pub

Fotografia: cardigos
Publicado a: 26/02/2021

Resquícios de amor e dor.

JÜRA: “Trabalhar sempre com verdade é muito importante para mim”

Fotografia: cardigos
Publicado a: 26/02/2021

A necessidade de se expressar através da arte é um hábito na vida de Joana Silva, o nome que dá corpo ao alter-ego JÜRA. Dessa inevitabilidade resultou um percurso em artes performativas e circenses, mas a música consagrou-se a forma de expressão de eleição. 

Depois de mil e um projetos, vertentes e variantes, Joana deu-se a conhecer como autora com a música “ÉS O AMOR”, em 2020. Quase um ano depois de se apresentar, a cantora anuncia o primeiro curta-duração com o lançamento do single “SOMOZUMNÃODOIS”, novamente ao lado de FreeSoulBeats, que conta com a chancela da Melides Art Records.



Deste os primeiros passos na arte desde cedo: és formada em dança e mais tarde trocaste a Alcobaça por Lisboa, onde te tens desdobrado em inúmeros universos artísticos. Desde 2019 que começaste a explorar a música. Para ti, é a vertente principal ou é mais um caminho para te descobrires e te dares a conhecer? 

Para mim, a música é o principal. Comecei mais a sério em 2019, mas sempre criei mini-canções e sempre gostei de fazer covers bem diferentes, tipo pegar nas músicas e adaptá-las. Quando era pequena cantava o “Atirei o Pau ao Gato” em diferentes estilos, criava pequenas músicas a brincar. Sinto que todo o meu percurso foi super importante, mas a música foi sempre o amor maior. O resto também são paixões que tenho, mas a música é o foco, é a forma como me expresso e o que me traduz melhor. 

Como é que descreverias o teu processo criativo ao lado do FreeSoulBeats, que para além de beatmaker é o teu companheiro?

É bué interessante porque ele já tinha este bichinho mas também começou a produzir em 2018/19. A maior parte das vezes parte sempre do beat dele e, se sentir, crio. E crio sempre que tenho algo para dizer, não me obrigo a criar. A maior parte dos meus temas são sobre a nossa relação ou pequenos momentos da nossa relação que despoletam esta necessidade de me expressar e de falar sobre isso e é assim que nasce uma canção. Na grande maior parte das vezes é na tristeza que eu crio, mas sempre com o amor como a melhor parte disto tudo… e é isso… Do beat nasce a ideia melódica e a partir daí começo a escrever se tiver alguma coisa pra dizer. 

Lançaste o single “SOMOZUMNÃODOIS” — na qual dizes jurar o amor — podemos esperar um EP em torno da temática romântica, ou haverão outros temas a sublinhar? 

Sim, é sempre na dor e no amor. 

Visto que tu crias lado a lado com o teu companheiro e o tema é o amor,  sentes que é uma maneira de superarem as diferentes fases duma relação?

Por acaso acho que não. Nós trabalhamos juntos, mas super independentes. Por exemplo, eu sou um pouco impaciente e não é muito fácil trabalhar comigo no momento da criação porque surgem-me ideias muito fixas, universos que moram na minha cabeça que são muito próprios e que ainda não consigo concretizar. Por isso costuma ser ele dar-me o beat e deixá-lo comigo até fazer nascer. A música que fazemos não cura a nossa relação , é só um desabafo meu que, às vezes, aparece. As músicas que vão estar no EP são uma realidade de um segundo ou de uma hora. É um dia mau que fica num som, porque amanhã já está tudo bem. Pode parecer que foi o fim e não foi… E eu sou uma pessoa um bocadinho dramática, por isso esse drama amplia a emoção e o sofrimento. Vivo com intensidade. Tanto as coisas boas como as más. 

Então, achas que podemos dizer que estes universos onde tu crias são uma forma de canalizar as coisas más que tu vais passando, como uma catarse?

Muito.   Vivo aquele momento, sofro e liberto. A partir do momento em que ele fica na canção passa a ser mais do que um momento, torna-se uma realidade numa canção. Deixo de pensar nele como um momento que vivi, ou um período que me fez sofrer. Passo a senti-lo como uma dor que senti, que é triste, mas que acabou por transformar-se em amor, num pedaço de fragilidade e amor. A dor faz parte e a música faz-me sentir que é bom a dor existir, e estes momentos maus existirem, porque resultam nesta forma de expressão. E fica lá. Pra lembrar lá,  chorar lá, morar lá. A dor transforma-se numa coisa boa.

Como é que usas as outras vertentes artísticas para criares os teus universos? 

Acho que tudo fez com que eu chegasse aqui e tivesse esta forma de expressão agora. Por exemplo, eu fiz o Ensino Articulado de Dança, depois fui para o Chapitô e foi no Chapitô que eu descobri a minha forma de expressão através do corpo, como é que me traduzo, qual é a expressão do meu corpo sem pensar, como é que improviso. E esse improviso que descobri corporalmente também me trouxe liberdade e espontaneidade para a música e para a forma como me expresso pela voz. Porque é quase como se o que eu sinto se transformasse em movimento e depois na voz a mesma coisa, como uma linha que eu desenho — que vive da intenção — e sinto que todas estas artes se acabam por juntar, porque sou todas elas. Quero muito trazê-las para quando um dia pisar palcos — trazer o movimento o circo contemporâneo. Como um complemento. Apesar do circo ter sido um caminho que eu adorei percorrer, viver, a música é o caminho que eu escolhi e quero dedicar-me a isso, usando sempre a sensibilidade artística que noutras áreas da arte desenvolvi. Sinto que tenho um universo… e que é muito mais completo por isso, pela minha experiência em criação através do corpo. Que fez com que eu tenha uma visão artística mais marcada, porque me conheci ao traduzir-me através destas áreas. Por isso já sei como e quem é que eu sou : nível visual, a nível performático… acho que isso ajuda a tornar a minha cena coesa e sincera. 

