No último sábado, dia 10 de Setembro, Djonga se apresentou no Pátio da Galé, em Lisboa. Com casa cheia, o local ficou realmente (e literalmente) pequeno para tudo que o rapper representa. O artista, que costuma encher estádios e festivais no Brasil, também lotaria facilmente um espaço maior do que aquele onde ocorreu o show deste fim-de-semana.
A trajetória de Djonga, construída na zona leste de Belo Horizonte, foi referenciada logo (e bem) no início do show. Ao relembrar o lugar de onde veio, ele manteve o discurso ácido presente desde o seu início na música, falou sobre como era significativo trazer sua mensagem para cá, um país tão próximo de África. No Brasil, 45% da população tem descendência africana e todos os ancestrais foram levados como escravos. As letras do artista sempre abordaram questões sociais que são impossíveis de serem ignoradas no país como a fome, o racismo, entre outras.
Visto que essa foi sua primeira apresentação fora do país de origem, fica difícil não começar falando sobre o furacão de sentimentos misturados ali: o público, composto em sua maioria por jovens brasileiros e imigrantes, ansiava pelo show há muito tempo; o artista, que viu sua vida ser transformada e transformou a vida das pessoas ao redor com a música, parecia segurar as lágrimas em diversas ocasiões.
O concerto começou com “O Cara de Óculos”, que traz o emblemático refrão: “Quem tem, quem tem, vem de, vende lá/ Disposição e motivo de sobra pra trocar/ Carrego a peça e a bandeira, pra vida melhorar/Se é nave zera eu vou portar, eu vou portar”. O trecho foi cantado aos gritos por todo o público presente e soou como um hino que contempla o sentimento da maioria dos imigrantes, que muitas vezes vêm em busca de um sonho e se deparam com inúmeros obstáculos no caminho.
O setlist contou com músicas de todos os álbuns e, ao cantar o hit e lovesong “LEAL”, o artista convidou alguns casais da plateia para subir ao palco e cantar junto. Dá pra dizer que todas as músicas, sem exceção, foram recitadas do início ao fim, em gritos que pareciam esperar há muito tempo para serem gritados. E com razão, afinal, espanta saber que este foi o primeiro show do artista fora do Brasil. Sua relevância já é notável no panorama nacional, já que Djonga cravou um marco no rap nacional desde o primeiro álbum, Heresia, de 2017. Neste álbum, o artista trouxe nomes de peso como: BK, FBC e Yodabren e revelou todo o potencial que estava por vir nos anos seguintes.
O DJ de serviço nesta noite de estreias foi Coyote Beatz, referência nacional na arte da produção musical e que já acompanha o artista há bons anos como parceiro, amigo, braço direito criativo, DJ, produtor e beatmaker.
O evento contou com outros shows, como o do MC brasileiro Paganini, o rapper português Ésse Print e convidados e os DJs Deco Loko e Garrett. Para além dos atrasos e o marketing excessivo da produtora ao longo da festa, vale ressalvar que a falta de mulheres no line–up da festa foi algo notado e lamentado. Metade do público era feminino e temos mulheres incríveis na cena hip hop em Lisboa que certamente seriam aclamadas no evento e teriam a oportunidade de trabalhar ao lado de um dos maiores expoentes do rap BR da actualidade.
Djonga não deixa a desejar em nada no palco, mesmo com a organização do evento não tendo sido tão condizente com sua grandeza (dentro e fora dos concertos). Energia e presença do início ao fim, em todos os sentidos. Mesmo jogando fora de casa, o artista é exemplo no que diz respeito a colocar vida no que faz e é impossível chegar ao fim sem que se queira mais.