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Fotografia: Tomás Oliveira
Publicado a: 29/09/2022

Encontrar um método.

Mansur Brown: “No fim do dia, somos todos humanos e a única diferença entre nós é o conhecimento que carregamos”

Fotografia: Tomás Oliveira
Publicado a: 29/09/2022

Multifacetado e focado naquilo que mais lhe concede paz, Mansur Brown parece não parar de ascender — em todos os níveis dessa palavra: tendo-se revelado como um mago da guitarra, mas com um certeiro toque de Midas para cada instrumento que toca, o músico tece cada melodia de forma a soar o mais perto possível de uma abertura dos portões lá de cima. Desta vez, cá em baixo — pudemos comprová-lo no Iminente deste ano — e prestes a lançar o seu novo EP, NAQI Vol​.​1, que sai já amanhã, o artista falou com o Rimas e Batidas sobre a importância de se ser singular, sem comparações, de tudo o que é música e para além disso.



Como é para ti tocar neste festival que celebra de uma maneira tão ampla música nova? Já alguma vez tinhas estado em Portugal?

Eu estive em Portugal há séculos, no Porto. Dei um concerto quando era mesmo muito novo, para aí com uns 19 anos, então não posso mentir, é muito especial para mim; é sempre incrível tocar para uma multidão, nunca me farto, é sempre como se fosse a primeira vez.

Ainda sentes aquelas borboletas de nervosismo?

Yeah, yeah, yeah! Normalmente fico muito nervoso, mas neste concerto senti-me mesmo confortável e foi muito divertido, especialmente ao ver que a multidão foi aumentando ao longo do concerto. 

Quando é que te apercebeste que era esta a tua paixão e que era mesmo isto que querias fazer? O que te influenciou?

Eu sempre curti muito de rock. O meu primeiro amor foi rock dos anos 80, como os Deftones, Nirvana, amo Van Halen, todas essas bandas que são muito fixes [risos]; mas também sempre gostei bastante de r&b dos anos 90, Timbaland e assim. E é interessante porque o meu gosto musical sempre foi super variado e onde eu mais explorava isso era no YouTube, toda a gente se lembra dessa era mais antiga; obviamente que penso logo na jiggy era e indo ao YouTube podia-se sempre ouvir tantas bandas de rock diferentes e grupos de r&b.

Foi aí que te apercebeste que querias fazer algo assim? Tinhas que idade?

Eu agora tenho 25 anos. Quando era um miúdo, os únicos hobbies que eu tinha e gostava realmente era brincar com legos, curtia de videojogos e de futebol. Então, lembro-me que, antes de começar a aprender a tocar guitarra, o futebol era a minha cena e tive de desistir do futebol para me aplicar a tocar guitarra; não dava para conciliar as duas coisas.

É quase como o enredo do High School Musical [risos].

Yeah! [risos]

Como é que te sentes em ser um Troy Bolton [risos]? De certeza que não te arrependes.

[Risos] Pois é! Ó meu Deus, é verdade [risos]. Às vezes fico a pensar em como teria sido jogar futebol, mas não conseguiria fazer as duas coisas, é demasiado puxado; e também o prazo de validade para uma carreira no futebol é mais curto.

Esta sexta-feira, dia 30 de Setembro, vais lançar o teu novo EP NAQI vol.1. O que podemos esperar deste projecto?

Esperem muitas influências de afrobeats, latinas e também de flamenco, tudo géneros que eu tenho andado a ouvir bastante, portanto é também isso que vão ouvir nesse EP. Também tem algumas influências de r&b dos anos 90.

Duas músicas desse EP já estão cá fora, “No Way” e “Rise”. Nessa primeira música é possível ouvir essa mesma influência do flamenco na sonoridade da guitarra. Quais foram as influências que te levaram a experimentar esse tipo de som? 

Paco De Lucía, que é um artista de flamenco incrível. Ando também a ouvir muito Rosalía, ela é maravilhosa, gosto muito das primeiras cenas dela.

El Mal Querer?

Isso é incrível, meu. E ela é super talentosa.

Deviam colaborar.

Um dia, talvez! [Risos] Ando também a ouvir muita música de filmes, bandas sonoras: a banda sonora de The Revenant, do Interstellar, Hans Zimmer é fantástico… e ya, olha! Como gosto tanto de videojogos –adoro ver walkthroughs –, ando a ouvir a banda sonora de Death Stranding.



Este EP vai ser lançado pela tua própria editora, AMAI Records. O que te levou a começar a tua própria editora?

Acho que foi a liberdade. Acho que hoje em dia é mais difícil ser-se criativo na indústria musical. Está tudo tão posto em caixas, acho que a música é tão dominada por playlists, especialmente de pop.

Como quando lançam as músicas à sexta-feira para entrarem nas playlists do Spotify?

Exactamente! Eu acho que é fixe, de certa forma, mas isso já está um bocado morto, parece que toda a gente está a tentar apelar ao mainstream. Não há nada de errado com o mainstream, mas eu acho que antigamente havia mais aquele movimento para fazeres exactamente o que querias, e acho que foi assim que tantas coisas maravilhosas foram criadas.

