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Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 19/09/2024

Fusão distópica tornada real.

Kubik: “Quando decido criar música para um novo registo, dedico-me intensamente e de forma obsessiva”

Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 19/09/2024

Kubik está de volta com música nova. Editado ontem, “Mundus Felix Destructus” é o single que serve para antecipar o álbum Circus Mundi Decadens.

Victor Afonso é um músico da Guarda com 35 anos de experiência nas mais variadas lides do som, cobrindo terrenos tão díspares quanto os do rock e da música experimental ao jazz e à electrónica. Depois de ter fundado e militado na banda Nihil Aut Mors, criou o projecto a solo Kubik para se poder expressar criativamente de forma ainda mais livre. Sob este alter-ego, lançou os LPs Oblique Musique (2001), Metamorphosia (2005), Psicotic Jazz Hall (2011) e Rock Extravaganza (2016), bem como um trio de EPs e vários temas avulso.

Circus Mundi Decadens traduz-se “Circo Decadente do Mundo” e será o próximo trabalho de longa-duração deste veterano multi-instrumentista e compositor. Através de um comunicado, é-nos descrito que o quinto disco a entrar para as contas de Kubik contará com “experimentação estética, ecletismo musical, reciclagem sonora, criatividade e fusão caleidoscópica de géneros: do rock ao jazz, do industrial ao hip hop, da clássica à música circense/fanfarra, da eletrónica às múltiplas músicas tradicionais do mundo.”



Numa carta digital endereçada ao Rimas e Batidas, Victor Afonso falou-nos sobre os 8 anos que levou até finalmente deitar mãos a um novo registo discográfico e explica o conceito do seu próximo Circus Mundi Decadens:

Pode parecer bizarro, mas eu não demoro muito tempo a compor um novo trabalho. É verdade que o último data de 2016 (Rock Extravaganza), e estive os últimos 8 anos praticamente parado (pelo meio só fiz uma banda sonora para teatro). No entanto, quando decido criar música nova para um novo registo, dedico-me intensamente e de forma obsessiva. Foi o que aconteceu com este novo álbum: foi concebido em apenas 3 meses, a trabalhar uma média de 8 horas por dia. 

Quem conhece o meu trabalho desde 2001 e a minha música dos 4 discos anteriores e as 10 bandas sonoras originais que compus para cinema mudo, sabe e reconhece que Kubik tem uma identidade estética muito peculiar. Talvez única a nível nacional. A fusão de estilos, a vertigem caleidoscópica e a experimentação de sonoridades de muitos quadrantes e inspirações diferentes, a ligação ao imaginário do cinema, sempre foram características estruturantes da estética criativa de Kubik. Comecei na eletrónica, no drum’n’bass, ainda no final dos anos 90, mas depressa passei para territórios de pura experimentação, com um foco mais no corte, colagem e reciclagem, cujo epítome foi o primeiro disco, Oblique Musique, em 2001, o qual, apesar da estranheza sonora, o Público considerou-o “Revelação Musical do Ano”! 

Isto para dizer que com Circus Mundi Decadens esta visão experimentalista de fusão estética (rock, erudita, jazz, world music, industrial, techno…) mantém-se, mas com algumas novidades: este é o registo mais concetual do meu percurso (explico mais à frente), no sentido em que musicalmente exploro novas sonoridades que nunca tinha abordado, como o flamenco, a música de cinema de Bollwyood ou a música circense/fanfarra/burlesco (sempre com elementos eletrónicos à mistura). E mais do que nunca, este novo trabalho tem como forte inspiração o cinema, quer ao nível das imagens em movimento, quer ao nível das bandas sonoras. O título do álbum e dos temas são em latim, uma forma de citar a minha banda rock de juventude que tinha nome em latim (Nihil Aut Mors). O uso do latim combina com uma certa ideia urbana distópica, onde o passado grandioso da cultural universal choca com uma realidade decadente e quase apocalíptica. O “Circo Decadente do Mundo” representa uma metáfora poderosa para a ideia de um mundo global e distópico sem rumo e no qual os valores humanos mais básicos estão em desintegração. 

A música de Kubik, na sua abordagem multicultural, irreverente, fragmentária e iconoclasta, pretende explorar a deriva existencial humana e o pré-colapso civilizacional, através da fusão minuciosa de sonoridades, ritmos, texturas e timbres de muitas linguagens estéticas e latitudes geográficas diferentes. Um trabalho musical de relojoeiro que escrutina a complexidade e diversidade cultural do mundo atual, ao mesmo tempo universal e específico, sugerindo uma tapeçaria rica e entrelaçada de culturas e influências. O circo e o clown, historicamente símbolos de diversão, evasão e entretenimento, representam aqui o mundo como um palco onde a vida se desenrola com todos os seus excessos, dramas e absurdos (como no filme La Strada de Fellini). No disco de Kubik, este circo representa alegoricamente o estado do mundo, e é retratado num estado de ruína, podridão e desordem, revelando ser um reflexo de uma sociedade à beira do colapso, onde o caos substituiu a ordem e a loucura tomou o lugar da razão. Apesar da música aparentemente alegre, como no tema do videoclip promocional com a música “Mundus Felix Destructus”, que significa “Mundo Feliz Destruído”, é um pouco esta mensagem que pretendo transmitir.

Para criar todo este universo sonoro complexo e caleidoscópico, representativo do mundo multipolar em que vivemos, recorri — como sempre — a uma imensa paleta eclética de sonoridades, texturas, ambientes, timbres, dinâmicas e ritmos, cuja inspiração fui buscar a músicos, compositores ou projetos tão diversos como The Tiger Lillies, Kurt Weill, Nino Rota (Fellini), Henry Mancini, Danny Elfman (sobretudo as bandas sonoras dos primeiros filmes de Tim Burton), Ennio Morricone, John Carpenter, Moondog, François de Roubaix, Tom Waits, Lalo Schifrin, Pascal Comelade, entre muitos outros. 

Por tudo isto, apesar de Kubik nunca ter sido música mainstream, julgo que este novo registo representa o culminar da maturidade artística de Kubik e, ao mesmo tempo, o seu álbum mais acessível. E deve ser ouvido do princípio ao fim (há uma narrativa progressiva dos temas) e prestar atenção aos títulos e respetivo significado das músicas.


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