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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 30/07/2020

De Angola para Portugal.

MOBBERS: “O que faz sentido é fazer algo diferente. Levares o que é teu, mas para outro sítio”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 30/07/2020

Estamos em Lockdown. Os MOBBERS são a mais recente importação musical e vêm à boleia da Sony Music Portugal e da Clé Entertainment, munidos somente do seu talento e de uma lista de contactos no telemóvel. Tudo com o pretexto de singrar num mercado maior, mas, ao mesmo tempo, mais pequeno.

Foi em plena concordância que o Rimas e Batidas entrevistou quatro dos oito membros do grupo, sempre coordenados e em sintonia nas respostas que se deixavam completar de forma quase telepática. Xuxu Bower, LipeSky, Gi-O e Cali explicaram-nos tudo sobre a migração da sua música, não só entre fronteiras, mas também além-plataformas; as colaborações com Toy Toy T-Rex e Carla Prata; e a logística de coordenar oito talentos num só tema. Antes de mais nada, ficam as promessas de um disco editado em Portugal e alguns concertos, embora não tão grandes como os que fazem em Angola.



Vocês são angolanos e eu depreendo que vivam em Angola. O que é que estão cá a fazer durante esta altura conturbada?

[Xuxu Bower] Nós viemos para cá trabalhar quando ainda não estávamos nesta situação da pandemia. Tínhamos assinado com a Sony e viemos para cá para trabalhar e expandir, sair um bocado do nosso mercado. Depois deparámo-nos com esta situação toda. Mas já estava nos nossos planos ficar cá uma temporada. 

Vocês hoje são conhecidos por MOBBERS, mas já tiveram outro nome. O que originou essa mudança?

[Xuxu Bower] Nós antes éramos Mob. E porque é que mudámos? Não só por questões legais, para que pudéssemos registar o nome, mas também porque quando as pessoas procuravam por nós na Internet apareciam Mob nos Estados Unidos, no Reino Unido… Tínhamos que ter um nome mais original. Com a mudança de nome veio uma outra imagem e uma outra maturidade. 

Fizemos parte da Latino Records, que foi a primeira produtora que nos recebeu, em 2017, durante sete meses. Trabalhámos com eles mas a nossa visão não era a mesma e precisávamos de alguém que nos entendesse. Então, fizemos o nosso caminho e entrámos para a Clé em Janeiro de 2018, onde ficámos até agora.

Entretanto foram entrando e saindo membros e hoje são oito. Há quem diga que oito membros é demasiado…

[LipeSky] Já fomos 14.

[Xuxu Bower] Era naquele tempo em que fazíamos música por hobby. A primeira coisa que perguntam sempre é “como é que dividem os lucros?”. Mas nós começámos a fazer rap em miúdos e não era pelo lucro. Tínhamos um grupo e queríamos fazer parte, com o tempo fomos diminuindo, naturalmente. 



Mas então, como é que vocês funcionam? Certamente que não cantam todos em todos os temas.

[Xuxu Bower] Nem sempre cantamos os oito. Há músicas em que só estão dois, outras em que só cantamos três.

[Cali] Temos dois produtores, o Weezy Baby e o Deksz James. O Deksz canta, mas o Weezy Baby não canta.

[LipeSky] Mas normalmente escolhemos dependendo da vibe da música, e já conhecemos os membros que, dependendo do beat, se enquadram melhor. Quando é para fazer uma música com todos, temos aquele comboio sem coro, sempre a dropar. 

[Cali] Temos atenção à estética da música. Se acharmos que está muita gente, vamo-nos dar conta e assumir que naquele tema só cantam três ou quatro. Ou só dois. 

[LipeSky] Se for muita gente: poucas barras. Cada um faz oito mais oito, ou seis. 

[Gi-O] Foi o que fizemos no EP que lançámos. 

[Cali] E atenção que há grupos maiores que o nosso. Muito maiores! Americanos então? Há grupos com 30 ou 40 pessoas. Olha os Wu-Tang, por exemplo. Tem que haver uma organização na estrutura interna do grupo para as cenas darem certo.

E como é que gerem os egos? Nunca aconteceu quererem cantar todos no mesmo tema e não haver espaço? De certeza que fazem compromissos e cedências.

[Cali] Nós somos maduros o suficiente para dizer não dá.

[Gi-O] E são muitos anos juntos, já nos entendemos. Então sentamo-nos, conversamos e todo o mundo se entende. 