Li também que tens outros interesses para esta editora e para além da música queres expandir para cinema e coding, algo que achei interessante.

Sim, quero muito entrar nesse mundo de computer coding. Queria tornar isto numa empresa, por isso, embora agora seja sobretudo relacionado com música, essas são áreas que gostaria muito de explorar.

Ainda que a guitarra continue a ser o centro da tua música, fazes muitas outras coisas: de compositor a produtor, tocas vários instrumentos como flauta, saxofone e ainda cantas. Isto vai ao encontro da tua ideia de seres contra o acto de colocar arte em caixas e definir coisas; qual é o teu principal objetivo a alcançar com a música que partilhas com o mundo?

Eu quero que a minha música inspire as pessoas, sinto que a minha música tem um propósito. Pessoalmente, para mim é essencial ser uma forma de transmitir a ideia de que tu és o suficiente, enquanto pessoa, de que não precisas de ser mais ninguém, nem de apelar a ninguém. Somos todos humanos no fim do dia e a única diferença entre nós é o conhecimento que carregamos. E quando temos um problema na vida, muitas vezes não sabemos o que fazer e tudo o que precisamos de fazer realmente é fazer algumas perguntas. E também ter em mente que não faz sentido compararmo-nos a outras pessoas, porque na verdade todos vêm de origens diferentes, todos têm um ponto de partida diferente. Para além disso, acho que o conceito de duração é uma coisa importante, porque as pessoas estão obcecadas por coisas de consumo rápido.

Dá para ver isso nas redes sociais actualmente: se algum tipo de media demora mais que alguns segundos a ser consumida já não é tão apelativa. Mas contrariando isso, como é que chegaste a essa iluminação?

Em primeiro lugar, é tão importante ter em mente que somos todos seres humanos; cada pessoa tem o direito de existir, todos têm essa oportunidade; e obviamente que há factores externos que são duros, mas o facto de estares aqui é o suficiente para teres sucesso. E eu sinto que muitas coisas nas redes sociais só vieram para piorar a nossa auto-estima, por isso começamos a acreditar em pensamentos como, “ó, não consigo fazer isto” ou “não posso ser assim”, mas eu sinto que ninguém é melhor do que ninguém. A única coisa que te torna melhor é a procura de conhecimento e a aplicação do mesmo, só isso. Se tens duas pessoas e uma delas foi ao ginásio durante um ano e a outra pessoa não, não é porque essa pessoa é melhor, é porque apenas implementou o método que aprendeu; e eu sinto que na vida há apenas isso: métodos. Encontras um método e consegues atingir os teus objetivos.

Dizes que gostas que a tua música tenha “um club feel na sua génese, mas que não perca o seu sentido de musicalidade”. O que queres dizer com esta afirmação?

Quando eu era mais novo, gostava de ouvir música com muitos instrumentos, mas mais tarde comecei a ouvir muita club music; e o que eu gosto nesse género é a sua grandeza e amplitude, sinto que é muito edificante; e sinto que muita da música que ouvia com todos aqueles instrumentos não tinha as mesmas batidas, o mesmo impacto, então estive sempre neste percurso de tentar casar as duas coisas, para depois ao vivo soar enorme e ter esse som impactante, ainda que com musicalidade, se é que isso faz sentido. Acho que é mesmo isso, um caso de ser influenciado por várias coisas diferentes.

O que achaste do novo álbum da Beyoncé, que tanto tem esse club feel?

Não o ouvi muito na realidade, mas houve certas faixas que adorei. Quer dizer, a Beyoncé é super dotada. Toda a gente parece estar a ir nessa onda do house agora.

Exacto, primeiro o Drake, agora a Beyoncé. Porque é que achas que isto está a acontecer?

Eu sinto que quando algo é feito em demasia as pessoas começam a tentar procurar algo novo. Por exemplo, estava a falar do conceito das playlists, porque foi algo que todos adoptaram. A vontade de se querer encaixar é maior do que a fome por inovar e inspirar. E não acho que enquanto conceito o mainstream seja grande como era antes, porque sinto que se recuares até 2010 tinhas rap, pop-punk e eram todos géneros igualmente expressivos, como o movimento de indie rock também. Tinhas os Arctic Monkeys que eram enormes.

Sim e depois disso vieram bandas como The Neighbourhood e The 1975, talvez seja o que está a acontecer com club music a uma escala mais pequena, nunca tinha pensado nisso. 

Exacto, é isso que estou a dizer. Eu sinto que as pessoas só querem novas ideias e talvez seja por isso que estão a voltar à cena do house.

Há uma certa espiritualidade na tua música também, a que atribuis isto?

Eu acredito em Deus, então Deus é a minha maior influência. Eu tento manter Deus no centro da minha música, porque sinto que isso me mantém com os pés no chão e em paz. E a minha crença em Deus permite-me acreditar realmente em mim próprio e sentir-me bem em seguir um percurso de paz, dado que esta indústria… música é uma coisa muito bonita, mas o negócio da música não é tão bonito assim, então sim.


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