É longa a estrada percorrida pelos Norton desde que se juntaram em Castelo Branco perto do virar do milénio. Na altura, o indie florescia em Portugal por vários caminhos e veredas, do rock à pop, abrindo lugares para uma geração de bandas e músicos que cresceram connosco e que fazem parte de uma memória colectiva que ficará para sempre indissociável da juventude de muitos de nós.
Chegados a 2020, os Norton editam o seu quinto longa- duração: Heavy Light é um disco feito com o coração, de quem não cedeu à velocidade do presente e se demora a olhar em seu redor absorvendo cada instante como se ele fosse durar para sempre. De guitarras fincadas como sempre, mas apontando para um futuro mais exploratório, os Norton não pretendem ficar reféns de si mesmos e continuam em busca da música que os move e entusiasma.
À distância de uma videochamada falámos com Manuel Simões e Rodolfo Matos sobre o novo disco — que será apresentado no próximo dia 10 de Julho no Cine-Teatro Avenida, em Castelo Branco — e sobre a ansiosa espera para o seu lançamento, inicialmente previsto para Março, entretanto adiado pela pandemia. Falámos ainda sobre a especial relação que a banda construiu com o Japão durante a última década, que culminou com uma digressão em 2015 e que trouxe experiências e mudanças que perduram até hoje. E falámos sobre recomeços que acontecem a cada etapa desta estrada que se quer que continue longa por muitos mais anos.
Foi uma longa espera para termos novidades dos Norton, seis anos separam este vosso novo trabalho, Heavy Light, do anterior homónimo. Que se passou entretanto neste período?
[Rodolfo] Tocámos bastante, basicamente foi isso. Estivemos a tocar desde que o disco [Norton] saiu e depois demos o último concerto, salvo erro, em 2017, em que fechámos a tour no CCB e aí sim é que parámos para compor. Nós não conseguimos dar a atenção devida a fazer música juntamente com os concertos, tivemos que parar.
Então começaram a trabalhar neste novo disco já há algum tempo também?
[Rodolfo] Sim, a primeira demo é do Verão de 2017…
[Manuel] Sim, aquele primeiro esboço que despoletou depois a primeira ideia. A banda ’tá sempre a criar, nem que sejam pequenos esboços. Pode ser uma guitarra, um sintetizador, até mesmo um beat, que neste disco por acaso deu origem também alguns temas. Estamos sempre a trabalhar nisso, há sempre ideias a rolar enquanto estamos a fazer outras coisas, numa digressão, ou a ensaiar, há sempre algo de novo a fluir.
Em seis anos muita coisa pode mudar, muitas experiências pessoais e colectivas…
[Manuel] E de que maneira… [risos]
Imagino que este disco também seja reflexo disso. Quais é que vocês diriam ser as maiores diferenças deste trabalho em relação aos anteriores?
[Rodolfo] Seis anos é muito tempo na vida de qualquer pessoa, não é? Falando em nós os quatro, muita coisa aconteceu. Nasceram crianças, o Pedro [Afonso] mudou de cidade, voltou para Castelo Branco. Tivemos uma experiência única, que queremos repetir o mais breve possível, que foi uma digressão no Japão em 2015. O mundo mudou bastante também e a indústria da música mudou bastante também. Indo mais directo à tua pergunta de qual é a maior diferença deste disco para os anteriores, acho que é um bocado aquilo que nós dizemos no press release, que é: ao contrário de tudo o que se passa à nossa volta, nós decidimos abrandar um pouco o ritmo, olhar com mais atenção ao que nos rodeia e fazer as coisas com tempo, ou seja, tirar mais prazer das coisas e não fazer as coisas à pressa só porque o mundo assim o exige.
[Manuel] E tudo o que aconteceu nestes seis anos ’tá canalizado neste disco, a nível lírico também há um maior ênfase em contar essas histórias. A “Changes”, por exemplo, fala dessas mudanças todas, do Pedro que mudou de cidade, ou a “Passengers”, que fala de um cenário que ele criou de ir para um outro planeta, com outra pessoa, e ver a Terra de outro ponto de vista e com toda a confusão que existe. Ou seja, os pontos de vista sociais também fazem parte deste disco, além de experiências pessoais e de outros cenários que imaginamos e criamos, em que também tentámos reflectir sobre isso, o que foi uma experiência muito interessante.
