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Publicado a: 21/07/2017

Musicbox esgotou para ver Emicida: quem não o conhecesse, diria que estava em casa

Publicado a: 21/07/2017

[TEXTO] Núria Rito Pinto [FOTOS] Daniela K. Monteiro

Na porta lia-se “Esgotado”. A fila dobrava a esquina, ainda antes das onze, e a sensação geral de expectativa e ansiedade traduzia-se bem na reacção das duas raparigas na frente da espera, que tinham conseguido os últimos ingressos e saltavam, abraçadas, em euforia. E a verdade era essa: não cabia nem mais uma agulhinha no Musicbox na noite de quinta-feira.

“Sério que vai ter show do Emicida aqui, hoje? O cara é zica!” ouvia-se na rua. Lá dentro, o sotaque não era diferente e denunciava que teríamos um concerto para um público maioritariamente brasileiro em terras lusas, saudoso das rimas do MC de São Paulo, e prontíssimos para fazer a festa. De um dos portugueses ao meu lado surgia o esclarecimento “É um rapper brasileiro, poeta gigante… Vais adorar, de certeza!”. Não era mentira.

 


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23h30. Dj Nyack, Doni Jr., Carlos Café e Emicida entram num palco que parecia, ao mesmo tempo, demasiado pequeno e incrivelmente confortável para os quatros gigantes. Cinco, aliás, se contarmos com Cartola na abertura. O “Mundo é um Moinho” e trouxe-nos Emicida, “pele de galinha” e um baque na mistura com “Soldado Sem Bandeira”, a rebentar com a porta. Seguem-se “Licença Aqui” e “Rua Augusta”, a primeira de muitas canções com acompanhamento, praticamente generalizado no refrão. “Boa Esperança” entra após um discurso em off a denunciar as provações dos negros, hoje e sempre. Há tanto de esperança no rap assertivo e optimista de Emicida quanto há de carência de ilusões.

“Vocês estão ostentando, né? Porra! Neguinho agora tá viajando… Ai sim, hein?”, ironizava, o MC. “Para começo da conversa, esse ouro não devia nem ter saído de África!” Estava dado o mote para “Bang”!: “Neguinho o caralho, meu nome é Emicida, porra / O zica, corra, trinca, brabo, desde a orra”. Não havia espaço para dúvidas de que a partir daqui não havia como voltar atrás. O espírito era outro, aliás, notório na dança geral em “Gueto” com final surpresa: “Rap da Felicidade”. “Eu só quero é ser feliz / Na favela onde eu nasci!” ecoava a dezenas de vozes.

 


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A “Chapa é Quente”, do colectivo Língua Franca, teve também lugar no alinhamento e abriu para aquele que foi um dos primeiros momentos da noite: em “Hoje Cedo”, o rapper aproveitava para homenagear Chester Bennington cuja notícia de morte por suicídio tinha vindo a público, poucas horas antes. “Esse trampo que a gente escolheu é uma roleta russa do caralho…”, desabafava.

As luzes baixam para nos deixarmos embalar por “Chapa” e “Baiana” e participarmos, em uníssono, naquele que seria o segundo (e talvez) o mais intenso momento alto da noite. Musicbox inteiro trauteava os acordes finais da canção que um maestro havia conduzido e que, segundos depois, dispensava a batuta. Foi bonito. Muito bonito de se ver e ouvir e parecia durar uma eternidade. Por cima, um Emicida visivelmente emocionado: “Olha isso, mano… eu nasci num barraco de madeira e, p’ra mim, atravessar um oceano e conhecer o mundo inteiro cantando rap… Eu não sei qual o seu sonho, mano, mas acredita nisso aqui, parceiro! ‘Cês são foda…”

Continuámos com “Passarinhos”, “Mufete” e uma coreografia organizada em “Zica, Vai Lá!” por entre os inevitáveis “Fora Temer” com direito a coro do MC, “Fora p’ra caralho!”. As referências à situação política brasileira já se faziam esperar e a indignação do público face ao caso Rafael Braga mereceu, também, o apoio vindo de cima. “Show do caralho, já valeu o dinheiro”, murmurava-se ali ao lado.

 


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“Nóiz”, “Triunfo”, “Rinha (Já Ouviu Falar?)”, “Casa” e “Levanta e Anda” seguem para um final sambado, ao som do clássico “Emoriô” de João Donato. No final, não houve nem encore nem necessidade. Saímos todos, ele incluído, com aquele sorrisinho de satisfação. O retorno a Lisboa de um rapper que não reconhece fronteiras – assumindo, entre risos, ser péssimo a geografia – só poderia ser glorioso. Fica um pico de inveja por não ser nosso e um gigantesco orgulho e (re)confirmação de que assistimos ao concerto de uma das maiores vozes da poesia lusófona actual.

 


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