LP / CD / Cassete / Digital

Greentea Peng

MAN MADE

AMF Records / Universal / 2021

Texto de Rui Miguel Abreu

Publicado a: 07/06/2021

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Há um método por trás da “loucura” de Aria Wells, mulher que o mundo está prestes a conhecer como Greentea Peng, assim que o seu álbum de estreia, MAN MADE, conquiste a atenção que merece. A apontada “loucura” é simples de descrever: a cantora que não teme declarar “I believe in magic” retirou-se para uma residência artística com a sua banda de sete elementos numa remota zona rural britânica e ai mesmo, alinhando os seus masters para 432Hz em vez dos 440 que a indústria admite como standard (as vibrações vão mais fundo, garante a hippie que existe dentro desta “sista”), cruzou dub e neo-soul, hip hop e jazz, drum n’ bass e funk, numa mistura que não é suposto resultar, sobretudo se nunca provaram salada de queijo de cabra com nozes, mel, pêra em pickle e gelado de tomilho porque tal ideia vos parece absurda.

O que se escuta em MAN MADE resulta da combinação de um alargado conjunto de inputs: de Swindle a Mala, foram vários os produtores desafiados a apresentarem matéria que, em estúdio, foi depois moldada com os pulsares orgânicos da banda que responde ao nome Seng Seng Family. Que um álbum longo de 18 faixas soe tão coeso quanto este é sinal da solidez da visão da mulher que, apesar do enganoso título, conduz aqui as operações. Psicadélico na verdadeira acepção da palavra (a magia em que Greentea garante acreditar deve ser a que está contida em certos cogumelos), há por aqui uma atmosfera de difusa deslocação de tempo e espaço, num álbum que parece surgir no mesmo cumprimento de onda que nos deu música de Soul II Soul ou Massive Attack, Erykah Badu ou Ini Kamoze, Lauryn Hill ou Damian Marley, mas que, apesar de tanta familiaridade, consegue soar fresco. Em termos poéticos, Greentea Peng não se afasta dos relatos dos “sufferers”, abordando os abismos do coração e as traiçoeiras armadilhas de uma sociedade injusta, mas não conseguindo nunca descartar um inefável optimismo que marca a sua voz, a sua entrega, e, sobretudo, a moldura musical que a envolve.

Em “Meditation”, a mais longa faixa do álbum que nos seus mais de sete minutos parece um mantra quando comparado com a brevidade de “This Sound”, por exemplo, uma tranquila figura rítmica sugerida por tablas, acompanha um loop de poeira harmónica que parece ter-se soltado de um Fender Rhodes, numa espectral exposição expandida com efeitos de dub a que depois se adicionam sombras distantes de guitarra e um esparso e acústico piano de fraseados jazz. Coisa pouca para tão hipnótica resolução que o tema impõe, algodão doce nos nossos ouvidos, cama de penas para nos deitarmos, massagem para o espírito. E podem multiplicar essa ideia por 18. Pode parecer loucura, mas a verdade é que funciona.


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