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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 08/12/2020

Uma inestimável visão do passado assinada por quem esteve mesmo lá!

Greg Wilson reúne memórias no livro Discotheque Archives

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 08/12/2020

Greg Wilson’s Discotheque Archives é o título do livro acabado de editar que reúne material da coluna com o mesmo título que assinou regularmente na DJ Mag desde 2015. Depois de ter sido agraciado com o galardão Industry Icon pela revista britânica, o lendário DJ foi desafiado a transformar numa coluna mensal as suas vívidas memórias da cultura de clubes que antecedeu a era das raves no Reino Unido. Sempre acompanhado por uma ilustração de Pete Fowler, o trabalho de Greg Wilson versou sobre DJs míticos, etiquetas discográficas de culto, clubes que fizeram história e faixas que alcançaram a eternidade.

Com design a cargo de Slim Smith do Liverpool Arts Lab, o livro reúne abundante material das colunas de Greg Wilson, com uma nova introdução, conclusão, índice remissivo e uma lista extensa de 500 discos.

“Escrito a partir da perspectiva pessoal de Greg Wilson, com inúmeras experiências vividas na primeira pessoa que lhe permitiram acompanhar desenvolvimentos na cena, a história começa nos anos 60, mais de uma década antes de ele se ter atirado aos gira-discos, numa era em que as fundações da cultura foram lançadas por uma série de pioneiros”, escreve-se nas notas de apresentação do livro. “Com o cenário montado, boa parte do livro foca-se nos anos 70, à medida que as capacidades de mistura começaram a ser aprimoradas pela comunidade de DJs, inicialmente em Nova Iorque, enquanto o avanço da tecnologia culminou numa explosão de experimentação electrónica underground nos anos 80, com a história a terminar mesmo em cima da muito recontada história da explosão das raves”.

O livro de edição limitada está disponível para ser encomendado no Bandcamp e as encomendas deverão começar a ser enviadas no final desta semana.

Recuperamos aqui uma conversa com o lendário DJ para o jornal que o Lux manteve durante alguns anos.



[Greg Wilson: do passado ao futuro]

Que um DJ armado com fita magnética, uma lâmina e cola possa reinventar o mundo já não é novidade. Que o tenha feito na altura em que os gravadores de bobines representavam um ponto alto da tecnologia áudio e consiga voltar a fazê-lo quando os zeros e uns concentram todos os significados no hard drive de um computador é que já não é tão natural. Mas Greg Wilson é assim: um homem de dois mundos e duas épocas, com um currículo suficientemente dilatado para aí podermos ler datas como 1975 e nomes de clubes como o lendário Haçienda. Greg é um espécime raro: um representante de outra época que redescobriu uma total pertinência num presente que tem insistido em investigar o passado para assim poder preparar o futuro.

Greg deixou em primeiro lugar a sua marca na cena jazz-funk e, com a chegada dos anos 80, rapidamente aderiu aos sons mais electrónicos produzidos no âmbito da música negra. A palavra “electro” significava algo tão diferente nesse tempo… Foi também um pioneiro em importar para Inglaterra as técnicas de mistura que os djs de disco em Nova Iorque tinham desenvolvido, aplicando-as nos seus hoje míticos sets.

Em 2003, Greg Wilson regressou ao activo quando a música completou mais um dos ciclos que nos reintroduzem determinadas épocas do passado. De repente, à luz do século XXI, as pistas que Greg Wilson tinha percorrido até meados da década de 80 voltavam a fazer todo o sentido. Em 2005 Greg antecipou igualmente a corrente explosão de edits com o fabuloso “Credit to The Edit” lançado na atenta Tirk, um disco em que se reorganizam clássicos de forma pertinente e sobretudo perfeitamente adequada às coordenadas actuais. E não voltou a olhar para trás: de Tóquio a Lisboa e de Londres a Nova Iorque, muitas têm sido as paragens deste sofisticadíssimo DJ a quem colocámos um par de perguntas.

Tocou no lendário Hacienda na primeira parte dos anos 80. Que recordações guarda desse período?

O Hacienda ainda procurava o seu lugar quando eu passei por lá. Eles tinham grandes problemas de acústica, que nunca resolveram completamente, e a cabine de Dj ficava num espaço ao lado do palco nesta altura – algo totalmente impraticável. Os regulares do Hacienda, principalmente estudantes e indie kids, não estavam muito virados para a música de dança, por isso foi uma luta para mim. Hoje, com a perspectiva que o tempo facilita, vejo que o meu papel foi o de plantar sementes que haveriam de florescer mais tarde, já depois do período que lá passei.

Tivemos algumas noites boas, mas no geral foi um período muito frustrante para mim já que as minhas noites no Wigan Pier e no Legend estavam mais desenvolvidas. No Hacienda parecia que em muitos aspectos eu estava a recuar. O Legend era, sem dúvida, o melhor clube em Manchester nesse tempo, por isso tocar no Hacienda não era propriamente um passo em frente na carreira. Tratava-se mais de apresentar a um público novo o tipo de coisas que eu já tocava na cena de música negra.

Retirou-se enquanto DJ mesmo antes da música de dança evoluir para uma mega-indústria. O que pensou quando a cena rave explodiu em Inglaterra?

Lembro-me de pensar que algo de estranho se passava quando comecei a ver os DJs apresentados como shamans e todo esse tipo de cenas que acompanhou essa explosão. Os bons DJs sempre tinham sido respeitados, mas agora estavam a ser adorados! Pensei que as coisas estavam a ir um pouco longe demais e várias pessoas começaram a acreditar nos seus próprios mitos e a ver-se como sendo maiores do que a música que tocavam. Teria sido muito desconfortável para mim ser apanhado em tudo aquilo embora hoje eu perceba como tanta gente se deixou apanhar por tudo aquilo.

Nunca me passou regressar ao djing nessa altura, por isso apreciei esse período pelo que ele foi – um descarregar de empatia de uma geração de clubbers que tinham abraçado a música de dança com a ajuda de um pequeno comprimido. Embora eu tenha experimentado as coisas também, eu vi tudo de uma perspectiva diferente, tendo em conta o meu passado como dj. Foi interessante ver tudo a desenvolver-se e hoje olho para o período dourado (88-90) e tenho boas memórias.

O que é que o levou a regressar ao activo em 2003?

O facto de, tendo em conta a passagem do tempo, a cultura de dança no Reino Unido estar agora a ser documentada de uma perspectiva histórica. O único problema foi que a cena negra neste país, que tinha mostrado o caminho a seguir, tinha sido marginalizada e frequentemente omitida por completo. Por isso pensei que seria construtivo partilhar a minha experiência pessoal e arquivar uma série de material através de um site na Internet (www.electrofunkroots.co.uk) para acrescentar algum equilíbrio à forma como o passado estava a ser representado. E foi a partir daí que comecei a receber convites outra vez.

Acerca do boom de re-edits: pensa que a diferença nas ferramentas – da fita e lâminas afiadas até aos laptops – pode ter de alguma forma comprometido a qualidade dos edits que todos parecem andar a fazer agora?

Na verdade, não, só mudou o processo e em muitas maneiras para melhor. Ainda bem que comecei a fazer edits em fita porque foi uma aprendizagem importante, mas os computadores oferecem muitas mais opções e permitem poupar montes de tempo. Há mais pessoas a fazerem edits agora, porque a tecnologia está ao alcance de todos, por isso mesmo, tendo em conta a lei das probabilidades, claro que vão surgir muitos mais edits medíocres. No entanto, também há muito boas coisas por aí, por isso é mesmo só uma questão de saber separar o trigo do joio.


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