[Xuxu Bower] E quando há dúvidas, fazemos votações. Se alguém quiser dizer que há uma parte que não está boa na música, o people ouve e diz se está mais a favor ou contra. E então, se ganhar o contra, ele sai.

[Cali] Sai ou melhora. Na maior parte das vezes, melhora. Mas se não der… “vais ter que sair e arranjamos outra maneira”. Já aconteceu eu tentar fazer um refrão e não ficar fixe. Tiramos o meu refrão e deixamos o Xuxu fazer um refrão. “Hum, não está fixe”. Vai outro.

[LipeSky] É até acertar.

[Cali] E aqui posso dizer de boca cheia que nós sabemos gerir o nosso ego em relação às músicas. Aposto que todo o mundo queria cantar em todas as músicas…

Quanto ao Lockdown. Vocês têm neste EP duas colaborações com dois músicos angolanos estabelecidos em Portugal. Falem-me sobre o EP.

[Gi-O] A Carla Prata, que é uma das nossas colaborações no “Mulher Como Tu”, nós já conhecíamos porque ela fazia parte dos TRX, os nossos rivais. Tivemos os nossos beefs lá para trás, mas com ela era algo à parte. E depois fomos tendo convivências e percebendo que ela não era aquilo que nós pensávamos. Criámos um laço e o ano passado surgiu a ideia de fazer uma música com a Carla. O tema pode ter saído agora mas já tem um ano. Foi gravado no Verão passado, aqui em Portugal, no estúdio do Beatoven, que produziu o beat também. Entretanto levámos a cabo algumas estratégias na banda e só este ficou em carteira. 

[Xuxu Bower] Quanto ao Toy Toy, também já o conhecemos há algum tempo. Ele está no mesmo game que nós, que é o rap. Eu próprio já tinha músicas com o Toy Toy também, na minha mixtape individual. Mas já nos conhecíamos, e quando foi para virmos para Portugal, como a Carla foi a primeira pessoa da nossa faixa etária a assinar com a Sony, nós achámos bem falar com ela. Com o Toy Toy foi a mesma coisa. Uma questão de afinidade. 

[Cali] E o Toy Toy entrou há pouco tempo na nossa produtora, a Clé. Então juntámos o útil ao agradável. E se já estávamos os dois cá… Porque não?



E até agora, como tem sido o feedback? Falta muito para receber um ouro ou uma platina?

[Xuxu Bower] Falta um tempinho, mas já faltou mais. O feedback está a ser muito positivo. Estamos a receber de outros países também, que não estávamos à espera. 

[Cali] É uma questão de meses. Em menos de um ano acho que temos uma placa.

[Xuxu Bower] Sim, nós só não tínhamos a cultura de usar Spotify e Apple Music, porque em Angola as pessoas usam mais Youtube, MediaFire, SoundCloud…

[Cali] Se os nossos números fossem traduzidos para o Spotify ou para o Apple Music já tínhamos algumas 500 placas. [risos]

[LipeSky] O mercado é diferente. Os nossos maiores números cá são de angolanos que vivem cá e que têm essas plataformas. Tu, em Angola, um vídeo com 250 ou 300 mil views já é um hit, e tens muito mais pessoas que cá. Um videoclipe com um milhão é uma música que todo o país conhece. 

[Xuxu Bower] Em Angola, o pessoal tira o som da Internet e mete a circular no MediaFire, no SoundCloud. Lá o artista precisa da pirataria para funcionar. 

[Cali] Agora estamos a tentar chegar aos nacionais portugueses. Da mesma maneira que os Wet Bed Gang tocam em Portugal, é a mesma maneira que nós tocamos em Angola, mas os números são muito diferentes. 

[LipeSky] Nós podemos-te mostrar fotos nossas em concertos com mais de 100 mil pessoas. 

[Gi-O] Desde que lançámos o EP estamos a ter cada vez mais portugueses. E com a Sony fez-se a abertura a esse mercado, mas não sabemos ainda comparar com o nosso estado cá. Precisamos de um show.

E quanto à sonoridade? Estão a entrar num novo mercado. Há coisas que queiram fazer cá de forma diferente?

[Cali] Não queremos mudar a nossa essência. A partir do momento em que um artista faz isso, eu acho que ele perde logo à partida. Nós só temos que fazer música e fazê-la chegar às pessoas. Depois, claramente que há sonoridades que em Angola batem mais. Por exemplo, o kick na masterização que vais meter numa música, não pode ser tão alto aqui. 