[Rodolfo] A nível lírico é bastante diferente dos outros discos e houve uma preocupação em fazer algo com que fosse mais fácil as pessoas se identificarem, de contar histórias de uma maneira um bocadinho mais directa.
Achei este disco libertador, não só liricamente mas também na parte musical. As guitarras continuam bem marcadas mas pareceu-me haver também mais espaço para experimentar coisas diferentes (o Manuel há pouco falava dos beats que deram origem a alguns temas). Quais foram as vossas maiores experimentações ou inspirações para este trabalho?
[Rodolfo] No geral nós fazemos muito o que nos vai na alma, não pensamos, “olha, agora vamos fazer um disco mais electrónico ou vamos fazer um disco mais não sei o quê”. Depois há coisas que gostamos de experimentar, quando chegamos a meio do disco, a “Galaxies” é possivelmente a primeira música dos Norton que não tem guitarras, que cresceu de uma demo do Pedro e lembro-me que até fui uma das primeiras pessoas que disse, “vamos arriscar e vamos ter uma música sem guitarras, acho que pode ser um respirar bom no meio do disco”. As guitarras são de longe a marca mais forte no nosso som e ter um tema em que respiras disso, no meio do disco, achámos que fazia todo o sentido.
[Manuel] E outra coisa interessante também neste disco (e em todos, na verdade) é que parece que reaprendemos a compor…
[Rodolfo] Foi o primeiro disco em que estávamos todos em cidades diferentes, apesar de a nossa sala de ensaios, onde trabalhamos todos juntos, ser em Castelo Branco, essa distância também ajudou um bocadinho a que o disco se calhar demorasse mais a acontecer, enquanto nos estávamos a habituar a esse processo, de enviar coisas uns aos outros e de trabalhar assim.
[Manuel] E tivemos também o processo de pensar mais nas canções, porque estávamos a enviar ideias que eram gravadas em casa, e havia talvez uma maior percepção de como eram os temas e de podermos pensar em novas ideias, e isso sim, traduziu-se numa nova forma de compor, e que talvez também dê alguma frescura às ideias que depois colocámos no disco.
[Rodolfo] Foi bastante interessante, porque foi a primeira vez que tivemos demos a sério. Ou seja, podia carregar agora no play e mostrar-te uma demo de qualquer música do disco, ou de quase todas, e não nos iríamos envergonhar — no sentido de que fizemos um trabalho de casa tão minucioso, que já levávamos as canções quase [versões] finais quando fomos gravá-las para estúdio. Enquanto nos outros discos as músicas davam um salto gigantesco, porque o que tínhamos eram os quatro a tocar na sala de ensaios gravado com um telemóvel. [Risos de todos] E agora tínhamos as coisas um bocadinho mais bem feitas.
[Manuel] Também é um bocado o reflexo do tempo da banda. A cada disco vamos também criando mais condições para o seguinte, para melhorarmos essas gravações, para termos melhor som na sala, vamos sempre trabalhando nisso e pensando no futuro.
[Rodolfo] E acaba por ser bastante estimulante essas mudanças todas, porque nunca é sempre o mesmo processo. Acho que se assim fosse provavelmente nos iríamos fartar rapidamente de algumas coisas…
[Manuel] É o que dá a frescura à banda.
A primeira música, ”Changes”, que foi também o primeiro single, começa no videoclipe com uma frase, que não se encontra no disco, da Valeriya [Gogunskaya], mas que acho que pode ser um bom cartão de visita a este álbum: “There was a moment when, for the first time in my life, I chose with the heart”. Este Heavy Light foi feito com o coração?
[Manuel] Sem dúvida.
