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Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 28/11/2023

Gritos emo em direção às estrelas.

Dispirited Spirits: “Para mim, a criação musical é uma das únicas brechas por onde as emoções fluem”

Texto: ReB Team
Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 28/11/2023

Se ainda não estão ao corrente, deixem que vos coloquemos. Dispirited Spirits é um dos projetos emergentes mais cotados da geração de um novo rock português. Um rock que não se fica por um só género ou mania, que vive entre o mundo real e online, que busca a catarse através da sua criação.

Dispirited Spirits — que é como quem diz, Indigo Dias — foi apresentado ao mundo em 2021 com o onírico e espacial Fragments of a Dying Star, mas é o segundo disco do projeto, The Redshift Blues, editado em março deste ano, que chamou a atenção de melómanos e críticos (a faixa “Methanol Fire” foi incluída na compilação de Novos Talentos FNAC, por exemplo). Por entre átomos de música emo, jazz e rock progressivo e espacial, ergue-se um universo vasto de emoções onde a procura por paz interior é o destino pretendido.

Ao vivo, Dispirited Spirits é transportado do quarto de Indigo para cima de palco pelo próprio na voz e guitarra, António Sousa (guitarra), Diogo Abreu (bateria), João Garcia (baixo) e João Machado (saxofone, teclas). Em setembro, com a ajuda de Calmness (projeto musical de Gui Galão), Dispirited Spirits subiu ao palco do Musicbox (quase esgotado) para apresentar The Redshift Blues ao vivo pela primeira vez. 

Esta quinta-feira (30), o mesmo bailarico triste das duas bandas sobe ao palco do Maus Hábitos, no Porto, onde as canções de Dispirited Spirits e Calmness vão ganhar forma outra vez em cima de palco. Antes disso, o Rimas e Batidas trocou e-mails com Indigo para saber mais sobre o cosmos deste The Redshift Blues.



Este concerto no Maus Hábitos prossegue a apresentação de The Redshift Blues — também com Calmness a acompanhar — no Musicbox. Como correu esse concerto?

O concerto foi um ótimo momento. Casa muito bem composta, equipa do Musicbox extremamente prestável, fotos fantásticas (das lentes de Beatriz Pequeno e Gonçalo Nogueira). Tenho o alívio de dizer que correu tudo bem, foi quase uma afronta à lei de Murphy. Felizmente, o grupo que levei a palco tem muita sinergia e bom espírito juntos, e pude ter o prazer de partilhar palco com um dos meus melhores amigos. Calmness, para além de audivelmente sublime, é uma ótima companhia, o que é evidente por voltarmos a juntar forças, agora no Porto.

Na entrevista com o Henrique Amaro para a rubrica Portugália, falavas que precisavas de encontrar a banda certa para levares Dispirited Spirits para cima de um palco. Dado que a banda já contou com outras formações no passado, como foi-se estabilizando o line-up ao vivo atual?

Com a minha consolidação em Lisboa, após iterações de Dispirited na minha terra natal — Faro — vi-me obrigado a procurar de raiz uma nova formação. Coincidentemente, no ano passado fui convidado pela banda Dream People para fazer de stand-in e tocar com eles ao vivo (no Musicbox, também). Foi uma boa experiência e formamos boas ligações, tanto que, posteriormente, convidei dois dos membros para a presente formação de Spirits ao vivo. Aliados a um dos meus melhores amigos [António Sousa] e a um saxofonista [João Machado] que o João (baixista) conhecia, temos vindo a solidificar como grupo nesta transposição ao vivo das músicas, e tem sido bastante positivo e refrescante, em contraste com o habitual desgaste de organização e ensaios.

The Redshift Blues é um disco de emo. A criação musical para ti serve como catarse?

Sem dúvida. Não diria que é pura e primariamente “emo” mas encapsula, evidentemente, muitos resquícios. Se um Solaris do Tarkovsky fosse um álbum, seria emo? Já no primeiro álbum muita da temática foi introspetiva e existencialista. Neste, embora a temática adjacente seja mais emocionalmente imediata, apenas se torna evidente pela expressão vocal mais intensa e instrumentação ríspida em partes. Para mim, a criação musical é uma das únicas brechas por onde as emoções fluem, numa tão presente anedonia onde moro, dissociado.

Face ao teu disco de estreia, The Redshift Blues apresenta composições mais arrojadas, com maiores toques de rock progressivo. Que diferenças notaste entre a criação das faixas do teu primeiro disco e o seu sucessor?

