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Fotografia: Renato Pinto
Publicado a: 04/06/2025

Um local que tem no jazz uma ideia de instrução.

Nazaré Capbreton Sextet no Jazz Valado’25: ondas de novos frutos

Fotografia: Renato Pinto
Publicado a: 04/06/2025

A ideia de reunir músicos e que há três edições seguidas o programa das festividades do Jazz Valado traz à vila de Valado dos Frades (Nazaré), vai dando frutos — sempre novos. Entre os nomes alinhados em cartaz ao sexteto que recebe o nome da Nazaré e de Capbreton (França) cabem estreias absolutas. É uma formação que junta jovens músicos das duas proveniências. Encontraram-se para uma semana de residência artística no Valado, tendo em vista o primeiro palco que se apresenta logo de seguida, neste dia 30 de Maio. Depois hão-de voltar a reunir-se em Capbreton, aquando do festival de jazz que lá tem lugar há 30 anos. Há mais o que liga estas duas localidades além do jazz. Ambas recebem a brisa do mar e que é profundo junto à costa — também Capbreton tem um canhão submarino de grandes proporções. Da Nazaré sabe-se das ondas gigantes, crescem desde esse vale de centenas de metros, de uma grande envergadura. Capbreton recebe ondas de grande dimensão pela mesma razão geomorfológica. Muito há de sustento nesta ideia de sexteto das duas paragens.

Começa com “30 Minutes Late”, tema escrito por Léon Herreyre, contrabaixista que junto com Victor Ocvirk, no saxofone alto, e Joachim Cuault, no piano, são a metade francesa do sexteto. Não há atraso algum na hora do concerto (só em título) e o grupo fica completo com João Heliodoro no saxofone tenor, Marta Rodrigues na guitarra eléctrica e Inês Gomes na bateria. Juntam-lhe “Sprinter” como único tema desalinhado entre os que trazem em partilha de composições próprias. Ouvem-se em cruzamento de tropicalismo com a bateria a sobressair num solo que incide na ideia de viagem melódica. “Do meu lado: vazio” é o que se escuta e revela em seguida, a veia de composição da guitarrista do sexteto. Tema que começa com uma efectiva ligação entre o contrabaixo e bateria, desenhando um tempo lento (abaixo das 100 BPM), dando aso aos uníssonos entre os saxofones que cedem para o guitarrismo suave da autora. 

Heliodoro, antes de voltar ao tenor, encarrega-se de explicar que nos dois temas compostos pelos dois saxofonistas há uma estrutura semelhante — o mesmo instrumento como marca na composição. Motivo para se escutarem ligados “Noctambule”, de Ocvirk, e “Cannon Meditation”, de Heliodoro. Se o primeiro tema tem uma guitarra trémula a descrever uma divagação, que cede à melodia dirigida do alto, o segundo surge pulsado num trio de piano-contrabaixo-bateria — trazendo o melhor momento até então escutado do sexteto. Ímpeto e verticalidade no piano de Cuault, a que se junta o tenor de Heliodoro em toda a apropriação emotiva que o tema revela. O alto foi aqui segunda voz. Revelaram a sonoridade desse passeio nocturno, da recém formação que os levou à Praia do Norte — sentir da ondulação do canhão da Nazaré, como que nessa meditação proposta. 

Do intervalo voltaram para um tema a pingar poesia no piano aliado pela guitarra, contrabaixo e bateria — “Farewell”, de Marta Rodrigues. Bons augúrios, não para a partida, antes à chegada para a segunda metade. Há uma atmosfera de clube de jazz — mesas com discretas conversas aqui e ali, sem contudo perturbar o palco nem os que a ele preferiam dedicar a escuta, agora com “Night in Andaluzia, de Inês Gomes. Revela-se de requinte composicional, com uma baterista que pensa e escreve para um piano de primor — afinal, trata-se também de percussão, aqui sobre cordas. Um tema muito swingado na relação de bateria, alto e contrabixo, que trouxe uma outra vez vozeares associado à medida do pulsar das cordas. Tudo escancarado em Herreyre, motivo para fazerem ouvir “Portes Ouvertes” de sua autoria. Seguindo-se um tema evocativo da horticultura do lugar. Valado é terra de abóboras — “Pumpkin Hope”, que aponta ao bebop. Três ondas a dar frutos: o protagonismo cabe primeiro ao saxofone alto; depois a guitarra num segundo momento; e por último ao tenor, que afinal é do autor do tema com dedicatória ao lugar. 

“Baobab” é essa magistral árvore das estepes africanas, mas aqui é tema maior entre o alinhamento. Escrito pelo pianista, que dele assume todo o bom protagonismo e convida a um quarteto dentro do sexteto — juntando a guitarra ao contrabaixo e à bateria. Fecharam com “Berlin’s Mood” sob o espectro da dança, de Ocvirk, que assina a composição e o solo destemido de entre o sexteto que termina com uma dança em uníssono dos saxofones. Houve muito querer que este bem tocar não sumisse do palco — houve ainda esse tema de Chick Corea, “Armando’s Rhumba”, há muito estandardizado no jazz dançável, e Ocvirk denotou isso tudo. Uma música de 50 anos, mas feita de novos frutos, numa boa onda, dessas mesmo que o mar faz chegar às costas da Nazaré e Capbreton.


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