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Fotografia: Daniela K Monteiro
Publicado a: 10/09/2018

O artista de Pittsburgh, Pensilvânia, morreu, na sexta-feira passada, aos 26 anos.

Mac Miller: a luta inglória contra os demónios que nunca o abandonaram

Fotografia: Daniela K Monteiro
Publicado a: 10/09/2018

Tal como grande parte das peças que saíram aquando do lançamento de Swimming — não esquecer a conversa que Mac Miller teve com a Rolling Stone –, o título da entrevista, publicada um dia antes da sua morte, assinada por Craig Jenkins apontava para uma certa sensação de dever cumprido, como se este último projecto fosse a materialização de uma visão que ficou mais clara com o passar do tempo.

Assunto recorrente nos diálogos que o rapper manteve com a imprensa, a luta contra os demónios (“And sometimes, sometimes I wish I took a simpler route/ Instead of havin’ demons that’s as big as my house”, de “2009”) manteve-se também aí na ordem do dia. “Eu não quero estar deprimido. Quero poder ter dias bons e dias maus”, respondeu ao jornalista da New York Magazine. Desde o dia em que chegou aos ouvidos do grande público, o músico de Pittsburgh, Pensilvânia, esbracejou contra um inimigo invisível que teimava em não sair do canto da sala, do quarto e do estúdio. A música, que tantas vezes é uma das armas para combater a depressão — algo que o próprio chegou a mencionar numa entrevista com a Billboard em 2015 –, não chegava e Larry Fisherman, nome que utilizava para assinar as suas produções, entregou-se a diferentes tipos de drogas que o ajudavam a ultrapassar a solidão e a fama, dois monstros que apareceriam com maior força em diferentes alturas da sua vida.

O crescimento artístico de Malcolm James McCormick, filho de uma fotógrafa e de um arquitecto, foi notável: da inconsciência juvenil de K.I.D.S. às canções mais ambiciosas de The Divine Feminine, o artista passou de MC à procura do caminho mais fácil a compositor maduro/multi-instrumentista sem medos de explorar diferentes facetas. Porém, quatro anos antes de começar a assumir a sua melhor versão, You, EP em que assinava como Larry Lovestein & The Velvet Revival, foi um pequeno devaneio jazz de um crooner e a sua banda imaginária que deixava apontamentos sobre a sua capacidade de se reinventar. Outros exemplos disso: o LP Watching Movies With The Sound Off e as mixtapes Delusional Thomas e Faces levariam-no para caminhos mais sombrios e menos óbvios do que o seu primeiro disco, Blue Slide Park, permitiria adivinhar.

“You never told me being rich was so lonely/Nobody know me, oh well/Hard to complain from this five star hotel/ Tell myself to hold on/I can feel my fingers slipping/In a motherfucking instant I’ll be gone”, cantou em “Small Worlds”, elucidando-nos, mais uma vez, sobre a sua batalha contra os malefícios da vida de celebridade. Em 2011, o álbum de estreia entrou directamente para o número 1 da Billboard 200 e, a partir daí, todos os seus álbuns (Watching Movies With The Sound Off, de 2013, GO:OD AM, de 2015, The Divine Feminine, de 2016, e Swimming, de 2018) estrearam-se no top 5 da tabela de vendas norte-americana, sinal óbvio do peso que repousava sobre os seus ombros.

A sua paixão assolapada pelo hip hop também teve alguns altos e baixos. Como qualquer rapper branco que conquista rapidamente a fama, o autor de Swimming “sofreu” com a questão racial, precisando de provar que tinha skill para ser considerado pelos pilares da cultura. Em retrospectiva, o amor assumido pela obra de Big L, as colaborações com Sean Price, 9th Wonder, PRhyme e Alchemist e o apoio incondicional a nomes como Odd Future, Vince Staples, Chance The Rapper, Schoolboy Q, SZA e Rapsody no início dos seus percursos são amostras daquilo que tinha para dar (e que era muito, como pudemos ver pelos testemunhos dos seus amigos e colegas nas redes sociais). Outra prova da aceitação dos seus pares e da humildade do artista foi o elogio de Jay-Z no Twitter que acabou impresso e pendurado na sua parede.

Lil Wayne, CeeLo Green, Juicy J, Flying Lotus, Bun B, Jay Electronica, Thundercat, Phonte, Wiz Khalifa, Miguel, Lil B, Kendrick Lamar, Chief Keef, Anderson .Paak, Dâm-Funk e Clams Casino são alguns dos ilustres que aparecem na extensa (e invejável) lista de colaborações que assinou como rapper e produtor.

Num dos seus últimos tweets, Miller demonstrava uma grande vontade de voltar à estrada. A propósito do seu último disco e de uma pequena (e recente) actuação no The Hotel Café, John Mayer, um dos colaboradores de Swimming, dizia, por outras palavras, que o rapper tinha formado uma banda que estava prestes a tornar-se na próxima big thing no que diz respeito aos espectáculos ao vivo. Não admira: em 2017, o rapper deu um dos melhores concertos do MEO Sudoeste e fê-lo apenas com o DJ nas suas costas.

A sua “dança” com a morte teve um fim inglório e precoce que acaba por trazer uma nova luz para Swimming, um disco que marca a última etapa na evolução abruptamente interrompida de Mac Miller. Ironicamente, uma das frases que ficaram do seu mini-documentário intitulado Stopped Making Excuses, que foi produzido pela The Fader, foi, sem saber, sobre a sua própria morte. “Sobredosagem não é fixe. Não existe um romance lendário, tu não ficas na história porque tiveste uma overdose. Apenas morres”. No entanto, e sem glorificar o consumo de substâncias, o artista não poderia estar mais enganado: ajudou uma geração de adolescentes e jovens adultos a sentirem-se menos sozinhos num mundo que, grande parte das vezes, não consegue corresponder às suas expectativas, anseios e temores. Mesmo não tendo salvo a sua vida, talvez a sua música consiga salvar a de outras pessoas.


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