Enquanto no primeiro disco muita da composição partiu de improvisação com guitarra acústica e voz, quase numa veia de cantautor em que o refrão é o que despoleta a ideia da música, o segundo adveio de uma composição mais atómica, focada na interligação dos instrumentos e em experimentar um pouco com compassos de tempo e géneros diferentes. Tornou-se regular uma demo quasi-faixa estar num estado quase finalizado, composicionalmente, sem uma única palavra ou melodia vocal escritas. Em momentos, tornei-me num Mark Hollis de Talk Talk a fazer pós-rock onde depois vozes meditariam (e neste caso, gritariam).

Como vês a atual fase da música emo e o seu ressurgimento no contexto mais mainstream, seja através de eventos como a Emo Nite ou a influência em artistas como a Olivia Rodrigo?

Pessoalmente, o ressurgimento do emo atual deixa-me muito gratificado, seja na fifth wave do espetro mais alternativo e online, como na nostalgia da scene que a Emo Nite traz. Eu próprio ouvi mais Bring Me the Horizon nos meus tenros anos do que admitiria à frente das autoridades, e já estive presente em três edições do evento. Numa delas acabei a cantar At the Drive-In no palco como se de noite de karaoke se tratasse, acontecimento que aproveito para lamentar aos que presenciaram. No que toca a sensibilidades mais do pop-punk e mainstream como Olivia Rodrigo, confesso que não sou o maior connoisseur ou adepto dessa vertente mais early-Paramore, mas há espaço para tudo.

No perfil publicado no Espalha-Factos em 2022, contava-se que tiveste o teu início de produção musical na música eletrónica. Que bases desses tempos ainda utilizas nas tuas criações atuais?

Para além do próprio conhecimento e hábito aos programas de produção (DAWs), trago muitas técnicas de produção. Sou um grande fã de aleatoriedade como arma no sound design, recorro uma quantidade pecaminosa de efeitos digitais e sintetizadores nas composições, e prezo sobrepô-los em grandes camadas de som, como nos estilos eletrónicos em que “molhei os pés”. Fora disso, composicionalmente não tem nada a ver, o que é bom.

Uma das grandes qualidades de The Redshift Blues é o som de bateria, totalmente programado por ti no Ableton. Como decorreu esse processo?

O som de bateria foi uma das minhas mudanças favoritas neste álbum. A revolução industrial e as suas consequências permitiram qualquer um poder produzir bateria realisticamente sem ter acesso a um kit e a mãos de Midas, e eu acho isso ótimo. Inventar partes de bateria na minha cabeça e programá-las dum modo tanto realista como interessante é uma atividade favorita. Muitas vezes programo algo interessante mesmo antes de tocar alguma melodia ou acorde e improviso em cima até chegar a algo, o que é mais uma arma contra o Babadook do bloqueio criativo.

A sonoridade polida de The Redshift Blues aponta para um certo perfeccionismo presente na tua música. Como é lidar com isso e encontrar um termo com que te sintas confortável em colocar a tua música cá fora ao mundo?

A dúvida de mim próprio e dificuldade em apreciar as minhas criações na terceira pessoa foram problemas colossais durante a criação do primeiro álbum, mas o lançamento desse e a receção positiva deixaram-me num estado de espírito completamente diferente no segundo. Neste álbum, e desde então, encontro-me muito mais seguro e sem a assombração constante da comparação a artistas que estimo. Contudo, oposição ao perfecionismo nunca vou encontrar — a criação artística é o único ramo da minha vida onde sou obsessivamente controlador do resultado final (mas com mais parafusos e empatia que o Robert Fripp), mas quando sinto que cheguei ao fim de um trabalho não há receios em pô-lo cá fora.

Concerto no Porto — no Maus Hábitos — e The Redshift Blues já não está longe de fazer um ano. Que há mais no futuro para Dispirited Spirits?

É sempre muito estranho ver a data de lançamento de um álbum a fugir de mim, ironicamente, tendo em conta que a passagem do tempo é um átomo elementar da minha escrita. Após o lançamento de um álbum existe um período de distanciamento e mais questões que respostas, como é comum a esta bobina mortal, e é onde me encontro, mas muito em breve voltarei a criar. Procurarei lançar um álbum no próximo ano, mas ainda é cedo para essas conversas.

O objetivo atual é concerto no Porto, quinta-feira dia 30 de novembro, onde espero ter companhia a gritar para as estrelas.


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