Texto de

Publicado a: 30/09/2015

pub

drake_future_what_a_time_to_be_alive_review

Altura mais quente deste Verão no mainstream americano. E que altura esta para se estar vivo! Drake e Future brindam a um presente glorioso, e para o celebrarem connosco, editam agora a mixtape que era tema de conversa nas redes sociais. O resultado do encontro entes ambos os MCs deu frutos, e maduros. Duas vidas expostas num projecto que visa voos ainda maiores, uma tentativa de fazer história e afastar os holofotes de todos os outros em competição para reclamarem por um trono, que, a seu ver, lhes pertence. Dois MCs com diferentes vivências numa união com um propósito, fazer uma mixtape clássica na cena trap e que, ao mesmo tempo, consiga dar um abanão em toda a estrutura do hip hop dos dias de hoje. Mas esta mixtape não é uma mera escolha de beats alheios para rimar umas sixteens: é todo um conceito um que se assemelha mais àquilo que esperamos de um álbum, como Future e, especialmente, Drake já nos habituaram nas mais variadas situações. Definições à parte, a aposta no miúdo de St. Louis para assinar grande parte dos beats e ainda a levar o papel de produtor executivo soa a acertada. A qualidade dos instrumentais e toda a sua envolvência com as cordas vocais deixa qualquer um invejoso. São vários os props que o beatmaker colecciona ao longo dos minutos que passam desde que carregamos no play. Ele que já tinha produzido anteriormente para cada um dos MCs. Outros nomes como Southside, Boi-1da e Noah ‘40’ Shebib também entram na festa. Kicks e snares bem definidos e carregados, com as vozes bem enquadradas no espaço sonoro, que deixam esta mixtape num patamar bastante elevado no que toca à produção não só da cena trap e bass como na música em geral. Mas não é só de produtores que são feitos estes onze temas.

Drake é o grande fenómeno desta era digital, onde a música se funde com os mais variados instrumentos de partilha de informação, em especial a força das redes sociais, nas quais somos diariamente bombardeados com notícias, músicas ou mesmo críticas ao próprio Drizzy. O importante aqui é aparecer. E mesmo que não o queiramos ver, torna-se quase impossível não o fazer porque o seu trabalho é bom e todo o esforço para dar um boost o seu mediatismo é gerido ao pormenor, o que faz com que todos os dias haja motivos para se falar dele, para o ouvir ou até mesmo para o ver em mais uma selfie. É interessante toda esta sede de sucesso para um homem que foi criado no meio da televisão, onde a fama é uma das principais fontes de garantia de mais um contrato e, por sua vez, maior cachet. Muitos são os casos onde o hype morre cedo e as pessoas são esquecidas pelo público num piscar de olhos. O MC de Toronto teve a cabeça necessária para saber qual o melhor rumo a dar à sua jornada pela busca de reconhecimento e sucesso e em 2006 inicia um percurso novo: dar uso à sua fanbase ganha na televisão e aproveitá-la para começar uma carreira como rapper; o que, de início, o coloca num patamar acima dos restantes newcomers do meio pela quantidade de pessoas que consegue alcançar. Podemos ver a coisa como um jogo, há quem goste de o passar em meia dúzia de horas, outros preferem explorar todos os cantos e opções em busca de powerups para que o final seja em grande e desbloqueie novos e melhores conteúdos. Sem cheats.

Se pensarmos agora na dupla aqui presente, muitos apontariam Future como sendo o elo mais fraco. Ou pelo menos aquele que tem menos audiência para oferecer a Drake, que por si só já atrai bastantes atenções, pois é ele quem gera parte das maiores ondas do hip hop no maravilhoso mundo da web 2.0. Além dos diferentes backgrounds onde se enquadram os MCs, Future é um dos casos dos que se iniciam na música literalmente do zero. E neste caso, não só começa da casa de partida como ainda se atrasa uns anos em relação ao seu parceiro de mixtape: a data do seu primeiro projecto remonta a 2010. Aconselhado a trabalhar nas suas letras antes de se assumir como rapper, Future não só não perdeu tempo a pegar na caneta como trouxe também uma nova forma de utilizar o auto-tune, combinando o seu rap com pequenas cantorias e flows que fazem com que o efeito vocal ganhe um cunho digital bastante próprio, presente em todos os seus registos. Toda a sua sonoridade soa a algo quente e exótico, completamente diferente de T-Pain, por exemplo, que explorou e abusou também do auto-tune no seu trajecto enquanto MC/cantor e viu a sua fama decrescer com o tempo devido à saturação do público em relação à sua voz. Aqui, Future ganha todo o mérito pela forma como manipula o seu áudio sem que se torne cansativo ou demasiado agressivo para os ouvidos de quem o escuta, pois mesmo por baixo da camada de efeitos utilizados conseguimos encontrar vários pontos orgânicos que nunca nos deixam assumir que o seu sucesso se deve única e exclusivamente ao uso do auto-tune.