[Xuxu Bower] Em Angola, quanto mais alto melhor. Há estilos que, naturalmente, entram mais rápido num mercado. Mas há muito artista que pensa que se mudar para o que se ouve mais, que entra e fica. Não. Tu até podes entrar rápido, mas ficar nunca é garantido. 

[Cali] Mesmo na língua. O Julinho canta em crioulo e mais de metade dos portugueses não percebe crioulo, ainda assim toda a gente gosta das músicas dele. Então, porque é que eu tenho que mudar o meu calão angolano? Temos que ser o mais originais possível. 

[Gi-O] O que faz sentido é isso — fazer algo diferente. Levares o que é teu, mas para outro sítio.

Vocês estavam na Clé, e deviam estar contentes. Como é que apareceu a Sony?

[LipeSky] Estávamos no estúdio e fizeram-nos a proposta. Foi uma pessoa, que eu não sei se posso dizer o nome, que nos disse que estava cá em Portugal e que fazia sucesso, e que nos poderia meter em contacto. Ele insistiu connosco e com o pessoal da Clé e fez a ligação. Foram negociando, mandámos as músicas e acabámos por vir para cá. 

[Gi-O] Foi tudo muito rápido. Deve ter demorado dois meses. 



E o que é que vos leva a querer sair de Angola e aventurarem-se no mercado português? 

[Cali] Tem a ver com o reconhecimento do artista. O artista quer ser ouvido no mundo inteiro, não é só em Angola ou em Portugal. Então, claramente que queremos expandir. Falamos português, falamos inglês. Porque não?

[Xuxu Bower] Nós em Angola fazemos imenso sucesso. Mas porque é que estamos a fazer imenso sucesso ali, mas em Portugal ou no Brasil, onde se fala português, nem nos conhecem? Vamos expandir!

[Gi-O] Em Portugal conheciam-nos, mas um número baixo. E ainda tens que ir para esse país para aumentares o teu número. 

[Xuxu Bower] Se estivéssemos em Angola a trabalhar para o mercado português, não ia ter o mesmo impacto. Estando aqui é outra coisa. Sentas-te com as pessoas, olhas para a cara delas… é outra forma de criar estas ligações. Pessoalmente funciona tudo melhor.

E podemos esperar ver-vos a trabalhar por cá muito mais tempo? A produzir e gravar coisas? Imagino também que queiram fazer alguns concertos.

[Cali] Já tínhamos marcado para o Sumol Summer Fest, que foi adiado para 2021. Temos também um concerto em Punta Umbria e no Sol da Caparica.

[LipeSky] Temos mesmo uma estratégia montada, algo que ia dar certo. 

[Cali] Nós agora estamos num impasse. Estamos em lockdown a gravar músicas, a fazer vídeos, a dar mais conteúdos às pessoas. Mas queremos muito fazer um álbum com a Sony, e se calhar já temos músicas para um próximo álbum lá no PC. 

[Gi-O] Se for assim, vamos lançar dois álbuns!

[Xuxu Bower] Nós primeiro vamos gravando e só depois é que juntamos tudo num projecto e damos o nome. Se calhar até já temos tudo gravado, é só ir buscar e montar.

[Cali] Mas, inconscientemente, fazemos as coisas a pensar já num projecto. Por mais que tiremos músicas daqui e dali, as coisas no fim vão fazer sentido e bater certo juntas. 

E no hip hop português, o que é que vos agrada? Há cá bons artistas com quem gostariam de colaborar?

[Xuxu Bower] Gosto muito do Slow J e adorava trabalhar com o ProfJam.

[Cali] A cena é que nós, MOBBERS, somos muito versáteis, e no mercado português existem imensas musicalidades e diversidade. Temos o ProfJam, o SlowJ é rapper mas tem um jazz… é uma coisa diferente. Então, nós, na verdade, queremos fazer música com todos. Resumindo e concluindo, é isso. 

[Xuxu Bower e Gi-O] Todos os que transmitem aquela vibração!

[Cali] A questão é que eu posso dar-te aqui uns 10 nomes, sem gaguejar, de gajos que eu oiço em Portugal e com quem gostaria de fazer música. Tens o Julinho, o ProfJam, o Deejay Telio, o Bispo, o DJ Big, GSon, Zara G… Eu quero fazer música com eles todos. Eu estou vivo, eles estão vivos — vamos aproveitar.

[Xuxu Bower] Até a Sara Tavares ou a Mariza!


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