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Texto: ReB Team
Fotografia: Pedro Mkk
Publicado a: 09/10/2021

Rap, sons da afro-Lisboa, electrónicas e um pouco de jazz.

Iminente’21 – Dia 2: kriolus d’ouro

Texto: ReB Team
Fotografia: Pedro Mkk
Publicado a: 09/10/2021

Depois de uma quinta-feira em que se podia andar sem grandes encontrões, o segundo dia do Iminente já foi diferente: mais enchentes, mais energia e, também, mais confusão (mas da boa, tirando as filas para as desejadas hidratações festivaleiras). E, no meio de tanta oferta musical, Julinho KSD e Dino D’Santiago foram mesmo as grandes estrelas da noite.


[CelesteMariposa] Palco Cine-Estúdio

Eram 19h30 quando uma vaga de calor invadiu o palco Cine-Estúdio. Por lá encontrava-se instalado o projecto CelesteMariposa, representado por Wilson Vilares atrás dos decks e cujo nobre conceito consiste em transmitir a herança musical dos países africanos de língua portuguesa para públicos de outras latitudes e, por isso, muitas vezes desconhecedor de toda a riqueza que tem acompanhado as culturas de nações como Cabo Verde, Angola ou Guiné-Bissau.

Só faltavam os assadores de lado e o cheiro a grelhados no ar para criar o clima perfeito. Na ausência de outros adereços, a banda sonora fez o seu trabalho e carburou inicialmente ao ritmo dos Ferro Gaita, um dos maiores fenómenos de sempre da música africana que parece só agora estar a colher os devidos créditos juntos dos povos maioritariamente brancos. Para ilustrar a quente viagem que então se iniciava — e que ao longo de cerca de uma hora passou por por Tito Paris, Tabanka Djaz ou Yuri da Cunha — uma tela atrás do DJ emitia imagens de concertos e de bastidores de alguns desses nomes que tanto enriqueceram o cancioneiro negro, por vezes a contracenar com os embaixadores dessas culturas neste nosso Portugal, como João Gomes, Pedro Coquenão ou Rita Maia. Entre rostos e paisagens, palavras como “bailar”, “livremente”, “mestiçagem”, “afrobaile” ou “catinga” surgiam no grande painel, à vista de uma plateia que se manteve ao rubro do primeiro ao último minuto.

– Gonçalo Oliveira


[Ricardo Toscano] Palco Choque

Representante solitário da cena jazz portuguesa na programação do festival, Ricardo Toscano não se fez rogado na hora de assumir que lá estava para mostrar que é um dos músicos mais talentosos da sua geração, surgindo em palco na companhia de Romeu Tristão (contrabaixo) e João Lopes Pereira (bateria), músicos que estiveram envolvidos na criação do seu único álbum a solo, lançado em 2018, e que, há menos de um ano, até abordaram, juntos, uma obra maior de John Coltrane na Culturgest. Só para se perceber de que tipo de bichos de palco estamos a falar.

Sem invadir completamente a pista de carrinhos de choque, a plateia deixou-se embevecer pela elegância de um trio que já está mais do que oleado. Apesar do saxofonista ter, obviamente, o maior destaque, as suas pontuais saídas do centro permitiram-nos perceber melhor as dinâmicas individuais, que valem por si só, diga-se. No meio do turbilhão, as notas azuis fizeram-nos acreditar, por momentos, que não era bem ali, na Matinha, em Lisboa, que estávamos…

– Alexandre Ribeiro


[Julinho KSD] Palco Gasómetro

A expectativa era alta para perceber como é que um dos grandes discos de 2021 soaria em cima de um palco. Em estreia absoluta com uma banda — composta por Ariel (bateria), Wilson (baixo), Monksmith (teclas), Parafina (guitarra), Jörg (saxofone) e Fumaxa (DJ) — Julinho KSD surgiu enérgico em cena, também ele ansioso por poder mostrar ao vivo Sabi na Sabura, o álbum que andou a criar no último ano.

Obedecendo ao alinhamento desse ainda novo trabalho, o concerto arrancou com “Intro Panha Mau” seguido de “16 de Abril”. Ouviram-se alguns ruídos e, talvez como solução para os mesmos, o volume do palco principal desceu consideravelmente para suportar a actuação do rapper e cantor de Mem Martins. Entre os temas que vieram a seguir, já assentes numa ordenação diferente daquela que se encontra no longa-duração, um coro de fãs mais aguerridos era unânime: “mais alto!” Não por culpa do artista, mas ficou a sensação de que a festa poderia ter ganho outros contornos se as vibrações das notas e batidas tivessem sido sentidas com mais pujança nos nossos corpos.

“Vivi Good”, “Hoji N’ka ta Rola” e “Sentimento Safari” foram as canções que mais euforia geraram dentro de um espectáculo que nos apresentou novas roupagens para a música contida em Sabi na Sabura. É outra ginga poder contar com músicos para recriar um som que se quer assim tão orgânico e dançável. Dino D’Santiago passou o testemunho ao novo pupilo da música crioula quando surgiu para o ajudar a cantar “Kriolu” e, claro, também os restantes membros dos Instinto 26 celebraram junto de Julinho, dando aqui margem de manobra para incluir “Gangsta” e “Bandidas” na festa.

