Pontos-de-Vista

Diogo Santos

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Tantos anos depois, a bola continua no ar.

E que música escolher para uma última dança?

Nas últimas semanas andámos, não todos, mas certamente alguns, a papar episódios do documentário The Last Dance. Acabou na semana passada e agora há um vazio gigante. Nos planos da ESPN — e da Netflix — estava um calmo e relaxado lançamento do documentário durante as finais da NBA. Mas a COVID-19 alterou tudo e, para manter na ribalta uma das maiores marcas do desporto e do entretenimento mundial, foi necessário antecipar tudo e mais alguma coisa. Para perceberem bem o quão hercúleo foi o trabalho de edição daquela gente, os últimos dois episódios — IX e X — só ficaram concluídos a poucos dias da data agendada para a sua estreia: 17 de Maio nos Estados Unidos da América. Os membros da equipa de edição e produção trabalharam a partir de casa nos últimos meses, partilhando o processo de montagem através de uma conta no Vimeo onde as ideias foram ganhando vida.

Para os menos familiarizados, The Last Dance é um documentário de 10 partes que tem como fio-condutor a última temporada de Michael Jordan nos Chicago Bulls. Então, em 1997 e 1998, uma equipa de filmagem seguiu quase todos os passos de MJ e é, em parte, esse trabalho que alimenta o documentário. Aliás, a qualidade destas imagens é sublime. Infelizmente, muitas das filmagens das partidas não envelheceram assim tão bem. Da época que termina com o sexto título dos Bulls, a narrativa vai saltando de forma mais ou menos engenhosa entre várias datas e acontecimentos que marcaram a vida e a carreira do melhor jogador de basquetebol de todos os tempos. Do cesto na Carolina do Norte ao draft, ao pé partido, aos 62 pontos no TD Garden, aos tombos frente aos Pistons, aos títulos, à Dream Team, ao basebol, ao Space Jam e, obviamente, até ao roubo de bola a Karl Malone e ao cesto final que carimba o sexto campeonato… Para quem procura a definitiva peça de propaganda sobre Michael Jordan, tem em The Last Dance tudo o que deseja. Praticamente sem contraditório. Com imensa graça e algumas balelas. Enfim, com toda a cagança que só é permitida a “humanos” como Michael Jordan. Scottie Pippen,  Dennis Rodman, Phil Jackson, Jerry Reinsdorf são, para além de MJ, os que aparecem mais vezes ao longo de todo o documentário. Há também Magic Johnson, Isiah Thomas, Gary Payton, Kobe Bryant e… Carmen Electra.

Agora, vamos ao que nos trouxe até aqui. Que música escolheriam para a vossa última dança? O “Garçon” do Marante? A “Mesa para dois no Carpa” do David Bruno? A “Partyman” do Prince? É difícil escolher, eu sei.

No Spotify já está a playlist completa com as 55 canções — quase 4 horas — que fazem parte da brilhante cama sonora de The Last Dance. Há de tudo. Sobretudo um tremendo conhecimento da época — finais dos anos 80 e toda a década de 90. Acho que não é exagero afirmar que esta colecção de canções podia perfeitamente servir para quase todos os outros documentários, filmes ou séries que se façam sobre esta época. Há respeito pela cultura daquelas personagens. Pelos seus percursos e realidades. Pelas que aparecem no ecrã e pelas que não aparecem mas estão ali todas representadas. Os miúdos dos bairros desfavorecidos e, em alguns casos, segregados. Os familiares que se sacrificam para que os filhos possam ter uma vida melhor. A questão racial. A violência. A noite. O álcool. A droga. O jogo. O dinheiro e o estrelato a apresentarem-se a figuras a quem este aparato só era permitido nos melhores sonhos. Está ali tudo. Arrisco a escrever que a banda sonora tem vida própria. E isto sobressair num documentário sobre MJ é obra. Afinal, está ali muita da cultura do hip hop e seus meandros daquela época. Para além de todas estas coisas, há uma bonita e altamente qualificada edição. Desde letras e mensagens que completam perfeitamente o que os nossos olhos estão a ver no  ecrã. Bandas e canções que marcam momentos, épocas e locais como se se tratassem daquelas tatuagens do Ultramar. E beats muito bem arrumados entre dribles e crossovers. Há magia quando um editor decide encontrar o mesmo ritmo para os dribles de MJ e para as batidas por minuto da canção. Ou quando a bola entra no cesto e tudo fica em suspenso: a imagem, o beat, o público no pavilhão. Sem grande esforço, dá para sentir aquilo tudo como se estivesse a acontecer no preciso momento em que nos sentámos no sofá. The Last Dance faz exercícios óptimos em vários departamentos, técnicos e artísticos. É, também, uma das melhores viagens ao passado de que há memória neste tipo de produtos.

Bom, o melhor é mesmo ver o documentário e, claro, ouvir a lista completa de canções. Ainda assim, destaco aqui alguns momentos:

Episódio I: “I Ain’t no Joke” – Eric B. & Rakim > Michael Jordan, no ano de rookie, basicamente a mostrar ao que vinha.

Episódio II: “I’m Bad” – LL Cool J > O jogo dos 62 pontos frente aos Celtics. A edição aqui é ouro.

Episódio III: “The Maestro” – Beastie Boys > Esta é perfeita e ajuda a apresentar Dennis Rodman. É um meme automático.

Episódio IV: “How Ya Like Me Now” – Kool Moe Dee > Os Chicago Bulls são finalmente campeões.

Episódio V: “If I Ruled the World” – Nas feat. Lauryn Hill > MJ e Kobe no All-Star de 1998, em Nova Iorque; “Can I Kick It?” – A Tribe Called Quest > As sapatilhas Air Jordan. Ténis é desporto, amigos; “Rosa Parks” – OutKast > Os pavilhões enchiam para ver MJ, e Atlanta não era excepção.

Episódio VI: “Connected” – Stereo MC’s > Não são norte-americanos, mas esta malha transpira década de 90 por todos os poros.

Episódio VII: “The Sound of Silence” – Swann > O original de Simon & Garfunkel aqui numa versão, vá lá, mais carregada para ilustrar o lado mais negro de MJ enquanto colega de equipa.

Episódio VIII: “Down With the King” – Run DMC > De volta ao Madison Square Garden para derreter os Knicks com 55 pontos. Ao quarto jogo após a pausa para jogar basebol.

Episódio IX: “Sirius” – The Alan Parsons Project > Esta surge em vários episódios, mas vai aqui para não correr o risco de chegar ao último sem a referir. Será para sempre a intro dos Bulls de MJ no United Center.

Episódio X: “Right Here, Right Now” – Fatboy Slim > Aqui vamos a meio da última final da NBA de MJ. Agora ide dançar, mas mantendo a distância social.


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