Para além destas vertentes que tornam a tua música mais sensorial, quais é que consideras as influências que te ajudam a nível musical, de letras… O que te inspira a nível externo?

Eu sinto que sou influenciada por tudo. Gosto muito de ver coisas, mas nunca me prendo muito a nada, gosto sempre de ouvir muita coisa, o que anda aí… Não ouço muita música, não sei porquê, acho que dantes ouvia muito mais e agora como crio mais, não ouço tanta no dia-a-dia. Há muito barulho, então gosto mais de ficar no silêncio, e ir conhecendo as coisas. Mas acho que o que mais me inspira é mesmo a vida, os momentos e a emoção. Eu guio-me sempre pela emoção, é isso que me inspira a fazer arte. Nunca procuro um produto ou uma influência — do tipo “gostava de fazer este estilo”, “gosto desta vibe”, “queria ir por aqui” — não vou muito por aí, vou mais pelo que estou a sentir e pelo que o instrumental me pode trazer. Por acaso, há pouco tempo criei a minha primeira música assim, compus ao piano em teclas ao calhas, sem beat, e foi muito interessante… parto sempre do do que estou a sentir e do que tenho para dizer e deixo-me, sempre sem julgamento, expressar. É quase como se eu fosse duas pessoas e permitisse o meu interior falar, sem pôr barreiras.

Ou seja, quando estás no teu processo criativo, tu guias-te pelo instinto e não por uma ideia pré-definida. Acaba por ser o que tu sentes, o lado sensorial?

Exacto, eu nunca sei o que vou fazer até fazer. E trabalhar sempre com verdade é muito importante para mim.

Assinas o teu EP de estreia pela Melides Art Records. Como tem sido a integração na equipa, e como é que eles aceitam a tua liberdade criativa, visto que é uma coisa mais natural e não tão linear?

O melhor desta label é o respeito pelo que o artista é, pela forma de expressão, pela verdade do artista. Dão-me muita liberdade para fazer a música como a sinto e acreditam nela, o que é muito importante. 

E tens tido oportunidade de trabalhar com outros artistas da mesma editora ou tem sido uma coisa mais individual?

O Meoli, que não é um artista da label, mas que colabora connosco, esteve na produção deste tema “SOMOZUMNÃODOIS” e por consequência e convivência acabaram por surgir outros temas com produção dele , fora deste EP. Esta label gosta de promover a interacção dos artistas e é fixe, mas por acaso neste momento, estou numa de acabar o meu EP [de uma forma] um bocado mais individualista, porque quero que o público conheça o que sou sem interferências, marcar a minha identidade artística, a verdade, donde vem a minha arte, que é só minha. Não tenho trabalhado muito com os outros artistas, mas temos um bom contacto.

Disseste que ainda estavas a trabalhar no teu EP. Para quando prevês o lançamento? Haverá mais um single ou ainda não tens definido?

Ainda não temos definido, mas este ano com certeza mas eu espero antes do verão.

Quais são as tuas expectativas para o lançamento do EP? 

Estou super ansiosa para que as pessoas ouçam e que possam morar lá um bocadinho. Tento sempre trabalhar com a verdade e sinto que a minha música vai ter sempre um peso emocional grande, por falar de sentimentos. Quero muito que ouçam. O feedback deste single tem sido muito fofinho. As pessoas trazem-me a certeza de que transpareço… e é brutal isso, pelas mensagens que me mandam, de pessoas que não conheço que de repente estão a falar com a minha alma não com um produto. Está a chegar ao coração e à consciência e é o mais fixe. É o que eu quero que o meu EP faça, que permita às pessoas morar lá, chorar, rir, amar e, sei lá, sair um bocadinho deste mundo para estar mais para dentro. 

Estavas a dizer que o EP saia talvez antes do Verão, supondo que até lá desconfinemos, tens expectativas para palcos, concertos…? Tens ideias de como queres fazer o lançamento?

Na minha cabeça já moram mil ideias e tudo a pensar em como é que a expressão corporal e as outras áreas se podem podem cruzar nisto. Vai trazer o lado visual e corporal do que é isto que eu estou a sentir quando escrevo e canto. Quero muito cruzar artes. 

Podemos esperar mais videoclips para os teus singles

Sim, pelo menos mais um.

E vais continuar a explorar essa tua ampla sensibilidade artística?

Também. Por exemplo, neste temos a suspensão que se liga com a dança vertical, técnica que desenvolvi no Chapitô. E estas ideias surgem-me muito naturalmente, por exemplo “vou fazer um videoclipe de andas, porque faço andas”. Penso sempre onde é que posso usar as outras skills porque é isso é que vai fazer com que me consiga traduzir. Técnicas que fazem parte da minha vida, parte de mim e adoro que isso não seja uma cena pensada. Lá está, é pensado mas não é. Faz parte da minha vida é meu trabalho… fazer andas, performance. E é esta junção que vai traduzir tudo o que sou.


pub

Últimos da categoria: Entrevistas

RBTV

Últimos artigos