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Fotografia: Renato Cruz Santos
Publicado a: 27/12/2021

Em círculos atrás da própria cauda.

João Pais Filipe e Pedro Melo Alves + Jonathan Saldanha + berru no TBA: lugar à monotonia

Fotografia: Renato Cruz Santos
Publicado a: 27/12/2021

Janus, o mesmo objecto e a representação das duas faces. Dois lados que se relacionam. Os monitores de televisão deitados no palco, seguindo uma disposição previamente definida pelo colectivo do Porto berru. No centro os elementos percussivos de João Pais Filipe e, em frente deste, a bateria de Pedro Melo Alves; no meio dos dois, Jonathan Uliel Saldanha, numa espécie de Operador de Cabine Polivalente — e na certeza que o João Ricardo nos concederá tal comparação. Os três, também, do Porto. Sexteto sonoro e visual que se desdobra em dois trios. Trios que se interrelacionam e interpelam no último concerto de 2021 do TBA.

Coincidências, coincidências que se repetem nos últimos tempos – a preponderância para a percussão. Fixarmo-nos a Norte, para não desfiar lista que facilmente se poderia tornar demasiado extensa e nos álbuns editados, a solo – Sun Oddly Quiet de João Pais Filipe (Lovers & Lollypops, 2020), Entropies and Mimetic Patterns, de Gustavo Costa, na mesma editora, de 2021 e nos grupos que integram como é o caso de Pedro Melo Alves com The Rite of Trio e a recente edição de Free Development of Delirium (Clean Feed, 2021). Tendo tido correspondência numa prolífica apresentação ao vivo, sendo que João Pais Filipe e Pedro Melo Alves tocaram juntos recentemente no gnration e Novo Negócio – ZDB, em Junho deste ano.

TBA, 22 de Dezembro de 2021. A cadência repetitiva e a exploração das possibilidades rítmicas e tímbricas de Pais Filipe dão o mote, acompanhados pela desconstrução sonora de Melo Alves. O concerto ganha uma massa que previamente se adivinhava, conferido não somente pelas duas baterias, mas pelas texturas sonoras introduzidas pela maquinaria de Jonathan Uliel Saldanha. O volume do corpo atinge uma dimensão e forma considerável, sendo que o colectivo berru vai não só aumentando essa massa como o reconfigura, não só através da alteração da disposição e localização dos dispositivos visuais no palco, como introduzindo nova matéria do e no som com a manipulação de engenhos colocados em cada um dos ecrãs. A construção prolonga-se na soma de volume e massa conferindo um tom monótono que nos é bastante agradável, tendo para nós que monotonia é “a uniformidade constante de sons prolongados”.

Mas, como Janus, talvez tivesse sido melhor assumir todas as indecisões. As indecisões de um novo começo, de um trabalho novo e que se apresenta pela primeira vez. Permitir que cada um dos músicos assumisse a sua linguagem com uma limpidez nítida, reforço pleonástico mais que necessário, que cada um dos elementos se articulasse em pequenos sub-núcleos e sobretudo que não existisse uma sobreposição tão constante entre os elementos visuais e sonoros, que, por momentos, não só dificulta a leitura do mesmo, como sobretudo impede uma apropriação mais intensa ao objecto. A construção da monotonia é exercício que na sua génese requer paciência e contradição. E o quanto andamos precisados de ambas.

P.S.: Se nos permitem uma sugestão de leitura, recomendamos As indecisões de Janus, livro da autoria de Pedro Nora e que serviu de forma bastante trôpega para a articulação de umas quantas ideias.

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