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Publicado a: 27/04/2018

Faixa-a-faixa: O novo EP de Boss AC explicado pelo próprio

Publicado a: 27/04/2018


[TEXTO E CAPTAÇÃO IMAGEM] Rui Miguel Abreu  [EDIÇÃO] Luis Almeida [FOTO] Arlindo Camacho

Boss AC chegou! Outra vez…

O Mandachuva volta a fincar os pés no presente depois de ter criado alvoroço ao lado de Sam The Kid com o fenómeno “Caravana” (faixa que soma 1 milhão e 300 mil views no YouTube e que foi campeã de remixes na internet). Desta vez assume-se como Patrão num novo EP de cinco temas que anuncia ano de forte actividade em nome próprio, actividade essa que deverá traduzir-se, mais para a frente, num novo álbum. Mas para já vale este trabalho que se apresenta forte, carregado de rimas para descodificar, cheio de recados para o mundo, de confissões, de dores de alma.

“Uma das coisas que eu acho que este EP conseguiu é que cada uma das músicas fala por si”, explicou-nos AC em conversa que vai ao fundo de cada um dos temas. “Eu já não sou muito dado a entrevistas, na verdade. Então a maior parte das perguntas que eventualmente me farão nas entrevistas têm respostas que estão já incluídas nas músicas.” E além das músicas, já lançadas em plataformas como o Spotify, há ainda que contar com o extraordinário vídeo de “Queque Foi”, tema com refrão que promete incendiar as pistas este verão e com que Boss AC reclama o lugar que legitimamente lhe pertence. Podem vê-lo mais abaixo…

Abaixo, Boss AC, o Mandachuva — o Patrão! – em discurso directo.

 


[“As Coisas São Como São”]

“Esta acho que é a música que faz sentido enquanto minha primeira música, após este tempo todo ausente das edições. Chama-se ‘As Coisas São Como São’ e é exactamente isto: as coisas são como são. É aquela música que, mesmo se as pessoas ouvirem sem a minha voz, vão reconhecer que aquilo é Mandachuva style — sou eu. E fala exactamente disso. De como as coisas mudaram, os tempos mudaram, e um artista para se manter relevante tem de acompanhar os tempos. E eu tenho feito isso. Ou pelo menos tento fazer isso, mas sem perder a minha essência. Fala um pouco também na questão de a música ser cada vez mais efémera. Daí eu dizer ‘uns chegam, outros vão mas eu não’. Porque o difícil, penso eu, não é ter um sucesso. É mantê-lo. Essa é a parte difícil. E a verdade é que eu devo estar a fazer alguma coisa bem, porque estamos em 2018 e ainda cá estou. Posso sentir-me muito grato de ter tido até então – e espero continuar – uma carreira muito bem sucedida, que tem sido sempre crescente. E tem sido sempre fiel a mim próprio. Uma das coisas das quais me orgulho é de não ceder a pressões. Faço aquilo que eu acho que vale a pena ser feito na altura. Já passei por várias fases, do mais underground ao mais pop — o meu último álbum foi decididamente mais pop, mais mainstream. O que não é mau. Muitas vezes as pessoas falam disso como se fosse um deito mas não é. Para já, é o que eu sou, sou ecléctico, sou um melómano. Gosto de música, gosto de muita coisa. Então gosto de pensar em conceitos e o conceito desse álbum foi mesmo esse. O conceito do próximo álbum e o conceito deste EP está perfeitamente espelhado nesta primeira música.

O beat é aquele boom bap, não há que enganar. É só juntar água, vai ao microondas e ‘tá feito. Tem aquele bass à AC. Tenho mostrado a algumas pessoas e o comentário que tem sido mais frequente face ao beat é ‘isto é a tua cara. É Boss AC. É Mandachuva‘. É um beat do qual gosto muito. Há faixas que saem à primeira, outras que passo meses à volta delas ou nem acabo. Nesta saiu tudo de rajada. A letra, o conceito, o beat. E adoro tudo neste tema. É daquelas que eu ouço tipo ‘porra, eu gosto mesmo desta merda’. Há músicas assim e o ‘As Coisas São Como São’ é assim.

Uma das características deste EP e do próximo álbum — tal como eu fazia antigamente — é que vem de um processo muito solitário. Diria que 95% sou só eu — eu gravei, eu misturei, eu compus. Fiz absolutamente tudo, tirando a ‘A Vida Continua’, que falarei sobre ela mais à frente. Isso fez com que eu regressasse àquela forma de trabalhar… Back in the days. É mesmo back in the days. Eu a trocar ideias comigo próprio e pronto. As coisas são como são. Acho que não podia haver melhor entrada para o EP.”

 


[“Queque Foi”]

“Tem aquela atitude, aquela garra, que eu usei no princípio da minha carreira. Este EP e o próximo álbum são baseados no Mandachuva e, de uma forma mais lata, no hip hop dos anos 90, com os quais eu cresci. É o Mandachuva em 2018. Tem essa atitude mas é num beat mais actual,mais próximo daquilo que se faz hoje em dia. Não diria que seja um trap, embora influenciado pelo trap. Fala daqueles haters de estimação. Daqueles que estão sempre a desejar-te mal e prevêem sempre desgraça em tudo aquilo que tu fazes. A verdade é que há vinte e tal anos que me prevêem uma desgraça e eu cada vez me sinto mais forte. É isso que a música diz. Pode parecer que estou mais chateado ou numa vibe de confronto mas não é, de todo, isso. E o vídeo que a música vai ter vai dissipar todo o tipo de dúvidas em relação a isso. O vídeo está qualquer coisa de fabuloso e inesperado, deixo já essa dica.

