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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 27/08/2021

Na última sexta-feira de cada mês, Miguel Santos escreve sobre artistas emergentes que têm tudo para tomar conta do mundo da música.

Abram alas para… McKinley Dixon

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 27/08/2021

Este ano assinalam-se 52 anos do lançamento de Kind Of Blue. O álbum seminal de Miles Davis é um projecto essencial para qualquer fã de jazz e de música. Há todo um misticismo à volta do álbum, e custa a acreditar que surgiu de duas sessões de improvisação, tal é o calibre da sua música. Ainda que a proficiência dos músicos seja o segredo do seu sucesso, Kind Of Blue foi orquestrado por Davis, um verdadeiro líder de banda, capaz de direccionar os músicos que o acompanham e trazer ao de cima o melhor ambiente para acolchoar o seu trompete inventivo e as suas inspiradas composições. De forma semelhante, o rapper McKinley Dixon revela-se um maestro na sua música, capaz de adequar os instrumentais à sua entrega versátil.

O artista de Richmond, Virgínia, é eficaz na sua missão de juntar instrumentais vivos à sua mensagem consciente. Nada soa a loop, tudo soa orgânico, e a sua entrega vocal espelha a imprevisibilidade de muitos dos seus beats. A improvisação que ouvimos nos instrumentos é invocada na cadência do artista, e o seu timbre anasalado traz-nos à memória o veterano Q-Tip e, mais recentemente, o entusiasmante “novato” Topaz Jones. À semelhança do segundo, Dixon é extremamente focado na maneira como quer transmitir a sua mensagem. O resultado são temas densos, que demoram a desabrochar totalmente na mente do ouvinte. Mas quando se dá esse clique, não há mel mais doce. 

Os seus primeiros passos na música foram com Who Taught You to Hate Yourself, lançado em 2016, mas já na altura o artista almejava algo mais: este álbum foi o primeiro capítulo de uma trilogia cujo último saiu este ano. A colaboração com outros músicos sempre esteve presente. Em The Importance of Self Belief, o seu segundo projecto, trabalharam mais de 30 músicos. No centro está Dixon, que dá o espaço necessário aos artistas para descobriram como adequar a sua perícia à música do artista. O resultado são álbuns com pulso, populados por músicas com um groove impecável como “Bare Knuckle” ou “Black Boy Flies”, que saltitam entre os ouvidos e a mente.



À medida que se desvenda a música de Dixon, há uma comparação que inevitavelmente há-de surgir: as aproximações estéticas ao álbum To Pimp a Butterfly, o “jovem” clássico de Kendrick Lamar. Ainda que as parecenças existam, o artista refere Kamasi Washington — responsável por muitos dos arranjos instrumentais desse álbum de K-Dot – e a sua epopeia jazz The Epic como inspirações para o seu método de trabalho e para a maneira como explora os arranjos das suas músicas. Nada é criado no vácuo, e a confluência de sonoridades é inevitável. Mas nesse encontro há espaço para a novidade, e as criações de McKinley Dixon surgem do entendimento dessa premissa. 

Este ano apresentou For My Mama And Anyone Who Look Like Her, um projecto em que a sua maturidade enquanto letrista e “distribuidor de jogo” é patente. No centro da sua rica e chamativa instrumentação está um álbum introspectivo, em que Dixon utiliza a música de forma terapêutica. Fala consigo mesmo em “make a poet Black”, o teatral e pessimista primeiro single, e em “bless the child” fala com o amigo que faleceu, o trágico final de uma vida em 2018 que marcou profundamente Dixon. A sua existência é examinada através da lente da metafórica e multifacetada “Chain Sooo Heavy”, e na combativa e ameaçadora “Swangin’”, a sua energia é dirigida aos outros.

Há um debate interno e externo em For My Mama And Anyone Who Look Like Her, unidos pela identidade musical de McKinley Dixon. E esta identidade é, sem dúvida, a de um líder de banda. Vemos curiosidade, alguém que está a aprender com os melhores para que possa partilhar com o mundo as palavras que só ele poderia escrever, e as melodias que só ele poderia compor.


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