOS Primavera Sound
Publicado a: 10/06/2022

Nas imediações do palco principal.

NOS Primavera Sound’22 – Dia 1: fazer contas à música

Fotografia: Hugo Lima/NOS Primavera Sound
Publicado a: 10/06/2022

É real: voltámos oficialmente ao Parque da Cidade do Porto para a primeira edição em três anos do NOS Primavera Sound. A falta de andamento — o possível resultado da pausa a que fomos obrigados — terá de servir de justificação plausível para não termos conseguido chegar a tempo de ver em acção projectos portugueses como Throes + The Shine e Pedro Mafama, por exemplo. Quando finalmente conseguimos entrar, a direcção que tomámos foi a do palco Super Bock, local onde SPELLLING (“com três Ls”, como fez questão de reforçar), a substituta de última hora de Georgia, já se prestava a encantar (ou, pelo menos, a tentar) quem não arredou pé dali depois dos autores de Aqui.

Com o sol a bater ainda com alguma força, Chrystia Cabral apareceu na companhia de teclista, baterista, guitarrista e baixista para, lá está, dar-nos um pouco dessa magia musical com que nos surpreendeu em Mazy Fly (2019) e nos agarrou em The Turning Wheel (2021). Porém, as propriedades mágicas parecem ter-se perdido entre o estúdio e o palco: o embrulho da voz com o som da banda (as teclas apareciam praticamente isoladas a transporem essa feitiçaria) não resultou da melhor maneira nesse ambiente, mesmo que o espaço envolvente até favorecesse o ritual místico. O que não faltou mesmo foi a entrega de parte a parte — Tia lá em cima e o público (principalmente aquele que se concentrava na frente) em baixo a devolver a energia. Estamos, definitivamente, de regresso.

Sem termos caído no encantamento e antes de irmos fazer contas, uma paragem breve no palco Cupra para ver o porto-riquenho Jhay Cortez, uma espécie de sucessor espiritual de J Balvin no festival portuense, trazendo o reggaeton para a mesa indie e dando um pouco de ritmo latino a um evento que, por norma, procura outros balanços para dançar.

Sem ser tão brilhante como o seu habitual colaborador Bad Bunny — inicialmente programado para a cancelada edição de 2020 –, o autor de Timelezz cumpriu em palco e soube dar, no estilo expectável, um show (com direito a bailarinas, pirotecnia e muito tempo junto a quem se encontrava na frontline) a apelar a todos aqueles que não se mostravam interessados em Nick Cave e também àqueles que tanto lhes daria estar ali ou no RFM Somnii. No final, “DÁKITI” surgiu e garantiu que quem precisamos mesmo de ver ao vivo é El Conejo Malo.

Foi na forma de quarteto que os black midi subiram ao palco Binance, dentro da habitual pontualidade que é reconhecida nos britânicos. Geordie Greep, Cameron Picton, Morgan Simpson e Seth Evans não estavam para brincadeiras e trouxeram-nos um pouco do seu Hellfire, o terceiro LP de originais que conhecerá uma edição a 15 de Julho pela Rough Trade Records. Porém, ainda a promover o seu último Cavalcade, a banda não renegou ao passado e abordou composições do álbum de estreia Schlagenheim, intervalando o seu alinhamento com alguns pozinhos daquilo que o futuro reserva aos seus ouvintes.

Com bases assentes na matemática musical que o rock fundou, o grupo inglês é famoso por não ter rodeios no que toca a fusões entre géneros. Isso manifesta-se não apenas nos seus discos mas também no som que levam para cima do palco. No NOS Primavera Sound mostraram de que fibra são feitos, através de um exercício de experimentação em torno das linguagens do punk, do rock, do metal e até mesmo do jazz, com espaço de abertura suficiente para que elementos do techno ou da tropicália também sobressaíssem por vezes.

Também do Reino Unido, Mura Masa trouxe um kit altamente personalizado de bateria para compensar aqueles que esperavam vê-lo desde 2019 (não chegou a aparecer nessa edição), refugiando-se (e bem) nos mesmos argumentos que, há uns anos, o elevaram enquanto uma das figuras mais interessantes do electro-pop com base na Internet.

Acompanhado por três vocalistas, o músico aproximou-se daquilo a que, por exemplo, nos habituaram os Disclosure, prestando-se a fazer bailar (mesmo que o baile mais parecesse de 2014 do que de 2022) cada um dos que responderam à chamada. Na setlist, o punk que projectou com slowthai, a ainda infalível “Lotus Eater” (o sistema de som não desiludiu quando foi preciso) ou as apetitosas “Firefly” e “Love$ick” foram ofertas bem recebidas de um passado que, no geral, talvez esteja bem arrumado lá atrás. Mas não fez mal, de todo, este remember.

Para fechar, a representação portuguesa que merecemos: poucos manuseiam os decks como Nídia. A Mulher-Maravilha da Príncipe discos veio ao Porto representar a batida de Lisboa e fez do palco Bits um verdadeiro templo de dança. Durante a sua estadia no NOS Primavera Sound, a autora de Não Fales Nela Que a Mentes transformou o kuduro num parente do techno enquanto soltou ritmos quebrados com fartura. Como combustível, a DJ e produtora usou produções suas e também as de alguns dos seus colegas de editora, num set que recorria ainda a remisturas mais ousadas que podem muito bem ter servido de isco para captar a atenção dos mais distraídos – do clássico “Satisfaction” (de Benny Benassi) ao mais recente “O Sol” (de Vitor Kley).

Se ainda não sabiam, ficaram a saber que Nídia é “fudida” e não dá tréguas quando o assunto é tomar os grandes sistemas de som de assalto. O skill de um DJ vê-se, acima de tudo, nas reacções que consegue arrancar da plateia: havia muito espaço por preencher na sala mas quem esteve presente foi sempre incapaz de negar aos movimentos do próprio corpo, não importando para o caso se estes vinham de improviso ou se eram passos já estudados previamente.

No primeiro dia (onde ainda deu para sentir a messiânica força de Nick Cave e o oleado e psicadélico espectáculo dos Tame Impala), encontrámos um Parque da Cidade a rebentar pelas costuras, uma moldura humana que também é expectável para o que ainda falta do festival. Esta sexta-feira (10 de Junho), o comboio Rimas e Batidas passará, se tudo correr bem, por actuações de Montanhas Azuis, Rita Vian, Rina Sawayama, King Krule, 100 gecs ou Chico da Tina.


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