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Fotografia: Maria Bicker
Publicado a: 30/12/2025

O novo disco chega em breve, mas já circula nos concertos.

Duques do Precariado na BOTA: o auspicioso prelúdio da segunda Encarnação da banda

Fotografia: Maria Bicker
Publicado a: 30/12/2025

Noite fria e chuvosa tornada em aconchego quente numa quinta-feira de Dezembro. No dia 18, 24 horas antes de rumarem aos Maus Hábitos, no Porto, os Duques do Precariado preencheram de calor humano (e musical) a acolhedora sala da BOTA, em Lisboa, para a pré-apresentação do segundo álbum da banda, Encarnação. Ainda sem ter sido oficialmente lançado, já está disponível em CD nos concertos do grupo, como que numa “quebra espaço-temporal”, resgatando as palavras do guitarrista João Fragoso, fundador do projecto ao lado do vocalista (e também guitarrista) Pedro Mendonça.

Com edição marcada para 30 de Janeiro, os Duques do Precariado apresentaram assim as suas novas canções, em primeira mão, àqueles que os têm acompanhado nestes últimos anos. O primeiro disco, Antropocenas, já é de 2018 entretanto, o trabalho foi reeditado em 2023 pela Lux Records, o que devolveu a banda aos palcos e abriu caminho para um segundo disco. Pelo meio, a banda (que hoje inclui ainda João Neves, Hugo Oliveira e Zé Stark) também deixou Lisboa, o que poderá ter expandido o leque de vivências e observações que são como matéria-prima para estas canções.

Com destaque para as cordas e para as flautas aos sopros de Hugo Oliveira juntou-se a flauta de Teresa Costa, que teve uma participação especial neste disco e espectáculo —, o que sobressai sempre que escutamos os Duques do Precariado são os versos cantados por Pedro Mendonça (e companhia, por vezes num harmonioso movimento de contracanto). Poesia irónica que fala simultaneamente do mundano e das grandes questões da vida, as letras conseguem ser tão bonitas quanto desconcertantes, por vezes abraçando o constrangimento e o absurdo, puxando por essas dimensões da vida numa sociedade tantas vezes, e contraditoriamente, obcecada com as aparências, o certinho e o perfeccionismo. 

Na música e na lírica dos Duques do Precariado abre-se um espaço natural para o erro o single já divulgado, nem por acaso, chama-se “Falho” , para se simplesmente ser humano com tudo o que de belo, intrigante, embaraçoso e estranho isso implica. É impossível não sorrir quando o refrão de uma das novas canções fala num “enterro com bom taste”, no qual tudo está “happy” e “safe”; mas também há versos que nos transportam imediatamente para histórias imaginadas ou nos colocam frente a frente com a nossa condição humana e social. 

Música de questionamento, feita com consciência de classe por “filhos do Boom e netos da madrugada”, frutos sonoros de um Portugal plural (e moderno, mas que dialoga com o seu passado) em que a música folclórica de intervenção se senta à mesma mesa que um “pseudo afro” entranhado nas vivências da cidade, na linha de B Fachada, em composições simples mas o suficientemente sofisticadas para nos deixar em sentido e prestar a devida atenção e reverência. 

Ao vivo, os temas ganham corpo com a instrumentação, enquanto as letras irreverentes provocam uma interacção constante com a plateia — é um daqueles concertos capaz de, num festival, conquistar várias mãos cheias de novos devotos. Numa sala como a BOTA, cada vez mais raras e indispensáveis numa cidade como Lisboa, a comunhão e a proximidade são factores-chave — basta pensarmos que o concerto termina com os músicos a deixarem o palco para se fundirem na multidão, diluindo num único segundo quaisquer fronteiras que pudessem existir.

Tendo em conta o que ouvimos, só podemos ansiar com curiosidade para escutarmos estas canções em disco e esperar que a qualidade musical, performática e lírica ressoe junto de um público maior (mesmo que dentro de um nicho) que os Duques do Precariado claramente mereciam alcançar nesta segunda Encarnação. Longa vida aos Duques!


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