O beat tem aqueles 808s. É irónico que se ouçam tanto hoje, porque foi assim que as coisas começaram. Se formos a ver isto é um retrocesso. Esse bombos e tarolas electrónicas foi como as coisas começaram. O grandes beats do Afrika Bambaataa, por exemplo. O “Planet Rock” foi feito com 808s. É o futuro, é o passado e é o presente. É cíclico.”

 


[“A Vida (Ela Continua)”]

“Podíamos estar aqui três ou quatro horas a falar sobre esta. Eu vou tentar ser o mais curto possível. É a música mais importante para mim, por várias razões. Provavelmente é a música mais pessoal que eu escrevi para este EP. Foi a última música que eu fiz ao lado do meu querido e estimado amigo DJ Bernas, que nos deixou em Dezembro de 2017. É uma música que ele adorava e até disse na altura: ‘AC, parece que esta música foi escrita para mim’. É irónico porque eu fiz dois temas com ele apenas. Um não sei se vou usar e o outro, que é este, já usei e vou voltar a usar. Um chamava-se ‘Morreu’ e o outro chama-se ‘A Vida (Ela Continua)’ . Se isto não é um sinal dos deuses, então eu não sei o que é que é. É tudo uma questão de interpretação mas é assim que eu interpreto. Quem ouvir a letra, sabendo da história, parece que a música foi escrita à posteriori mas não. Foi escrita antes. E a verdade é mesmo essa. A vida continua, a gente lambe as feridas e ela continua.

Em relação ao beat, originalmente não era esse. Eu fiz esta música com um sample — que não vale a pena revelar agora porque não sei se o vou usar — do qual pedi autorização para usar mas que não me chegou a tempo. Fazia questão de lançar esta música, tinha de fazer parte deste EP, porque é também um tributo ao Bernas. Acabou por sair num beat completamente diferente do original mas que eu adoro. Teve a participação da Vanda e eu usei a banda de uma forma diferente. Em vez de fazermos uma música enquanto banda, por assim dizer, eu samplei a minha própria banda. Eles tocaram a partir de uma ideia minha e eu samplei. Choppei o piano, o baixo, a guitarra e montei a cena numa vibe de chopped and screwed, por assim dizer. Ficou um beat que me diz muito. É uma música que durante algum tempo me custou ouvir, por muitas razões. Eu até quis desistir dela mas depois estava a ir contra o que a própria música diz. A vida continua e ela continua mesmo.”

 


[“O Verdadeiro”]

“Eu diria que é um hino ao hip hop. Representa tudo aquilo que eu disse que será o próximo álbum. Esta homenagem ao boom bap, aos anos 90. Tenho a ajuda preciosa dos meus manos Black Company e do DJ Ride, que fazem deste tema uma viagem no tempo. São quase cinco minutos de tema, sem refrão, sempre a bombar. A todas as pessoas que eu mostrei a música, pelo menos nas situações em que eu tive presente, ninguém consegue parar a música a meio. Querem ouvir a história até ao final. É uma homenagem às nossas origens, ao nosso percurso, à forma como nos apaixonámos pelo rap e pela cultura hip hop de uma forma geral.

O beat não há que enganar, é mesmo aquele boom bap straight. Um grande sample de piano, uns kicks e a tarola a soar sem medo. É uma música que eu adoro. Traz-nos muitas memórias. Lembro-me de quando estávamos em estúdio o Gutto dizer ‘AC já chega’. Porque eu comecei a escrever, escrever, escrever. E eu se fosse a escrever tudo do que me lembrava acho que a música ia ter uns 30 minutos, só eu. Há muita coisa para dizer, há muitas pessoas a lembrar, muitas pessoas para homenagear. Adoro este tema. ‘O Verdadeiro’ é mesmo verdadeiro. Para além disso, há uma outra ligação. Eu fiz um tema para os Black Company que foi ‘O Genuíno’ e, passados estes anos, fazemos ‘O Verdadeiro’. Continuamos genuínos.”

 


[“É Pa Ganhar”]

É um dos temas mais frescos deste EP porque tem uma vibe boom bap num beat que não é nada boom bap. É super fresco. É um beat que ’tá a 96 BPMs mas que tem uma cadência de metade disso, é como se tivesse a 48 BPMs. Tem um bass sintetizado sempre corrido, que acho que aquilo é metade da música. Adoro aquilo. E a música é uma música que eu tenho usado para me motivar. A ideia da música é ‘tudo o que um gajo faz tem de ser para ganhar. Temos de entrar com uma atitude positiva e com uma atitude de vencedor. ‘Tou aqui é pa ganhar’. É exactamente isso que a música diz. Eu faço um paralelo com o futebol, porque faço várias menções ao rematar, ao marcar golo. Não é uma música de futebol, ainda que se a selecção quiser usar como forma de ganharmos o mundial eu agradeço. Acho que tem tudo a ver. Não foi pensada dessa forma mas faz sentido e é uma música que me motiva muito. É uma música que eu uso no ginásio, porque voltei para o ginásio para mandar a pança abaixo — está a correr mais ou menos bem, penso eu. E para correr, que era uma coisa que eu não fazia há bué e pus aquela música em repeat e quando dei por mim ‘tava a correr há praticamente uma hora, que é algo que eu não fazia há muito tempo. Esta música é mesmo aquele boost para ‘tu levanta-te e faz-te à vida’.”

 


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