[Rodolfo] Sempre. Aliás, nós costumamos dizer isso: nós fazemos música com o coração e não com a cabeça. É o que nos sai, não pensamos muito. Quem faz música assim acaba por o fazer de uma maneira um bocado egoísta, porque inicialmente ’tás a fazer música para ti e tu tens de gostar dela, e se tu gostares dela e se fores honesto no que estás a fazer acho que as pessoas quando vão ouvir percebem isso. Há muita música que é feita completamente em laboratório, em que se nota perfeitamente que aquilo não tem alma nenhuma, não é? Porque é feito para vender e para ser uma coisa imediata que amanhã já ninguém se lembra.
Alguns artistas tentam fugir ao rótulo pop como se isso fosse algo negativo, mas a pop, como em qualquer outro género, existe a boa e a má. Os Norton são muitas vezes enquadrados nesse registo, talvez até mais no da indie pop. Vocês sentem-se confortáveis isso? Como é que vocês vêm a pop e os Norton dentro da pop?
[Rodolfo] A pop tem uma conotação, pelo menos em Portugal, um bocadinho má. Mas a pop acho que é possivelmente dos rótulos, assim como o rock, mais abrangentes que existe, depois daí haver aqueles sub-catálogos. Mas acho que catalogar a música hoje em dia… por exemplo o indie, que era uma coisa que nos anos 90 era muito específica, parece que ganhou outro significado agora nos últimos 10 anos — agora é tudo indie. Porque cresceu e as multinacionais aproveitaram o rótulo para pôr o indie em tudo porque iria ajudá-los a vender. Eu acho que os rótulos servem mais para isso, do que propriamente para o que quer que seja. [risos]
[Manuel] Sim, nós na nossa descrição de Facebook temos “melody makers” e eu acho que a pop tem tudo a ver com a melodia e nós gostamos de criar melodias, e de criar canções que as pessoas possam cantar, com que se identifiquem por serem melódicas e por serem bonitas. Melodia acho que tem a ver com beleza, não é? E nós temos muito esse cuidado de criar melodias bonitas e acho que a pop tem tudo a ver com isso.
A vossa relação com o Japão é curiosa. Vários discos vossos contam com uma edição japonesa (presumo que este também venha a ter uma) e em 2015 fizeram finalmente uma digressão por lá. Como é que começou este vosso amor com o Japão e como foi essa experiência de tocar lá?
[Rodolfo] Começou em 2007 quando saiu o Kersche, o nosso segundo disco, ainda na altura do Myspace havia um AR norte-americano que vivia no Japão, que trabalhava em procurar bandas europeias para editoras japonesas. E foi com uma mensagem no Myspace que começou o contacto, editámos o Kersche por uma editora de lá, depois em 2011, com o Layers of Love United, também fomos contactados por outra editora japonesa que o editou e depois essa mesma editora editou o disco anterior, o homónimo, e foram eles que nos levaram lá em 2015. Foi uma experiência incrível, era um sonho e desde o Kersche que queríamos ir lá, só que na altura a nossa editora não tinha os meios para nos levar e por um lado ainda bem que não aconteceu porque tinha de acontecer em 2015. E foi incrível, fizemos amigos para a vida, conhecemos imensa gente, levámos um choque cultural brutal — até costumamos dizer que vivemos uns bons anos em ressaca daquela viagem. Custou-nos muito voltar à realidade, desde que viemos do Japão até começar a trabalhar a sério no novo disco foi um período longo, porque ficámos ali meio atordoados com o que tinha acontecido. E dizíamos sempre, “como é que uma banda, de um país tão pequenino como Portugal, do interior desse país, de uma cidade como Castelo Branco, minúscula, ’tá de repente em Tóquio, numa das maiores cidades do mundo, a tocar num clube cheio?” Qual era a probabilidade de isto acontecer?! Foi lindo.
É para voltar, então?
[Rodolfo] Esperemos que sim.
[Manuel] Sim, sim, até estamos sempre a falar que agora com estas músicas ia ser ainda mais espectacular. Temos mesmo vontade de partilhar estas canções com eles e de conhecer mais lugares no Japão também.
Como é o público lá?
