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Fotografia: gadutra
Publicado a: 18/11/2020

O que conta é a INTENÇÃO.

EVAYA: “Escolhi aprender sobre como estar mais atenta a mim e procurar a verdade nas minhas emoções”

Fotografia: gadutra
Publicado a: 18/11/2020

O primeiro EP de EVAYA foi lançado em meados de Outubro. Depois de alguns singles soltos, a produtora estreia-se num trabalho mais ambicioso e exigente, que a afirma como uma artista a seguir no panorama de cantautores da música electrónica portuguesa. Encontrem-na ali no “cruzamento” que liga Caroline Polachek, Filipe Sambado e FKA twigs

Prova de que por vezes a mudança de hábitos (da vida urbana para a bucólica) ou a exploração de novos instrumentos (do uso somente do computador para a nova adição de um microKORG à sua produção) são elementos que desbloqueiam novas ideias para o processo criativo, Beatriz Bronze ganhou coragem para sair da zona de conforto que, segundo a própria, não a permitia experimentar, ou mesmo expressar a sua verdadeira voz. Ainda que a descobri-la, INTENÇÃO demonstra já uma sonoridade coesa e demarcada, entre o registo de cantautora e o de produtora de electrónica mais angulosa, e esses dois lados informam-se um ao outro.

Numa crítica publicada no jornal universitário ComUM, David Rodrigues escrevia que “ouvir INTENÇÃO do início ao fim, de preferência confortável e horizontal, é como escutar num búzio eletrónico muito especial”. A posição para a audição não exerce tanto peso na frase como a metáfora muito visual e exacta de “escutar num búzio electrónico” este EP. A doçura das melodias e a serenidade com que Beatriz canta estas canções pintam perfeitamente dentro dos contornos o espectro sonoro por cima de instrumentais electrónicos e exploratórios.

Ainda a aceitar-se com a voz em português, “doce linguagem” e “a fonte” já afirmam a intenção de EVAYA em dedicar-se à palavra para a autoria na sua língua materna. Um disco sobre a verdade das emoções, a metafísica de pensar, ser e sentir ou o poder que todas estas coisas inerentes ao ser humano têm.



Porque escolheste esta temática para trabalhar na tua estreia num trabalho mais longo? Como se deu o processo criativo para INTENÇÃO

Fui percebendo que esta era a temática do disco. Escolhi aprender sobre como estar mais atenta a mim e escolhi procurar a verdade nas minhas emoções de forma a perceber as suas causas e efeitos, isto é, o entendimento da percepção sobre o pensamento, como temos um poder infinito de imaginar e sobre onde escolhemos focar os nossos pensamentos. 

O processo criativo aqui desengatilha-se com o comprar de um microKORG em segunda mão e o regressar a casa dos meus pais no início da pandemia. Fiquei em casa – no campo, onde ando sempre a gravar os sons da rua – e comecei a explorar, sem compromisso, o sintetizador, que era uma coisa nova para mim. As letras, elas existem quase sempre, já há algum tempo até eu me dar conta delas… vou escrevendo sempre em forma de diário e depois organizo.  

Há uma exploração temática da metafísica das emoções e das intenções humanas que expressas, por um lado num registo de cantautora, por outro mais instrumental e exploratório. Foi fácil encaixar essas duas perspectivas numa estética que é pop e é (até certo ponto) experimental e electrónica?  

Não vejo esse processo como fácil ou difícil. Era imperativo para mim fazer escolhas intuitivas, usar a intuição ao ponto de não ter de escolher – e esse estado de criação é uma das raízes do meu conceito. No momento que achei ser o fim do disco, tinha esses dois registos em mãos, pareceu-me natural e eu aceitei, ou aceitei-me. A junção dessas duas formas de me expressar foram a experiência de ouvir o meu disco – INTENÇÃO pode ser visto como um ritual. Ora conduzido por momentos mais calmos e de introspecção e outros onde as minhas palavras podem funcionar como uma meditação guiada. 