– Gonçalo Oliveira


[IKOQWE] Palco Cine-Estúdio

Entre Julinho KSD e Cintia conseguimos encaixar os IKOQWE, projecto erguido a meias por Pedro Coquenão (aka Batida) e Luaty Beirão (aka Ikonoklasta), que decidiu aproveitar a deixa de CelesteMariposa e manter as temperaturas bem altas na sala mais abafada do recinto. Na nossa breve passagem por lá, Coquenão ditava o ritmo através do seu altamente personalizado kit de bateria, Luaty atirava-nos palavras que importam e Piny e André Cabral interpretavam com o corpo (e muita alma) The Beginning, the Medium, the End and the Infinite, um disco que fundou um universo próprio. Sempre importantes, sempre pertinentes.

– Alexandre Ribeiro


[Cintia] Palco Choque

No mesmo dia em que lançou “Tou Na Boa”, faixa que interpretaria mais tarde no concerto, Cintia demonstrou que, realmente, está tranquila com a sua rápida ascensão. Depois de uma espécie de abertura proporcionada por DJ Décio e os colegas da Loco Knight, Londone e Pucci Jr., a rapper subiu a palco com a mesma atitude que, por norma, impregna nas canções e desfilou, sem grandes pretensões de fazê-lo com grande mestria, canções como “African Queen”, “Je t’aime” e “Grana”, a mais esperada e celebrada da noite e aquela que certamente ainda terá tempo de antena em alguns clubs por aí.

– Alexandre Ribeiro


[Dino D’Santiago] Palco Gasómetro

“Quero que este noite seja inesquecível para todos vocês,” dizia Dino D’Santiago no início de uma actuação que, maioritariamente, apenas contou consigo em palco. “Venho de uma semana difícil mas tudo o que vocês me derem eu prometo dar cinco vezes mais”, confessava por entre as quebras de “Nova Lisboa”. Ser-se performer é isto: querer sempre dar o melhor de si ao seu público e atrair as boas vibrações que acabam por contaminar todos os presentes. E neste caso o homem em palco deu tudo numa prestação vocal que foi imaculada do início ao fim, por vezes quase que a deixar-nos a questionar se não estaríamos a ouvir uma versão de estúdio.

Com KRIOLA como figura central, o concerto do cantor de Quarteira foi também palco de algumas (e muito boas) surpresas aqui e ali. Sem que nada o previsse, a certo ponto foi disparado um beat de drill ao qual Dino respondeu com a sua própria linguagem musical sem nunca cair na tentação de replicar aquilo que está a ser feito um pouco por todo o globo, mostrando aos presentes que o género nascido em Chicago e popularizado no Reino Unido pode, afinal, ser também cantado de forma ultra-melódica.

Embora achasse que desta vez iria cantar “Kriolu” sozinho, Julinho acabaria por aparecer em palco a meio do tema para nos dar a segunda dose do tema nessa noite. Ouviu-se também “Hwwambo”, tarraxo futurista de DJ Nigga Fox, neste alinhamento, cujo final estava reservado para ser de arromba: Branko haveria de surgir para ajudar Dino a interpretar as últimas faixas, entre elas material inédito que o par tem estado a cozinhar em estúdio.

– Gonçalo Oliveira


[Holly] Palco Choque

Na terceira actuação da noite no Palco Choque, o jazz e as batidas afro desapareceram e deram lugar à música electrónica mais ostensiva pelas mãos de Holly, alguém que tem feito burburinho nos Estados Unidos da América com esse ângulo mais electrónico — basta ouvirmos o trabalho que criou com nomes como Machinedrum ou Baauer para entendermos isso. Antes de seguirmos para The Alchemist, o autor de Dark Skies & Holy Grail recordou-nos ainda sua profunda ligação com o hip hop: houve introdução personalizada de Valete e selecção de temas, nalguns casos remixes, de Wet Bed Gang (a escolha foi “Sai do Meu Hood”, faixa produzida pelo próprio), Travis Scott, Kanye West ou Pop Smoke.

– Alexandre Ribeiro


[The Alchemist] Palco Gasómetro

“Será desta que vamos conseguir escutar um pouco do tal projecto secreto que tem com Vince Staples? Talvez uma pérola de Earl Sweathirt lançada de surra? Faixas que sobraram do longo trabalho que tem vindo a desenvolver com Boldy James e que até já valeu à dupla uma nomeação para os GRAMMY?” Tudo perguntas que pairavam na nossa cabeça nos instantes que antecediam a entrada de The Alchemist no palco Gasómetro. A resposta a tudo isto formular-se-ia rapidamente nos minutos que se seguiram e, infelizmente, o combustível era do velho.

Entende-se que o histórico produtor tenha de cumprir com certos standards para manter o espírito festivo lá bem no alto e, assim, garantir a felicidade de todos — do público, que domina cada êxito que disparou da mesa de mistura, e do promotores, que tanto amam fórmulas mais práticas e infalíveis. Numa altura em que atravessa um novo pico de criatividade, que ainda ontem nos havia dado This Thing Of Ours 2, não se percebe que as memórias que tenhamos para guardar desse momento sejam ao som de “Shook Ones, Pt. II”, “Hold You Down” ou “Worst Comes To Worst”.

– Gonçalo Oliveira


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