pub

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 15/02/2024

Colours of Air juntou os dois artistas em disco.

Lawrence English antecipa passagem pelo gnration com Ioscil: “Interessa-me o que o órgão pode vir a significar no futuro”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 15/02/2024

Um órgão de tubos com 132 anos de história, que se encontra no Old Museum em Brisbane, Austrália, está no centro de um frutuoso encontro entre Lawrence English e loscil. Colours of Air, trabalho com cerca de um ano, é o álbum que resultou da colaboração dos dois músicos. Agora, English e Ioscil preparam-se para assinar uma performance no gnration, em Braga, com música surgida no âmbito dessa parceria.

Este álbum contém gravações meticulosamente capturadas no centenário órgão que foram posteriormente processadas. Como o homem do leme da Room40 faz questão de explicar ao Rimas e Batidas, não é apenas o som do orgão que se escuta em Colours of Air, mas o ar do local em que se encontra, componentes invisíveis, mas que neste trabalho ganham a leveza das cores como “Violet” ou “Magenta”.

Em antecipação do concerto que acontece já este sábado pelas 18 horas na blackbox do gnration, em Braga, Lawrence English respondeu por email a algumas questões enviadas pelo Rimas e Batidas.



Pode começar por nos dizer como é que o seu caminho e o de Ioscil se cruzaram pela primeira vez?

Na verdade, eu e o Scott estamos em contacto há mais de 20 anos. Escrevi-lhe, honestamente como fã do seu trabalho, quando ele lançou Submers e posteriormente enviei-lhe alguns dos primeiros lançamentos da Room40. Fiquei muito impressionado com a sua abordagem aos ritmos e à textura nesse disco e esses elementos do seu trabalho continuam a fascinar-me até hoje. Desde essa altura que partilhámos alguns programas juntos e cruzámos caminhos através dos hemisférios.

Este álbum nasce do processamento das gravações de um antigo órgão de tubos. Quais são, na sua opinião, as qualidades do instrumento que permanecem claras após o tratamento eletrónico a que foi submetido?

Acho que, independentemente da forma como se aborda o órgão, a sua respiração e a sua voz continuam presentes. Há algo de tão específico na forma como o órgão funciona. Não é apenas o vento nos tubos, mas também a forma como esses tons saem do órgão e preenchem o espaço em que se encontram. É uma relação muito única e cada órgão, e o sítio onde se encontra, é diferente. No caso do Old Museum, há um sentido de movimento muito vivo nesse local, pelo que o órgão é transportado para lá. Uma das razões pelas quais estávamos tão interessados em abordar o órgão desta forma era o facto de ser uma fonte muito rica — não só o instrumento, mas também o local onde vive, são captados e tornam-se parte daquilo com que trabalhamos.

O conceito de sinestesia desempenhou algum papel neste projeto?

Penso que a sinestesia é, de facto, um conceito fascinante e sei que o Scott e eu o discutimos em relação à música. Não creio que tenha sido necessariamente um factor orientador, mas penso que é certamente algo que muitas pessoas retiram da música e do título. Nalguns aspectos, esta é a beleza da música: é porosa e até desfocada. As margens não são fixas e convida as pessoas a descobrirem as suas próprias relações dentro dela.

Então e porque é que não se escolheu vermelho, verde ou azul para os títulos?

Os seres humanos e as abelhas partilham um mecanismo ótico semelhante, na medida em que ambos temos receptores tricromáticos nos olhos. As abelhas conseguem ver a luz ultravioleta, o que explica em grande parte as cores das flores. Curiosamente, vêem as cores cinco vezes mais depressa do que nós, o que considero uma proposta absolutamente fascinante. Penso que este disco não é sobre estados primários, por isso usar cores primárias pareceu-me um pouco incongruente com a natureza de como o disco foi feito e também com as peças acabadas.

Como é que esta música se materializa num cenário ao vivo? Esse instrumento original não está, obviamente, disponível para ir em digressão… A não ser que estejam a usar as gravações originais. Como é que planearam as actuações?

Tivemos a grande sorte de trabalhar com um órgão no primeiro concerto que demos deste projeto com a Vancouver New Music no ano passado. Foi uma apresentação muito especial e, de facto, realçou o ponto que referi anteriormente sobre a especificidade de cada órgão e do seu espaço. No entanto, para esta digressão estamos a trabalhar com outro tipo de processo iterativo. Há alguns sons que criámos que reflectem os espaços da sala de concertos do Old Museum. Assim, se quisermos, pode ser apenas o som do órgão, com a sua voz, o seu sistema circulatório, que utilizamos em algumas peças. O próprio órgão também lá está, mas transformado e processado. É uma metodologia curiosa, mas parece ter funcionado muito bem para esta digressão.

Penso que esta música tem um carácter profundamente espiritual e calmante. Como é que a encara?

Penso que o órgão tem estado ligado a uma longa história na religião e em locais espirituais. É compreensível, de certa forma, uma vez que o instrumento tem um peso e uma presença que, estou certo, se reflecte nas ideias da voz de Deus. Para mim, no entanto, interessa-me o que o órgão pode vir a significar no futuro. O meu amigo Charlemagne Palestine diz sempre que é um instrumento que permite uma espécie de minimalismo maximalista. Acho que ele tem razão, é uma presença tão grande — tanto suave como dominadora, ao mesmo tempo. Considero-me afortunado por ter passado algum tempo com ele.


pub

Últimos da categoria: Entrevistas

RBTV

Últimos artigos