[Rodolfo] É doido! [Risos de todos] Nós fomos lá com uma certa ideia, porque o nosso produtor, o Eduardo Vinhas, que também foi produtor de alguns dos discos do Norberto Lobo, lembro-me dele dizer, “o Norberto foi ao Japão e diz que foi muito estranho, que as pessoas ’tavam muito quietinhas, que quando a música acabava esperavam mesmo que não houvesse som nenhum para bater palmas”, então nós íamos assim um bocado, “hum… como é que isto vai correr?” E o nosso primeiro concerto foi num festival, em que fomos os cabeças de cartaz, e deu para perceber com os outros artistas que tocaram antes de nós que o público não era bem assim, mas ainda assim estávamos com um pouco de receio e foi no final da primeira música, em que houve assim aquela troca de olhares e pensámos, “ok, isto ’tá ganho”, isto não é nada daquilo que nos contaram e eles são doidos.
[Manuel] Nós estávamos muito nervosos, até ao momento em que entrámos em palco, não sabíamos o que é que poderíamos esperar, foi muito estranho ao início mas depois sentimos, “ok, ’tamos em casa, ’tá tudo bem”. Mas aquela expectativa foi… [risos]
[Rodolfo] E é um público bastante especial, que tem uma devoção muito grande pelos artistas e pela música. Nós conhecemos uma pessoa, pelo menos, mas sabemos que houveram mais, que era de Osaka, que são tipo três horas no bullet train (e estamos a falar de uma viagem que não é nada barata e os bilhetes do concerto também não eram nada baratos), que foi ver o nosso primeiro concerto e depois apareceu nos outros todos, e ofereceu-nos várias prendas. Ainda nos mandam prendas de lá, ou seja, é uma devoção que é algo único mesmo.
[Manuel] Quando ‘távamos a gravar, ela enviou-nos uns doces e chás para inspiração…
[Rodolfo] E depois enviou-nos uma garrafa de sake para festejarmos no final. [Risos de todos]
[Manuel] Que ainda está por abrir?
[Rodolfo] Está. É para o lançamento. [Risos de todos]
Vocês foram então bastante acarinhados por lá…
[Rodolfo] Sim, sim.
[Manuel] E para além disto, acho que é um público muito educado e respeitador, além de eufórico, é muito educado. ’Tá ali mesmo para te ouvir, para mergulhar no concerto.
Agora falando de assuntos menos felizes, o início da pandemia coincidiu com a data que vocês tinham inicialmente planeada para lançar este disco. A decisão de adiar imagino que tenha sido difícil e queria perceber melhor como é que vocês têm vivido estes últimos tempos?
[Rodolfo] Foi bastante difícil. O confinamento começou por cá por volta de dia 15 de Março e o disco era para sair dia 27, na semana a seguir, e nós ainda ficámos um bocado a ver o que é que se ia passar. Quando a nossa equipa de promoção liga e diz, “epá acho que é melhor adiarmos porque ninguém ’tá a fazer nada, a imprensa ’tá parada”. Porque foi mesmo no início, em que ninguém sabia o que é que ia acontecer e toda a gente estava a levar com o primeiro impacto disto na vida pessoal, e ia ter menos tempo e cabeça para ouvir ou dar atenção a um disco novo. Foi uma decisão difícil e houve bandas a fazer o mesmo que foram criticadas (cá, por acaso, isso não houve tanto), mas vi bastantes coisas lá fora, desde artigos de imprensa a público a dizer que “não deviam ter adiado, que era um erro”. Aliás, nós tivemos um comentário, quando dissemos que íamos adiar, de alguém que dizia, “pá ’tá feito, editem e depois fazem outro”, ou seja, a leveza com que as pessoas acham que se faz um disco. Ainda para mais uma banda como nós, independente, em que tudo passa por nós. É um investimento gigantesco tanto a nível monetário, como de tempo e mental. E quando li esse comentário fiquei mesmo, “não vamos lançar o disco só porque ’tá feito, não é? Não faz sentido”. Depois pensámos em passar [o lançamento] para Setembro, só que começámos a ver que havia