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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 04/02/2021

Ilustrações que deram vida a músicas.

DJ Sims sobre Acordo Verso: “Como beatmaker foi uma experiência brutal, foi quase como começar a casa pelo telhado”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 04/02/2021

Produzido, misturado e masterizado pelo veterano DJ Sims, Acordo Verso é o título de um novo EP que está disponível em CD, vinil e também no YouTube, com um videoclipe para cada uma das sete faixas.

A ideia nasceu na cabeça do ilustrador Mtáfora e, para além do DJ de Valas, contou ainda com as contribuições de Uput, Séthique, Cachapa, Vin Mariani, RealPunch, Bob O Vermelho e António Pinto de Sousa.

A propósito do lançamento deste projecto com os selos de Mtáfora, Tricoma, Sistema Intravenoso e Outcast Media, o Rimas e Batidas foi falar com Simão Barradas sobre a concepção de Acordo Verso, a vibração artística de Évora em 2021 e a vida de um músico em confinamento.



Este é um projecto bastante ambicioso. Podes explicar-nos como nasceu e em que consiste exactamente?

Este projecto surgiu única e exclusivamente da cabeça do Mtáfora. Foi ele que teve a visão de fazer um EP que fosse baseado nas suas ilustrações, dando elas o mote para cada tema. A ideia acabou por se moldar no decorrer do processo, onde para além de termos versos a ganhar cores, também tivemos cores a gerar versos, o que do nosso ponto de vista trouxe ainda mais pontos no que toca à coesão final do trabalho. Esse trabalho foi feito numa ligação íntima entre ele e os rappers. Os rappers foram escolhidos pela primeira pessoa com quem o Mtáfora partilhou a ideia, o Uput. O Uput acaba por ser o elo que liga tudo isto, para além da faixa, que abre o EP, ele foi o responsável por escolher tanto os rappers, como os produtores, fazendo o papel de produtor-executivo. Escolheu os rappers e decidiu que a parte musical ficaria a cargo de uma só pessoa, que me calhou a mim. Só nesta fase é que apareço com a parte dos beats. Posteriormente e em modo cereja no topo do bolo, decidimos que faria sentido apresentar o trabalho em capítulos, sendo eles representados por vídeos, um para cada tema. Daí até chegarmos ao Diogo Paraíso (Outcast Media) foi um piscar [de olhos]. Amigo de longa data e regressado a Évora depois de vários anos fora do país, foi a aquisição final para tratar da parte do vídeo, que ficou à sua total responsabilidade.  O trabalho leva esses quatro selos, Mtáfora, Tricoma, Sistema Intravenoso e Outcast Media.

Tendo em conta o ponto de partida sugerido pela arte de Mtáfora, como pensaste a música para este projecto? Os beats foram compostos já a pensar nesta aventura ou foste ao arquivo buscar este material?

Neste EP não tenho nada de arquivo, foi tudo feito à medida e penso que só assim faria sentido. Este trabalho tem um conceito muito forte que não me permitiu simplesmente passar uma pasta com beats e a malta escolher. Quase todos os temas foram feitos tendo o acapella do MC como base, quase como se tivesse a fazer um remix de um som que ainda não existia. Como beatmaker foi uma experiência brutal, foi quase como começar a casa pelo telhado. Depois de ter o beat feito mandava para o rapper gravar com o groove do novo beat, voltava para mim, dava os retoques finais e fechava-se a track.

A música mantém a toada jazzy e atmosférica que já tinhas explorado antes. Podes falar um pouco sobre as tuas referências neste universo?

Eu trabalho 90% das vezes com samples e neste trabalho não foi excepção, mas tive em atenção o projecto para o qual estava a trabalhar e decidi que mesmo que as fontes fossem muito díspares, a sonoridade tinha de ter alguma ligação. Pode não parecer, mas temos samples que vão de Ennio Morricone (RIP) até à música brasileira, mas dificilmente se nota essa distância de universos quando se ouve este EP de uma ponta à outra. Talvez a música com o Séthique fuja um pouco a essa regra, mas esse tema, na minha cabeça, e relembro que já tinha a letra quando estava a fazer o beat, pedia uma tela quase sem cor, de ambiente misto, onde na minha opinião as barras dele (64!), acabaram finalmente por encontrar o seu porto. Também nisso este projecto foi especial.

Podes falar um pouco sobre cada um dos MCs?

