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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 25/12/2019

Pessoal e transmissível.

Nástio Mosquito: “De África vieram pessoas, sangue, carne, memórias… vida”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 25/12/2019
Nástio Mosquito deseja-nos, a todos, um bom Natal. E esse desejo tem uma manifestação concreta, Blues Were Once Orange, trabalho conceptual em torno dos blues, das suas raízes africanas, mas também, e talvez sobretudo, das questões essenciais que esta época deveria levantar e de que tendemos a esquecer-nos no meio do frenesim consumista em que se transformou. Artista multidisciplinar, músico, homem das palavras, das imagens, das questões que provocam e das provocações que questionam, o luso-angolano Nástio Mosquito tem a decorrer até Fevereiro, em Lisboa, no Centro de Investigação Artística Hangar, o projecto No.One.Gives.A.Mosquito’s.Ass.About.Trabalho.De.Preto, um cruzamento entre vídeo, instalação, exposição e música que pretende abordar uma funda problemática com dimensões raciais, sociais, laborais. Entre diferentes soundscapes, um programa de sessões áudio com ritmo semanal, e apoiando-se em materiais tangíveis como autocolantes e folhetos, com performances e colaborações com outros artistas, este projecto, que passou pela Bienal de Veneza, terá as próximas sessões áudio em Janeiro (dias 8, 15, 24 e 30) e Fevereiro (7 e 15), sempre às 21 horas. Entretanto, começa hoje a espalhar-se, de forma naturalmente orgânica, como o artista deseja, o novo registo musical Blues Were Once Orange, fora das habituais plataformas digitais hoje comummente usadas para difundir música, e num plano mais humano, “interpessoal”, como o designa o próprio artista que tem presença em redes sociais como o Facebook e página Internet oficial, plataformas onde quem o deseje o poderá contactar manifestando vontade de escutar também o trabalho onde se explica que os blues foram em tempos cor de laranja, “cor da terra em África”, como refere Nástio. O autor de Blues Were Once Orange respondeu a um par de perguntas sobre o novo trabalho.

Que Natal é este que estás a celebrar? Espera-se que um Natal verdadeiro. Eu tentei ir de encontro àquilo que nós desejamos que o Natal seja, aquilo que o Natal é e aquilo que nós imaginamos ser o Natal. Para mim, espera-se um Natal mais verdadeiro onde haja um bocadinho menos fingimento, onde haja um bocadinho mais de verdade, onde haja uma partilha de onde nós estamos e de uma forma muito concreta tudo aquilo que nós não sabemos ainda e estamos disponíveis para ir descobrir. Um Natal onde se beba e se coma, mas que se converse e que se estabeleça de uma forma mais tangível a vida que queremos viver. É esse o ponto-de-partida.  No título, Blues Were Once Orange, tu estás também a dizer que esta música veio de África.  Ya, também. De uma forma simples é fazer essa ponte de uma forma leve, não é?, o que é que isso quer dizer, que a música veio de… o que veio, na verdade, foram pessoas. Foi sangue, foi carne, foram memórias, foram vidas… vida vivida.  Com quem é que fizeste o disco? Eu fiz o disco prioritariamente com o N’du, baterista, produtor musical… Que tem trabalhado com a Sara Tavares, por exemplo.  Sim, mas acho que já há algum tempo que não trabalha com a Sara, mas trabalhou muito tempo com ela, inclusive com o Dino D’Santiago e com muitos outros artistas aqui da praça portuguesa, mas não só: da angolana, cabo-verdiana também — ele está em Cabo Verde há vários anos. É o meu mestre musical. É o gajo que apanha as minhas composições e as atura e as eleva para outro nível.  E como é que tu vais distribuir isto?  Têm que me conhecer ou têm que conhecer alguém que me conheça. A ideia pelo menos é essa, que haja uma distribuição orgânica e interpessoal. O ideal seria que o disco jamais estivesse online, ou seja, no YouTube, no Vimeo ou no Spotify, mas que passasse de pessoa para pessoa.  Gravar uma cassete e oferecer a um amigo?… Literalmente isso. Fazeres uma cópia de um CD e levares para alguém. Poderes imprimir a capa se quiseres e poderes entregar… esse é o ideal! Gostaria que fosse uma coisa que passasse um bocado tipo prenda. Um gesto de humano para humano.  E planos para música que venha a ser lançada de uma forma mais convencional no futuro? 2020 vai trazer alguma coisa? Sim. Tenho um projecto que se chama Visão Nocturna, que é feito com o Felipe Antunes, em São Paulo, que é um projecto pela Natura, em colaboração, é uma ponte também entre Luanda, São Paulo e Lisboa — nós conhecemo-nos na última, gravámos na segunda e a experiência da terceira ainda não se concretizou. Mas é um projecto musical que eu estou muito entusiasmado para apresentar e pôr aí porque nós gostaríamos muito de poder defender esse produto. Lançá-lo de forma convencional, mas defendê-lo de uma forma diferente que era… meu, inspirados pelo Johnny Cash e tudo mais. Um gajo gostaria muito de ir a cadeias, a centros de dia. Íamos defender o produto com todos aqueles que podem estar a ser negligenciadas ou menos… pessoas por quem talvez não se façam coisas concretas. Nós damos prioridade a esses grupos de pessoas, sejam idosos, encarcerados, refugiados. Nós gostaríamos  de poder defender o produto dessa forma, então dar gigs para esse tipo de crowd e conseguir activar o que é possível ou não neste espaço. Ver que imaginação ainda resta nesses lugares e celebrar essa energia.  E o projecto Trabalho de Preto está a correr até meio de Fevereiro, não é? Ya, e esse aí é mais uma noção dos espaços aonde esses conteúdos podem ser consumidos. A ideia do Trabalho de Preto é exactamente essa criação de espaços onde nós podemos considerar alternativas de formas como queremos viver. Até 15 de Fevereiro em Lisboa.

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