muita coisa a ser anunciada e adiada para essa data, e decidimos arriscar em Julho. Numa altura normal, jamais editaríamos neste mês, porque é época de festivais e a imprensa nem sequer iria dar atenção, nem as pessoas, mas achámos que, neste momento, não havia grandes regras e lançar em Julho, ou mais tarde, iria ser arriscado em qualquer altura e para nós o disco tinha que ser lançado este ano. Chegámos a pôr a hipótese de esperar para o ano, mas não fazia sentido, até porque já tínhamos os discos feitos com a data de 2020 e iria ser um bocado esquisito. [Risos]
E até porque para o ano não existem garantias de que tudo isto vá passar…
[Rodolfo] Sim, exactamente. Mas acho que a nível de edições já toda a gente se mentalizou que têm de lançar. E depois a principal razão que nos levou a adiar foram os concertos, porque são o rendimento maior de uma banda e o que faz um disco durar mais tempo, e sem o poder fazer isto fica um bocado mais complicado. Mas acho que, dentro de todas as condicionantes que há, temos de seguir todos com a nossa vida para a frente, continuar a fazer coisas e a lançar e a ouvir música, e tudo o resto.
[Manuel] E estes novos tempos, com poucos concertos, estão-nos a obrigar também a reinventar novas estratégias, e estando cada um no seu canto, temos feito estas conversas por videochamada e também temos falado muito sobre isso, novas ideias de como promover música, de como potenciar as redes sociais, por exemplo, também tem sido interessante nesse sentido, dessa conversa estar na mesa com mais afinco.
E durante este período temos assistido a muitos artistas que têm apostado muito em live streamings, mas todos falam da dificuldade de converter isso em valor monetário…
[Rodolfo] Sim, não converte e também não substitui o concerto. A música ao vivo é contacto, não é? É a troca de olhares, as reacções e isso no livestream nunca vai acontecer.
Até porque os Norton, embora eu ainda não tenha tido a oportunidade de vos ver, sei de relatos de que vocês são uma banda que vive muito da energia ao vivo, por isso imagino que também esteja a ser difícil não ter esse contacto com o público. No entanto, estamos a regressar aos espectáculos, como é que acham que vai ser a experiência do vosso próximo concerto [dia 10 de Julho no teatro de Castelo Branco], com todas estas restrições de distanciamento e de segurança?
[Rodolfo] Acho que vai ser bem melhor que um livestream. [Risos] Nós estamos completamente em pulgas para chegue o dia, para já porque não tocamos ao vivo há muito tempo e depois porque temos um disco novo para apresentar, com um espectáculo todo montado que já estava preparado, desde iluminação, setlist e tudo mais. Acho que a princípio vamos estar todos assim meio estranhos, as equipas técnicas e nós de máscaras, o desinfectar as mãos, o passar pelo tapete de desinfecção do teatro — nós já estivemos a ver e o teatro vai ter todas as medidas, tem três entradas diferentes para cada zona, a saída vai ser controlada, ou seja, os responsáveis ali estão a querer fazer as coisas e a voltar à normalidade com um foco muito importante que é: darem às pessoas um sentimento de segurança, para que possam conseguir desfrutar dos concertos. E se é o que temos agora, vamos a isso.
[Manuel] Tem que ser, temos de pôr a máquina a mexer apesar de tudo, mas com cautela.
E têm mais coisas marcadas para breve?
[Rodolfo] Confirmadas a cem por cento não. Mas só o acontecer acho que já é óptimo em todos os aspectos, para o público que pode ir e ter um momento de escape, porque mete as bandas a tocar, as empresas de equipamento a trabalhar, os roadies, os técnicos, mete toda a gente de volta à estrada, porque é importantíssimo todos conseguirmos voltar a trabalhar o mais rapidamente possível, em todas as áreas.
