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Publicado a: 27/11/2018

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[TEXTO] Alexandre Ribeiro

O que une Leonardo DiCaprio e J.I.D? Na perspectiva do autor de DiCaprio 2, a subvalorização do trabalho de ambos: em 2015, quando lançou o primeiro volume da saga, o artista de Atlanta ainda estava a tentar furar no super-competitivo e saturado universo hip hop. Para ele, a sua música já tinha qualidade suficiente para ser levada a sério pela “academia”, mas, tal como no caso de DiCaprio, que só venceu o seu primeiro Óscar em 2016, as benesses demoravam a chegar. Como é óbvio, o estatuto e a obra do actor norte-americano aquando da vitória eram bem diferentes daquilo que o newcomer J.I.D tinha há três anos. Porém, o sentimento era o mesmo: “isto que tenho aqui tem um valor imensurável”.

Em 2018, e um ano depois de assinar oficialmente pela Dreamville, a etiqueta de J. Cole, o seu status no mundo da música é diferente: The Never Story, álbum editado em 2017, mostrou que tinha potencial para ser um MC de primeira linha — só lhe faltava quilometragem e mais tempo com o seu patrão e mentor.

Falando de bars, a métrica, a entrega e o conteúdo vão variando — a qualidade mantém-se sempre na linha do excepcional –, mas existem dois rappers que se “impõem” quando tentamos descrevê-lo: Kendrick Lamar (na maneira como utiliza a voz e a forma como desliza de forma imprevisível em cima de todo o tipo de beats) e Lil Wayne (“Women throw pussy at me, I never seen cats flying”, de “Westbrook”, ou “Got a couple abortions, now that pussy’s a haunted house”, de “Skrawberries”, são reminiscentes das punchlines mais cómicas de Weezy). E, claro, Andre 3000: o membro dos Outkast, que também é de Atlanta, acaba por servir de guia espiritual. Apesar da cidade norte-americana criar mais Young Thugs, Migos, 21 Savages e Gucci Manes que Outkasts, e nada contra isso, J.I.D, tal como os seus parceiros EarthGang, mostra um outro lado mais preocupado com substância e atenção ao detalhe nas letras.

Não há dúvida que J.I.D. atingiu um novo nível como storyteller e escritor de canções, pintando descrições vívidas sobre a sua ascensão a partir do nada (“Just da Other Day”) ou relações falhadas (“Tiiied”, na companhia de 6LACK e Ella Mai). Este não é definitivamente o seu Good Kid, M.A.A.D. City — o próprio rejeitou a ideia num post no Instagram –, mas vê-lo a percorrer todos os instrumentais (que “engoliriam” muitos MCs sem skill) com a maior das facilidades é uma demonstração de poder de alguém que suporta o seu ego — sim, J.I.D sabe o quão bom é — com temas memoráveis como “Off Da Zoinkys”, “Workin Out” ou “Skrawberries”, que contou com um elenco de luxo na instrumentação e produção ( J. Cole, Mac Miller e Masego) e refrão (BJ The Chicago Kid).

Mais do que exercitar as suas capacidades nos diferentes ambientes — muita atenção aos beats fabulosos de Christo, Kenny Beats, Bobby Kritical, Frankie P ou Hollywood JB –, J.I.D fez algo ainda mais difícil: deixou claro que não está abaixo de Method Man, Joey Bada$$ e J. Cole, três nomes sonantes que, à partida, estariam à sua frente. Mas não: entrou em “Off Deez” com metralhadora na língua e obrigou Cole a transpirar; fez a sua melhor imitação de um Anderson .Paak com mais destreza técnica em “Hot Box” e forçou Meth e Badmon a apanharem a sua onda. No fim, todos saíram a ganhar: o rapper é o tipo de craque que brilha e faz os outros brilharem a seu lado.

Nos últimos dois anos, a evolução de J.I.D está resumida em dois discos que representam dois moods diferentes: recostou-se em The Never Story e saltou da cadeira em DiCaprio 2, mas a impressão que fica é que o melhor ainda está para vir. E aí sim, o tão desejado Óscar GRAMMY deixará de ser um sonho e passará a realidade.

 


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