[TEXTO] Gonçalo Oliveira [FOTO] Direitos Reservados
O palco principal do LISB-ON foi uma espécie de oásis durante a tarde do primeiro domingo de Setembro. O recinto do festival encontrava-se praticamente deserto e existia um pequeno conjunto de pessoas que se mostrou disposta a trocar a praia por uma das pistas de dança nacionais que melhor estabelece a ligação entre o entretenimento e a natureza. “Eles é que perdem”, pensámos. Feitas as contas, acabámos por não ganhar assim tanto. Mas já lá vamos.
A primeira “atracção” que nos levou ao Jardim Sonoro respondia pelo nome de Mr. Scruff. O DJ e produtor britânico, que está ligado à Ninja Tune há mais de dez anos, é um admirador confesso de ritmos e melodias quentes e exóticas. A sua prestação não começou mal — house tropical e batidas que pareciam ter saído dos arquivos da Príncipe faziam-nos ignorar o calor e insistir num pezinho de dança. Os bombos e linhas de baixo calaram-se pouco depois para que Mr. Scruff iniciasse o que foi uma homenagem à herança musical brasileira, com recurso a muito samba, forró e MPB. Não é que não apreciemos clássicos como “Obrigado Corcovado” ou “Baião Destemperado”, mas a altura não nos soou a mais indicada, principalmente depois de um arranque marcado por batidas tão fortes. Para não se desligar por completo da electrónica até ao final do set, o DJ recorreu a algum do seu repertório, e foi nessa altura que conseguiu ter o público mais activo na relva. “Music Takes Me Up” ou “Get On Down” têm, de facto, uma fórmula mais apelativa para a dança numa Europa electrónica.
De seguida, Larry Heard tinha a tarefa de elevar a fasquia. Porém, o arranque da sua actuação fez-nos chegar à conclusão que a organização do festival nos tinha pregado uma pequena partida: o seu espectáculo seria dividido com Mr. White, um dos seus protegidos na Alleviated Records. Os pontos altos do live act aconteceram quando um dos artistas, dotados de um timbre perfeito para aquele house mais morno e recheado de soul, cantava ao microfone, enriquecendo as versões de “Deja Vu”, “Missing You”, “A Path” ou “What About This Love”, temas que já começam a soar obsoletos no contexto actual. Talvez funcionassem melhor refundidos num DJ set mais amplo em vez de uma prestação ao vivo inteiramente dedicada aos clássicos.
Perto das 21 horas, já notávamos uma maior afluência ao festival que leva a música electrónica até ao coração de Lisboa. Se Larry Heard e Mr. White tinham conseguido juntar mais gente à sua frente do que Mr. Scruff, Kerri Chandler era o nome que ninguém queria perder. As fortes ligações ao jazz entraram em jogo logo no início da sua passagem pelo LISB-ON: munido de um Korg Kronos, Kerri brindou a plateia com uma ginástica de acordes pouco comum nos DJs, uma manobra à qual recorreu com frequência entre a passagem das canções que ia seleccionando nos decks ou mesmo para acompanhar na totalidade uma faixa mais despida de harmonias. Kerri navegou por um oceano de sonoridades e atravessou caminhos mais melódicos e uplifting, mas também trilhos mais sombrios, quase a cair para o techno. A remistura de Greg Gauthier para “Let Them Come”, de Dan Eelectro, ou “I’m Searching”, de CPEN, foram bons exemplos dessa pluralidade de sons que se podem adoptar num DJ set sem que este nunca soe confuso. Kerri Chandler foi, por isso, rei num dia quente de actuações mornas. Se, por vezes, a aposta no último dia do LISB-ON pareceu quase perdida, Chandler fez questão de nos salvar a noite e fechar em grande estilo mais uma edição do certame lisboeta.