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Publicado a: 07/10/2017

Enchufada no Estúdio Time Out: batidas quentes na capital da mistura

Publicado a: 07/10/2017

[TEXTO] Ricardo Farinha [FOTOS] Hélder White

Muito se tem falado, nos últimos anos e sobretudo lá fora, do conceito de “apropriação cultural”: quando se apropria um elemento nativo de uma cultura étnica – exótica para essa pessoa ou entidade – , que é usado de tal forma que fica desvirtuado e perde todo o sentido original que possuía. Isto para dizer que, apesar de Kking Kong, Rastronaut, Dotorado Pro e especialmente o líder Branko – da Enchufada – também beberem de tantas influências distintas e as misturarem num caldeirão gigante com outros ingredientes e condimentos, o que ali se criam são genuínas receitas de autor.

A Enchufada é o melhor da Lisboa de 2017. Cosmopolita, cool, quente, com um público heterogéneo, repleta de variadas influências exteriores e, como os seus músicos gostam de referir, está num triângulo único entre África e a América do Sul, mesmo às portas da Europa. Enchufada é Lisboa. Melhor: é a Grande Lisboa. Apesar dos elementos que podem vir das cúmbias sul-americanas, da tropicalidade brasileira ou sul-africana, da bass music ou mesmo da electrónica mais fria, tudo tem um marco alfacinha – daquela Lisboa onde tanto é normal almoçar cachupa como cozido à portuguesa; daquela de que nos devemos orgulhar, por ser única, verdadeira, inclusiva, integradora e destruir possíveis (e antigas) divisões.

 


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Na esgotada grande festa da Enchufada no Estúdio Time Out do Mercado da Ribeira, esta sexta-feira, 6 de Outubro, havia um reflexo disso mesmo. (Mais) velhos e novos, brancos e (por alguma razão, menos) pretos, betos e alternativos (e deixemo-nos de estereótipos). Todos a formar uma mesma e imensa massa humana, feita de corpos a mexer e a suar (que calor estava!) em comunhão, a balançar ao longo das batidas lançadas pelos DJs. O cenário? Além dos néons brancos que exclamavam que a Enchufada estava na zona, uma paisagem suburbana a mostrar o imenso turbilhão efervescente que as cidades dormitório podem albergar.

As grandes estrelas foram os hits underground – que já viajaram pelos clubs desse mundo fora – da label. Falamos de “African Scream”, “Drenas”, “Rei das Marimbas”, “Marimba Rija”, “Chibarias” ou “Reserva Pra Dois” – “Façam barulho para a Mayra [Andrade], ela está por aí!”, gritou Branko, o grande host e aquele mais próximo da figura de MC da festa, sem ser muito interventivo. “Já me vou calar. Apesar de não ser muito bom com palavras, é do caralho que a primeira festa que façamos aqui tenha esgotado!” O pretexto era a celebração do lançamento da compilação Enchufada Na Zona, título resgatado ao programa de Branko na conhecida rádio online NTS. A Enchufada estava mesmo na zona, e desta vez em casa.

 


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As hostes foram abertas por sons quentes soltos por Progressivu; ouvimos as contagiantes batidas afro-eletrónicas do prodígio Dotorado Pro (marcado por alguns problemas técnicos); o set ecléctico de um aniversariante Kking Kong (parabéns!), que soou desde o hip hop remisturado às batucadas de outra editora tão importante para “esta” cena, a Príncipe; o verdadeiro caldeirão do alquimista Branko, que apenas reflecte a sua experiência nos enormes Buraka Som Sistema e os caminhos que já traçou no atlas mundial, que nos fez o favor de mostrar música nova; às profundezas mais techno onde também habitam as batidas sem casa fixa, tropicais e afro, de Rastronaut, outro essencial da editora e projecto.

A convidada de honra, a britânica Mina, foi a responsável pelo set mais distinto da noite. Uns gostaram da mudança de sonoridades, outros nem por isso e aproveitaram para repousar mais atrás no espaço e escapar do calor intenso. De “Goosebumps” de Travis Scott a “Gasolina” de Daddy Yankee, foi um set que não olhou a géneros ou regras e misturou no mesmo prato ingredientes dancehall, reggaeton, hip hop ou electrónica. A mesa está posta. Comam, meus caros.

A Enchufada não é só alimento para o corpo, mas sobretudo para a mente – de chegar a novos horizontes, conhecer várias possibilidades, de expandir, derrubar muros, aceitar o diferente e (até) apropriá-lo sem o desvirtuar. Parabéns, Enchufada. Lisboa é cada vez mais a Enchufada de 2017. E que importante isso é.

 


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