Voltando à parceria aqui estabelecida e utilizando os argumentos acima destacados, Future e Metro Boomin são sem dúvida os mais beneficiados neste golpe de marketing. Drake, por sua vez, aproveita para ir mantendo a forma em mais uma mixtape com sabor a álbum, como já o tem feito em diversas ocasiões. Mas isto não significa que tanto Future como Metro Boomin se deixem ficar à sombra do homem do momento, antes pelo contrário. O produtor deu asas à imaginação para criar alguns dos bangers mais sonantes deste Verão, enquanto o rapper de Atlanta fez questão de colocar o seu skill e entrega ao mesmo nível de Drake, se não é que o chega mesmo a superar em alguns dos casos. Ouvimos “Live From the Gutter” e em poucos segundos notamos que estamos a ouvir um Future quase em choro, no meio de todo o hustle que vivenciou para chegar onde chegou. O objectivo é fazer dinheiro. E dinheiro gera dinheiro. Ele não quer parar. Todas as emoções que nos transmite neste tema quase que nos deixam a equacionar como seria o resto da faixa se Drake não estivesse presente nela. Se havia dúvidas de que Future poderia nunca chegar a explodir, aqui toda essa neblina e misticismo são desfeitos em pó.

Aqui fala-se de carros, mulheres, drogas, dinheiro, muito dinheiro. Livin’ large. Logicamente que esse dinheiro não apaga os problemas do passado nem evita alguns dos que estão ainda para vir. Inclusive, Drake chegou mesmo a ter a carreira em causa por breves momentos com todo o aparato entre ele e Meek Mill. A história deu uma grande reviravolta com Drake a sair por cima nas diss tracks que o calor do momento gerou e também graças, mais uma vez, à boa gestão de todos os conteúdos do rapper nas redes sociais.

“Digital Dash” é o tema de abertura e dá o mote para tudo o resto que se segue. O hustle de Future que se mistura com a sua vida luxuosa, falando de carros, neste caso, que são uma das paixões do rapper de Atlanta e também um meio de transporte para este gerir o seu negócio e receber as suas companhias femininas. Já Drake vê este painel digital como uma espécie de cockpit personalizado para o seu sucesso. Como se tivesse botões para aceitar novos amigos, eliminar os falsos, controlar o seu valor no mercado, basicamente uma ferramenta que o vai ajudar a desviar-se ou até mesmo eliminar quem se meter no caminho.

Sippin’ on Dom Pérignon for no reason / Poppin’ tags, upper echelon for no reason.

O tema “Diamonds Dancing” mostra-nos com clareza as diferenças entre Drake e Future. Numa letra que nos fala de mulheres, Drake vai directo ao centro da questão citando tudo o que pode correr mal numa relação entre ele e a sua amada, enquanto Future se perde em álcool, drogas e compras com a falta de uma companheira. Este é talvez o ponto mais estranho nesta dupla que se une pelo tipo de sonoridade que assume, já que Future demonstra uma forte dependência de substâncias em todas as suas letras e Drake desvia-se desse caminho, ou pelo menos não fala nele, deixando que seja o rapper nascido em Kirkwood a falar sobre o assunto. Acaba por criar alguma confusão na nossa cabeça tendo estas duas visões diferentes, mas sem tirar coesão à mixtape, pois facilmente balançamos de um discurso para outro completamente diferente sem estranhar a passagem. Talvez seja essa versatilidade que nos ajuda a ficar colados aos speakers à espera da faixa seguinte. Uma dualidade nas estórias relatadas que ajudam a apimentar ainda mais o recipiente de onde borbulha esta mistura.

Se havia dúvidas quanto à qualidade desta mixtape rapidamente desaparecem. São dois MCs a dividir um trono montado por Metro Boomin e companhia. Não são muitos os MCs que gostam de dividir o protagonismo mas há casos em que a ideia de um projecto em conjunto faz toda a diferença no futuro das carreiras das entidades envolvidas. Jay-Z e Kanye West podem gozar desse estatuto e acabaram por criar em conjunto um tema que provavelmente vai ficar imortalizado na história do hip hop e que passados quatro anos ainda se ouve em quase todas as festas dedicadas a esta cultura: “Niggas In Paris”.

O futuro dirá como nos vamos recordar desta mixtape que termina com Future e Drake numa faixa a solo cada um. Aqui talvez dê para entender o tamanho do ego de ambos os MCs. Embora o projecto seja em conjunto, não abdicam de brilhar sozinhos num tema. Provavelmente não será uma combinação que dê mais frutos no futuro. Strictly business, é o que nos leva a pensar. Se existe alguma ligação emotiva entre os rappers não é o que importa de momento. Este é um marco grande de dois homens que encaram a música como um negócio sério e pretendem retirar o máximo proveito disso. Mesmo que a parceria seja momentânea, apenas para aproveitar a melhor forma de ambas as carreiras, este é sem dúvida um diamante que não perderá o brilho tão cedo.

 

pub

Últimos da categoria: Críticas

RBTV

Últimos artigos