É fácil falar um pouco sobre cada um deles, vou começar pelos que me estão mais próximos. O Bob evita apresentações, companheiro desde o início, está mais afiado que nunca. Está com aquela força de pai! O Cachapa é talvez top cinco neste momento a rimar palavras em músicas no nosso país, digo-o sem problema nenhum. O RealPunch está ali na prateleira do Bob, também são escusadas apresentações, todo o percurso, tanto em Tribruto como a solo, falam por si. E o homem vem lá com coisas novas! O Séthique já conheço e acompanho há muitos anos, mas nunca tinha tido a oportunidade de trabalhar com ele. Sempre admirei a profundidade da escrita dele e aproveitei isso no nosso tema. O Vin Mariani foi-me apresentado pelo Uput, até à data já nos tínhamos cruzado, mas não nos conhecíamos. É um rapper de trato fácil, com um skill de drop que a malta não está a par, aliás nem eu estava! Foi um gosto conhecer o Vin, é um bacano! Para fechar, falar do Uput. O Uput faz parte da minha lista de amigos já há muitos anos, e já fizemos várias coisas em conjunto na música. Ele continua muito activo e conseguiu dinamizar estre trabalho de uma forma incrível através da editora dele, Tricoma. Um dos melhores a fazer duplos sentidos!

Além dos MCs recrutaste também o guitarrista António Pinto de Sousa. É um músico com que já trabalhaste antes, certo?

Certo. E se puder, hei-de fazer muitas coisas com o António. Para além da amizade que temos e da pessoa que ele é, o equilíbrio que tem e que transmite, é um músico incrível! Eu digo que ele toca tudo! Rapaz para envergonhar qualquer um numa sessão de estúdio. É o verdadeiro “carola”!

Este projeto está disponível nas versões com vozes, mas também instrumentais: já pensas nos teus beats com arranjos com densidade para terem também essa vida paralela, sem vozes?

É interessante a questão da vida paralela, mas a verdade é que só há relativamente pouco tempo é que os meus beats se viraram mais para o MC, onde essa densidade e arranjos por vezes caem por terra para deixar “sala” para o rap. Mas sou sincero: vejo os meus beats a viverem por si só com mais frequência. Julgo ser parte do processo, do qual faz parte uma boa dose de teimosia. Teimosia essa que, mais tarde ou mais cedo, nos dá algum espaço para que as nossas obras possam vingar com uma personalidade própria.

Évora continua vibrante em 2021, mesmo tendo em conta a pandemia?

Évora faz por vibrar, mas temos de ser justos, sem grandes pólos a coisa está de rastos, o que esperar de um meio com 70 mil habitantes? Ainda tivemos três dias de rap no final de Dezembro, uma espécie de “Mini Bairro”, com prata da casa. Iniciativa de louvar, só possível com o apoio da CMÉ. Para 2021 estamos a fazer por manter algumas coisas de pé, gostávamos novamente de um “Bairro” em força, mas estamos dependentes de algo muito maior que nós, por isso é continuar agendar, a combinar, a tentar fazer. Se na hora H não for possível, ao menos a malta esteve junta a tentar fazer coisas.

Lidaste com os confinamentos criando música? Como te bateu tudo isto?

Sim, muita música. Tanto eu como a malta à minha volta estivemos muito activos nesse aspecto. Este trabalho em questão foi feito em oito meses, numa altura normal de estrada e concertos teria sido impossível. A nível pessoal, talvez um pouco diferente. Tenho dois filhos e avaliar um futuro próximo com o panorama que temos é assustador, tanto a nível de pandemia como do rumo que as pessoas parecem querer dar aos próximos capítulos deste planeta. Estes acontecimentos históricos têm o condão de mostrar o pior de cada um, e os meus filhos vão crescer e formar personalidade nos anos que se seguem… Como costumo dizer, é navegar à vista.

Quando for possível, este Acordo Verso vai dar uma exposição? Um concerto? Qual a ideia?

Este é um dos trabalhos que gostávamos de ver na próxima edição do “Bairro”, seremos certamente candidatos. E a ideia iria mesmo nesse sentido, de algo misto. Concerto e exposição. Vamos ver se a coisa corre bem, há muito por onde sair furado. Vamos deixar na gaveta para não dar azar!

E em relação a novos projectos? Que podemos esperar até ao fim do ano?

Até ao final deste ano tenho as coisas divididas. Tenho coisas em linha de espera com o Cachapa, vamos partir aí uns vidros. Diria que vamos para álbum novamente, que aquele rapaz sonha em verso. Tenho umas colaborações nuns trabalhos que também ainda estão por ver a luz do dia, onde fiz umas participações com cuts. E ando com vontade voltar a fazer algo a solo, quem sabe ainda este ano. E muitas coisas novas da malta do Sistema Intravenoso, quem sabe um peixe graúdo aqui, outro ali. É coisa para ficarem atentos.


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