[Manuel] E também para dar alguma segurança a todas essas pessoas, os que trabalham e os espectadores, para que também se sintam com coragem para ir, porque há ainda muita gente apreensiva, e espero que isto seja quase como uma bola de neve, que seja só preciso um dar o pontapé de saída para começarem a acontecer mais coisas e as pessoas começarem a ir mais.
Antes desta entrevista começar, estive a ver o videoclipe do vosso novo single, “Madrugada”, e dei por mim a pensar nas saudades que tenho de uma noite assim, de sair, de dançar, de estar com os meus amigos.
[Manuel] Não tinha pensado nisso, mas o vídeo cria um bocado essa ideia sim.
[Rodolfo] Começaste a falar nisso e agora é que fui ver, nós recebemos o vídeo esta manhã e ainda nem tivemos muito tempo… [Risos de todos]
O que é que vocês estão a sentir mais falta neste período?
[Rodolfo] O contacto com as pessoas, o abraço, o poder estar à vontade uns com os outros.
[Manuel] Parece que temos sempre o pé atrás, de certos movimentos, mesmo o ’tar em casa… tipo amanhã vamos ensaiar, vou ter de pôr imensas coisas no carro, vou ter de me descalçar, calçar, descalçar, calçar… [risos] Mas é sobretudo essa falta de estar à vontade e do toque, e de podermos estar juntos sem medo, seja a quantidade de pessoas que for.
Vocês têm estado juntos?
[Manuel] Sim, já estivemos a ensaiar e eu e o Rodolfo estivemos a distribuir discos no outro dia nas lojas, para dia 3, e andámos os dois aí por Lisboa a passear.
[Rodolfo] A sentir o pulso também, das lojas e das pessoas.
O que é que acharam?
[Rodolfo] Achámos um mix, tanto o pessimista como o positivo, desde pessoas que estão super normais, com os cuidados todos, mas a levar a coisa dentro da chamada nova normalidade, e outros que ‘tão assim também, mas mega pessimistas ainda.
[Manuel] Também sentimos que têm vontade de continuar e lutar por isso. E acho que o facto de termos ido lá levar o disco e de estarmos a editar um álbum novo também para eles é um motivo de alegria, porque estão a ter novo conteúdo na loja e podem trabalhar isso connosco, e acho que isso também lhes dá alguma vida, a eles e a nós.
É preciso recomeçar de alguma forma e este vosso disco fala também disso, de recomeços. Vocês sentem que se abre uma nova etapa para os Norton?
[Rodolfo] Sim, completamente. Em 2008, com o Layers [of Love United] acho que foi a segunda vida da banda — o Pedro assumiu a voz principal e a nível sonoro a banda mudou bastante. E passado algum tempo, depois de editarmos o disco de 2014, o homónimo, às vezes até falávamos que eram quase discos irmãos, um era um bocado a continuação do outro, e acho que este já é uma coisa totalmente [diferente], apesar de manter algo bastante importante — que é a nossa identidade, que não queremos de todo perdê-la — queremos ir a mais sítios, não queremos estagnar e ficar sempre no mesmo sítio sonicamente. Queremos experimentar coisas novas, sempre sem perder a identidade, que acho que é algo que nós não temos muito a noção às vezes, mas que as pessoas muitas vezes nos relembram. Houve alguém que ouviu a “Changes” antes dela sair, na sala de ensaios, e que nos disse, “epá é engraçado porque isto é novo, mas se ouvisse na rádio ia dizer que era vosso”, ou seja, significa que há uma identidade marcada e isso é sinal de prova superada, não é?
[Manuel] E cada disco é um estímulo novo e um recomeço. Voltamos com um disco novo, vão-se abrir outras portas e é isso que entusiasma também a banda. O mundo mudou, nós mudamos, há coisas que vão ser diferentes mas acho que sempre para melhor e o entusiasmo parte muito daí — é sempre muito incógnito o que vai acontecer, mas é sempre bom. Acho que é esse recomeço que nos dá também muita energia e vida, e mal podemos esperar por dia 3 para que o disco esteja cá fora e que as pessoas o possam ouvir, e que tenham as suas interpretações, nós estamos prontos para as ouvir. É um renascer muito bom.