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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 16/11/2020

Viver um dia de cada vez sem dar espaço para a negatividade.

Isac Ace: “Quando fiz o No Hard Feelings, imaginei um club escuro com fumo, suor e ecstasy”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 16/11/2020

Sem ressentimentos. É desta forma que Isac Ace se apresenta no seu mais recente EP, editado de forma independente no final de Outubro.

O produtor e DJ aproveitou o recolhimento imposto pela pandemia para se dedicar à criação: para já, o resultado são quatro faixas que se inspiram em géneros como boogie funk, chicago house e yacht rock, um trio improvável que passa a provável quando o vemos executado neste curta-duração.

O Rimas e Batidas enviou 10 perguntas por e-mail ao autor de No Hard Feelings, que nos falou sobre o título, as referências, Sweat & Smoke ou os seus próximos passos. E ainda ofereceu uma mix, que podem encontrar no final (juntamente com o alinhamento).



Acabas de apresentar um novo trabalho, No Hard Feelings. Podes começar por falar-nos no título: é uma mensagem para alguém, uma confissão?

O título original surgiu numa vida de player no passado e completo seria “No hard feelings, just hard f***s”, mas na verdade aplica-se a quase tudo o que acontece, seja bom ou mau faz parte da nossa evolução pessoal e serve de aprendizagem, por isso não guardar negatividade em relação a coisas menos boas no passado. É um state of mind que acho muito produtivo.

De que forma é que o novo EP se integra na tua discografia? Achas que traz novidades em relação a lançamentos anteriores?

Sem dúvida que traz sempre novidades, nem que seja por ser mais completo e rico musicalmente em relação a outras coisas que fiz no passado, mas considero que está ainda muito dentro do espectro que a minha sonoridade tem.

O disco explora uma sonoridade bastante clássica e tu mesmo apontas o boogie funk, o house de Chicago e até o yacht rock como referências. É nesse passado que se pode ainda encontrar o futuro? O que te levou para esses terrenos?

Acho que, quanto mais música oiço, mais aprecio as décadas de 70 e 80, pois acredito que foram as que mais se distanciaram dos cânones do que se considera música erudita, seja na exploração de novas sonoridades, no uso de tecnologia e na própria atitude. Exemplos disso foram o uso de certas máquinas criadas com um intuito específico, e uma nova geração pegar nelas e explorar inconscientemente um som do futuro que veio a definir a liberdade criativa presente na música contemporânea. Pessoalmente o que me leva a entrar nesses terrenos é achar que são o fundamento e a base, em parte uma homenagem e em parte também o desafio de ter conhecimentos para recriar esse som.

Queres falar-me do lado mais técnico do disco: mencionas ferramentas como o Juno 60, o Oberheim OBX e a LinnDrum como inspirações. Estas máquinas carregam ainda nos seus circuitos o espírito de um tempo, não?

Sem dúvida, acho que todas elas se tornaram ícones e acho que enquanto houver electricidade vamos continuar a explorar estes circuitos e a criar novas variantes sónicas. Exemplo disso é por exemplo a TR-808, criada como auxiliar para compositores clássicos terem uma estrutura rítmica que mais tarde tornou-se ícone das bases do hip hop de LA. Por ter uma complexibilidade sónica que um baterista não alcança, [a máquina] expandiu-se a muito do pop da década de 80. Apesar de nunca esquecida é engraçado como nas últimos anos se voltou a pegar no seu bass e, com um processamento mais moderno, é a base de 99% do trap.

Em que pé se encontram os Sweat & Smoke? Há planos para mais lançamentos desta tua parceria com o Guillaz?

Na verdade temos ouvido muito material que na altura ficou por editar e, agora que passou algum tempo, achamos que merece ser revisitado e editado juntamente com temas novos que de certeza que vamos criar quando houver oportunidade. Tem sido difícil gerir o tempo juntos agora que o Guillaz se mudou para o Algarve, mas há planos de passarmos uma temporada juntos e trabalhar de novo para o ano. 

Têm surgido múltiplas aproximações ao jazz por parte de uma nova geração que parece apontar a sua música mais para os clubes com pistas de dança do que necessariamente para os espaços tradicionais do jazz. Sentes algum tipo de ligação com essa cena?

