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Garrett Sparrow

RAMBO

Romaine Records / 2025

Texto de Mariana Rosas

Publicado a: 15/09/2025

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Lançado a 18 de julho, RAMBO é o álbum de estreia a solo de Garrett Sparrow, membro dos Biking With Francis, e surge como uma proposta marcante no cruzamento entre R&B, indie e bedroom pop. O disco, com 11 faixas, resulta de um ano e meio de trabalho e distingue-se pela frescura e criatividade com que se apresenta no panorama contemporâneo. Desde a primeira faixa percebe-se uma intenção clara: a de criar uma identidade própria que, embora consciente das suas influências, se afirma pela riqueza tímbrica, pela minúcia na produção e pela forte expressividade emocional. Sparrow revela um olhar artístico que foge à fórmula mais previsível do género, trazendo diversidade de texturas e um sentido de unidade que transformam este registo numa estreia notável.

Um dos elementos mais evidentes da linguagem musical do artista é o uso de polifonias vocais, recurso frequentemente associado a Tyler, The Creator. Sparrow explora esta ferramenta de modo inteligente, usando a sobreposição de vozes não apenas como ornamento, mas como verdadeiro alicerce harmónico e tímbrico das canções. O resultado é uma música aberta, luminosa e envolvente, que mantém o ouvinte cativado pela variedade de camadas sonoras. Esta abordagem evidencia não só uma preocupação com a dimensão estética da voz, mas também uma conceção da mesma enquanto instrumento central na arquitetura musical, ampliando a expressividade e a riqueza do álbum.

Já no lado mais lírico e emocional de RAMBO, Sparrow aproxima-se da sensibilidade de Frank Ocean, um outro visionário saído da escola Odd Future. O disco partilha a mesma capacidade de conjugar intimismo e contemplação com a celebração da vida e da experiência humana. A faixa de abertura, “DEW”, é paradigmática nesse sentido: breve, minimalista e de uma beleza singela, funciona como um gesto inaugural que abre caminho para o restante percurso sonoro. Ao longo do álbum, esta ambiência introspectiva surge sempre articulada com a procura de novas cores instrumentais e com a exploração de um espaço sonoro que se quer cósmico e imersivo. Sparrow demonstra aqui não apenas técnica, mas sobretudo intuição musical, tornando o álbum uma experiência de escuta emotiva e esteticamente consistente.

A dimensão instrumental é igualmente significativa. A guitarra elétrica, utilizada de forma contida e expressiva, surge como contraponto nostálgico ao fulgor das polifonias vocais, revelando uma sensibilidade de orquestração que ultrapassa o papel tradicional deste instrumento. A harmonia é rica e diversificada, recorrendo a progressões inesperadas, acordes de sétima maior e cadências inspiradas no jazz, que trazem surpresa e sofisticação ao discurso musical. Do mesmo modo, o tratamento rítmico revela uma versatilidade assinalável: em faixas como a já mencionada “DEW”, predomina a fluidez quase livre, enquanto “SOFTIE” assenta numa métrica precisa e “TAKE PICTURES” demonstra criatividade na manipulação de acentuações, resultando em cadências dinâmicas e polirrítmicas. Este jogo entre liberdade e rigor, simplicidade e complexidade, mostra a maturidade do artista na construção de ambientes contrastantes e coesos.

O LP como um todo apresenta-se com um sentido de viagem e circularidade. O percurso começa em registo intimista e encerra-se com “LAWN”, uma faixa que amplia e abre ainda mais o horizonte sonoro, como um fecho que ecoa e transcende o início. A coesão estrutural de RAMBO confere-lhe um caráter narrativo, como se cada tema fosse uma etapa de um dia vivido intensamente, traduzido em som. Sparrow demonstra capacidade de síntese, diversidade estilística e uma atenção minuciosa ao detalhe que o posicionam como uma voz emergente a acompanhar de perto. Este álbum de estreia não é apenas uma promessa, é já um objeto artístico completo, onde se reconhece um equilíbrio raro entre frescura criativa, sofisticação técnica e autenticidade expressiva.


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