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Publicado a: 06/04/2017

DJ Paypal: electricidade e loucura, até ao sol raiar

Publicado a: 06/04/2017

[TEXTO] Nuno Afonso [FOTO] Direitos Reservados

Estávamos em 2010 quando a Planet Mu, bastião de novas sonoridades urbanas, edita uma dupla compilação que imediatamente fez história. Bangs & Works distribuía-se em dois volumes e dava a conhecer, pela primeira vez a uma audiência além fronteiras, um novo género, nascido em Chicago, Estados Unidos. Naquele que foi o berço da música house, o footwork é um híbrido de três décadas de produção electrónica onde naturalmente se ecoam a house, mas igualmente o trap ou o drum n’ bass. Nascendo entre battles de dança na rua, com tempo foi tomando conta de ginásios abandonados e armazém vazios espaços honorários – como clubes improvisados – para os seus intervenientes. Velocidade, paranóia, frescura; tudo isto ressalta na colecção de Bang & Works onde desde logo nos cruzamos com autores (hoje em dia, mestres ou até mitos) como DJ Rashad, Jlin, DJ Spinn, Traxman, RP Boo ou DJ Earl. É afirmar pois que nos deparamos com as maiores mentes do footwork, a geração original que por sua vez inspirou toda uma outra que se seguiu.

 



Nesta linhagem, o jovem DJ Paypal será porventura o maior descendente e aquele que entretanto solidificou, e até actualizou, o género. A sua história começa como tantas outras, onde o gatilho chega precisamente pelo poder informativo da web. Entre a saudosa actividade da blogosfera nessa época e os softwares de produção gratuitos, o então entusiasta avançou num caminho de festas em casas de amigos, remisturas e mixtapes que a pouco e pouco lhe abriram convites. Não tardou muito para começasse a colaborar com os mais importantes pólos criativos do footwork, entre eles o malogrado e maior-que-todos, DJ Rashad, fundador da editora e colectivo Teklife. Foi aí que DJ Paypal se afiliou a uma plataforma global que não apenas incluía músicos e produtores como também dançarinos e outros party boys. Uma família cujos laços atravessavam oceanos; embora o epicentro estivesse sediado em terras do Tio Sam, gente importante começava também a incendiar as noites neste lado de cá, nomeadamente Jackie Dagger e Felloneezy na insuspeita cidade de Belgrado. De resto, foi em Berlim, a meca mundial da música de dança, que Pal encontrou residência e se encontra a viver e trabalhar ainda hoje.

Distinto na forma como se atira à matéria, num misto de humor e sarcasmo, mantém intacta a energia frenética e apaixonadamente crua das raízes originárias, mas sem receio de a transportar a outras paragens. Sold Out, de 2015, teve a extraordinária benção da Brainfeeder, do patrão Flying Lotus. Para álbum de estreia, demonstrava toda a segurança e gozo que qualquer artista poderia almejar. Se os anteriores Drake Edits (isso mesmo, edits do rapper Drake) ou o EP Buy Now punham em cima da mesa a ousadia em fazer do footwork uma via de transformação sonora com a realidade circundante, então com esse capítulo de ouro cunhou uma identidade ímpar. Identidade essa sempre dúbia, com o próprio a apresentar-se ao vivo de máscara ou coberto de uma t-shirt, salvaguardando a sua face.

 



O surrealismo e a euforia presente no seu trabalho alicerça-se numa busca constante por sons. Se a polirritmia de África se assume como sangue nesta máquina bem oleada, há que reconhecer as bandas sonoras de jogos de vídeo, os samples de anúncios encontrados no Youtube ou a apropriação bárbara (e hilariante) de pesos pesados da pop actual. “Desvirtuar” é o verbo perfilar de Paypal. Desvirtuar para compreender, desvirtuar para divertir, desvirtuar para sobreviver num mundo sobrealimentado pela velocidade de partilha informação. E se o ritmo habitual do footwork é marcado pelos 160 BPM, o mais natural é que ele venha a desvirtuar também esse parâmetro.

Após as visitas históricas de DJ Rashad e DJ Spinn, assim como de RP Boo, a Lisboa, esta vinda de DJ Paypal não será menos passível de memória futura. Se buscam uma boa dose de hedonismo pós-emprego, pós-depressão passional ou pós-existencialismo, terão aqui um portal aberto para um stand by merecido da realidade. É sabido que o Lux tem vindo a albergar um sem número de celebrações de “aqui e agora” e é precisamente com esse mindset que Paypal aterra junto ao rio Tejo. Fiquem com uma certeza: o convidado da noite C.R.E.A.M., apresentada por DJ Glue, irá electrizar-vos até ao tutano. Como se não houvesse amanhã.

 


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