O Musicbox ficou pequeno para a grandeza da voz e do discurso de Don L, que se apresentou pela primeira vez em Lisboa no último sábado (11 de maio). Sua voz e discurso conquistaram uma base de fãs leais ao longo de quase 20 anos de carreira, refletindo sua habilidade de transitar entre a tradição e a inovação do rap nacional. Don L se posiciona em uma encruzilhada entre o passado e o futuro, trazendo uma versatilidade cada vez menos comum na música.
Em uma entrevista ao ReB, ele compartilhou sua aspiração de levar sua música em português brasileiro para além das fronteiras, buscando cativar audiências ao redor do mundo. Sua primeira incursão na Europa não apenas confirmou seu potencial para isso, mas também solidificou seu lugar como um dos principais representantes do rap brasileiro em escala global.
Acompanhado por DJ Roger, um verdadeiro patrimônio do rap brasileiro, Don L deu início ao seu show com “Vila Rica”, uma escolha que ecoa o orgulho de suas raízes e a riqueza do que veio expressar. Em seguida, ele apresentou sucessos do álbum Roteiro Pra Aïnouz (Vol. 2), com destaque para a “Volta da Vitória”, “A Todo Vapor”, “Favela Venceu” e “Pânico de Nada”, que foram cantadas a plenos pulmões pelo público.
A segunda parte do show seguiu após os gritos de “Palestina Livre” entoados pelo músico. A partir daí, Don L interpretou os sucessos de Caro Vapor / Vida e Veneno, que foram muito bem recebidos e cantados pelo público (afiado nas letras, aliás). Os destaques ficam para “Rolê dos Loko”, que traz muita nostalgia; “Beira de Piscina”, um dos maiores sucessos da carreira do artista em conjunto com Rael; e “Aquela Fé”, cantada enquanto os flashes dos celulares do público iluminavam o palco. Numa atmosfera que se assemelhava a um culto, e com algumas referências e ironias de Don L sobre isso no palco, o artista pregou novas perspectivas de vida e de sonho para um público ávido pelo fim da desigualdade e da exploração capitalista. O punho cerrado, símbolo de protesto contra conflitos sociais como racismo, xenofobia e sexismo, foi erguido várias vezes tanto pelo artista quanto pela plateia. Antes de iniciar “Élewood”, Don aproveitou para discorrer sobre a necessidade de sonhar o mais alto possível enquanto se mantém os pés no chão.
Encerrando ao som de “Primavera”, “Morra Bem, Viva Rápido” e “Contigo Pro Que For”, que não estava na setlist mas foi solicitada tão fervorosamente por uma fã que foi cantada com direito a vídeos para Alt Niss (que canta o refrão marcante mas não esteve presente), Don L deixou o palco após 1h30 de show, que pareceu pouco diante da grandiosidade de sua obra e da energia dos fãs.
Numa contraposição às tendências dominantes no mainstream, é inspirador ver artistas que permanecem fiéis ao seu legado e às suas convicções. Don L não se limita a ser apenas mais um artista de palco e estúdio; ele vive o que canta e interpreta suas músicas como poucos. Ao celebrar a música popular brasileira, ele defende que a arte seja um direito fundamental e nosso maior tesouro exportável.