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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 01/12/2021

Não ignorem.

MA’AM: “Eu gosto bastante de canções de amor e guerra. Elas contêm a verdadeira tristeza e amargura”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 01/12/2021

A propósito do mais recente lançamento da editora ZABRA, o LP de MA’AM, Ignora, o Rimas e Batidas teve a oportunidade de entrevistar a autora de origem húngara. A utilização da voz como instrumento e respectivas potencialidades, o trabalho de pesquisa em torno das tradições da cultura magiar e a relação da artista com a editora portuguesa foram alguns dos temas abordados.

Uma excelente oportunidade para conhecer um pouco melhor a sua obra, mas também para endereçar convite para a apresentação do lançamento do álbum, que acontece esta quarta-feira, 1 de Dezembro, às 20 horas, na MONO Lisboa



É muito claro no primeiro tema (“NAIAN“) que utilizas a voz como instrumento. Quando começaste a pesquisa em torno das potencialidades do uso da voz? E quais as principais razões para iniciar esse processo?

Penso que a voz humana é o mais antigo e o mais universal dos instrumentos. Tentei tocar alguns instrumentos, mas falhei na experiência física. Quando uso a minha voz, o meu corpo passa por muitos e diferentes estádios – dor, dormência e prazer ao mesmo tempo. É maravilhoso. Há quatro anos, compus o meu primeiro tema utilizando somente a voz e agora estou a tentar trabalhá-lha muito mais intensamente.

Que tipo de técnicas, exercícios e leituras costumas fazer no sentido de utilizar a voz em todas as suas possibilidades e potencialidades?

Dançar e gritar silenciosamente é a minha cena… estou a brincar, desculpa. Conheço muitos truques para explorar a voz, como bater em determinadas partes do corpo – sentir os ossos enquanto canto ou mantendo longos momentos de silêncio entre as músicas. Sempre me interessei pelas mudanças rápidas entre as posições vocais. Imagino, geralmente, que estou a falar comigo mesma ou entre pessoas imaginárias (ou amigas).

Algumas vezes construo as minhas líricas a partir de amigos e começo-as a trabalhar. Reorganizo as palavras ou crio uma massa linguística a partir daí. Uma das minhas técnicas favoritas é imitar os sons que me rodeiam e muitas vezes também canto sob faixas midi aleatórias.

Na apresentação do álbum refere-se que utilizas frequentemente vozes tradicionais da Hungria. Quais são as tuas principais motivações para o fazer e o que procuras nelas quando o fazes?

Se te referes à música tradicional húngara, posso dizer que é uma verdadeira inspiração para mim. Na Hungria há uma forte tradição no que se refere à música e à dança tradicional, que admiro profundamente, mas da qual não faço parte. Estas escalas estão, de alguma forma, nos nossos genes e memória, mesmo para mim quando improviso e componho. Além disso, tenho desenvolvido nestes últimos meses um projecto nesta área, em que recolhi 50 canções tradicionais, receitas e contos baseados em entrevistas com pessoas de diferentes aldeias. Logo, a principal razão para o uso deste material é porque quero manter estas tradições, estórias e emoções. 

E o que poderemos aprender a partir destas tradições?

Como disse, não sou uma especialista, mas aprendi ao falar com uma senhora mais idosa, que vive numa pequena aldeia fronteiriça de nome Pusztafalu – “Foi muito bom enquanto durou”. Refere-se à relação de 52 anos que teve com o marido, em que a verdade é mais coerente nas pessoas mais idosas, nós [os jovens] desistimos muito facilmente. Piadas à parte, eu gosto bastante de canções de amor e guerra, elas contêm a verdadeira tristeza e amargura.

Nos tempos algo estranhos em que vivemos, podemos utilizar esses ensinamentos para alterar a presente situação? Se sim, como?

Sugiro sinceramente o Hungaro Futurism, que é um movimento artístico baseado na Hungria. Gosto particularmente do trabalho de Dominika Trap, do projecto de dança e filmes Leányos / Girl’s Solo Folk Dance que desconstrói as imagens tradicionais associadas às questões de género no contexto do folclore húngaro. A peça coreografada e o documentário subvertem as divisões entre masculino e feminino e as normativas comportamentais associadas às danças tradicionais. E naturalmente, nós podemos aprender coisas básicas como acalmar, escutar o silêncio e a importância de quem amamos.

Tecnologia e ancestralidade. Quais as metodologias e técnicas que utilizas para fundir estes dois universos?

Não penso que esteja a fundir tecnologia com ancestralidade, talvez seja mais com o orgânico.

Comecei como vocalista, posteriormente a música electrónica e a tecnologia é que me “sugaram”, comecei por gravar e exercitar. Após as primeiras sessões senti que não me expressava verdadeiramente, nem na totalidade, somente através das máquinas, não sentia a experiência física. Na minha opinião, fundir artificial com o natural não é novidade, nem a única coisa a fazer, eu tento aprender com os melhores.

Colaboraste com Áron Bujdosó no tema “Tales of the liquid night” que conduz para uma direcção mais free-jazz. Como descreves o trabalho do Áron e o que pretendias quando o convidaste?

Actualmente colaboro com muitos músicos, o que é um dos meus objectivos. “Tales of the Liquid Night” baseia-se numa performance de dança. A minha intenção foi repensar e de tentar alcançar o que o Áron me enviou pela primeira vez. Foi qualquer coisa, uma espécie de material plano, um sentimento de frustração, ele captou o que eu pretendia, penso. Estive com o Áron somente algumas vezes, é um génio. É muito jovem e um artista experimental cheio de energia.

Qual é a tua relação com a Zabra e como surgiu o convite para lançares o novo disco?

A Carincur ouviu o meu primeiro EP Murmur, editado pela EXILES, e escreveu-me. A Internet é o melhor lugar, às vezes.

Carincur trabalha as mesmas matérias que tu. Imaginas trabalhar com ela? Se sim, de que forma?

Conheço o trabalho dela e finalmente posso conhecê-la pessoalmente. De certeza que iremos colaborar num futuro próximo. Acontecerá de certeza absoluta <3.


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