Todo este conceito de INTENÇÃO está envolto numa electrónica muito bem produzida, com uma sonoridade bem mais ambiciosa que a ouvida nos singles que tinhas lançado anteriormente. Tens uma sonoridade bem demarcada, ou pensas que neste caso os temas informam a composição dos instrumentais? Como sentes que a tua sonoridade está a evoluir?

As minhas músicas anteriores foram feitas com o meu computador e um teclado MIDI e são as minhas primeiras experiências a produzir. Tinha em mim toda a ansiedade de saber se conseguia fazer uma canção.

Senti depois face a esses trabalhos anteriores que queria soar mais música e menos canção, ou queria que a canção pudesse respirar, pelo menos. Senti que precisava de um som mais orgânico e muito mais espaçoso, e também de explorar outras formas de usar a minha voz, ainda estou a aprender qual é o meu registo, ou quais são. Também sabia que queria cantar em português, só estava à espera de aceitar o meu português. 

Eu não me identifico com o som das antigas músicas mas elas fazem parte do meu processo de evolução. São a minha primeira experiência enquanto produtora e sem elas não tinha ganho a coragem para o que se seguiu. Eu sinto-as um pouco rígidas ou quadradas… esse som é um reflexo de como eu me sentia na altura. A paralisia do medo, a insegurança com que fiz esses registos, essa rigidez e até timidez de fazer faz-me crer que a minha sonoridade está a evoluir de acordo com a segurança que deposito em mim, e essa confiança traduz-se em procurar o que for preciso, dentro das possibilidades, até ouvir o som que eu sei que é o meu melhor e mais genuíno no momento, aceitando que tudo tem o seu tempo e aceitando que está tudo bem em aceitar o que é meu.  

Sobre a questão mais técnica do teu trabalho: que máquinas estão por trás destas canções? Há alguma ferramenta além do digital?

Usei sempre o computador e um microKorg. Na “how to dance what is true“ toquei harmónica também. A finalizar o disco conheci duas pessoas muito importantes para mim, o gadutra e o Polivalente. A um pedi-lhe uma intro – produzida apenas num iPad – e ao outro pedi para acrescentar uma guitarra em “dreams”. 

A única participação a surgir no trabalho, segundo consta, está na produção de “ĭ̈n̆̈t̆̈r̆̈ŏ̈ “. Qual foi a importância do Gadutra no disco? Tanto quanto percebemos, também faz parte da tua actuação ao vivo, certo?

Existem outras pessoas neste trabalho. À excepção de “༼ĭ̈n̆̈t̆̈r̆̈ŏ̈༽ “ pelo Gadutra, eu escrevi e produzi tudo, mas o nIhII fez a mistura e o Tryambaka masterizou. Como disse, o João Valente (Polivalente) gravou a guitarra em “dreams” e também faz parte da minha banda. 

Ao vivo vou apresentar-me com o gadutra e com o João. Um passo muito importante para mim, fez-me olhar para o palco de uma forma mais corajosa e leve. E é muito interessante o processo de conseguir interpretar e construir as músicas para o formato ao vivo – algo que não foi o foco durante a produção do disco.

Tens trabalhos em vista daqui para a frente? Tencionas agregar mais músicos no teu trabalho, ou colaborar com outros artistas num futuro próximo?

Eu continuo a fazer música e tenciono fazer chegar mais trabalhos meus. 

Apesar de desfrutar muito do meu processo de produção sozinha, partilhar este trabalho é também abrir a possibilidade de expandir e encontrar ferramentas que antes só sonhava com elas, então é provável que sim, que partilhe a construção das minhas futuras músicas, se assim fizer sentido e também porque já me sinto mais confortável e segura em trazer pessoas para esse “espaço meu” onde “o erro” só era assistido por mim :) 

Colaborações claro, sempre que fizer sentido. 

O que tens preparado para a apresentação do EP? É uma altura de muita incerteza para se falar disso, mas tens alguma data em vista?

Tenho vindo a preparar as músicas no formato banda e estou muito ansiosa por poder partilhar esse momento numa actuação ao vivo – mas é uma altura de muita incerteza e neste momento não tenho datas para divulgar. Posso apenas dizer que faço parte do cartaz da próxima edição do Festival Termómetro.


https://www.youtube.com/watch?v=sn4CBiylipQ

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