Sem dúvida. Pessoalmente a minha educação musical em casa foi muito preenchida por jazz, mas sinceramente, apesar de gostar, sempre achei que um dia viria a ter mais maturidade para perceber a fundo e apreciar o quanto especial a cena é. Coincidentemente acho que essa maturidade não podia chegar em melhor altura do que agora em que a cena que falas está tão forte. Acho fantástico e por vezes até assustador o talento que a nova geração de músicos com formação de jazz está a atingir. E é impressionante o respeito que existe pelo passado apesar de todos eles estarem a inovar.  Acho que não tenho o mesmo tipo de talento para me poder incluir nessa cena, mas é claro que é bastante influente na música que faço.

Faria sentido pensar num combo para tocar esta música ao vivo? Achas que faria sentido? Isto, claro, quando voltarmos a ter palcos e espaços com condições normais…

Sinceramente acho que não é a intenção, apesar de adorar música “ao vivo” e ter planeado projectos nesse sentido. Acho que a cultura do DJing é ainda muito forte na minha vida e quando fiz estes temas imaginei mais um club escuro com fumo, suor e ecstasy. 

Criar música que impele à dança numa era em que estamos todos impedidos de dançar, pelo menos nos espaços em que sempre o fizemos, é uma forma de resistência?

Sim e não… é um sentimento estranho e estar nesta situação mete muitas coisas em perspectiva. Nunca fiz tanta música na minha vida como nestes tempos, talvez porque tenho tanto tempo livre, o que me leva a sentir: será a melhor altura para pôr cá para fora? Mas ao final do dia, fazer música e poder partilhá-la é um sentimento incrível e se as pessoas não a consumirem nas pistas de dança vão consumir em outros backgrounds e daqui a uns tempos essa música vai estar sempre relacionada com esses momentos. Sinceramente, quando houver pista de dança, tenho a certeza que vai continuar a haver música nova para lançar nessa altura também.

Podes dar-nos uns quantos nomes que são para ti referências para o som que exploras em No Hard Feelings?

Não querendo escrever um artigo da Wikipédia como resposta, acho que há três grupos distintos de influências. Em primeiro lugar, nomes pioneiros da música electrónica, seja no hip hop de LA (mais electro) e também no house mais Chicago. Marshall Jefferson,  Adonis, Ron Trent, Egyptian Lover, Mantronix, Jamie Principle, Larry Heard, Paul Hardcastle (sei que alguns nomes são ingleses mas falo da sonoridade). Outra influência importante e presente nas harmonizações e progressões melódicas vem muito dos géneros AOR, yacht rock ou soft rock, nomes como Steely Dan e o Donald Fagen, Kenny Loggins, Richard Page (Pages) e, claro, Michael McDonald. O tema “No Hard Feelings” é uma homenagem a esta sonoridade e, por último, acho que todos os músicos modernos como o Dâm-Funk, MNDSGN, Channel Tres, Thundercat, entre outros.

Finalmente: quais serão os teus próximos passos como DJ e produtor?

É muito complicado de momento planear alguma coisa, mas tenho a certeza que quero fazer mais pelas comunidades mais próximas e que estejam relacionadas com música, desde dar aulas e contribuir como o meu conhecimento, tentar ter uma abordagem mais saudável em relação à cultura DJ, preservar mais a parte cultural e menos a da indústria e, sem dúvida, explorar um lado mais independente em relação à música não comercial que faço. De resto é viver um dia de cada vez sem hard feelings.



[TRACKLIST] 

01. J Dilla ft Snoop Dogg – “Gangsta Boogie”
02. Whodini – “Friends”
03. Sweat & Smoke – “Andromeda Dance”
04. Channel Tres – “Weedman”
05. Mc Lyte – “Ruffneck”
06. Bad Azz ft Latoiya Williams & Doggy’s Angels – “How We Get Down”
07. Zapp – “Heartbreaker”
08. Isac Ace – “No Hard Feelings”
09. Sweat & Smoke – “Reality”
10. Malcom Mclaren – “World Famous”
11. Newcleus – “Jam On Evenge”
12. Mantronix – “Got To Have Your Love”
13. Mr Scruff – “Cheeky”
14. Pet Shop Boys – “West End Girls”
15. G.L.O.B.E. & The Wiz Kid – “Play That Beat Mr. DJ”
16. Isac Ace – “Oh Aché”
17. Paul Hardcastle – “Rainforest”
18. Vaughan Mason & Butch Dayo – “Feel My Love”
19. Egyptian Lover – “And My Beat Goes Boom”
20. Isac Ace – “Back In D Days”
21. Fleetwood Mac – “Dreams”
22. Isac Ace – “A Song 4 The Winter”

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