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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 25/10/2023

É trap, de fato.

Derek: “Precisava alguém dizer o que era trap, e essa pessoa sou eu”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 25/10/2023

Mesmo online, Derek mantém a estética. Apesar do calor que faz na primavera brasileira, ele usa uma blusa de moletom preta e cobre a cabeça e parte do rosto com uma balaclava branca e preta. Antes de começarmos a conversa que duraria 20 minutos, ele pede um tempo para fazer uma publicação para seus fãs nas redes sociais. O membro do coletivo Recayd Mob está realizado por, em menos de 24 horas, Trap The Fato Deluxe ter ultrapassado os 3 milhões de streams em apenas uma plataforma.

Nos dias seguintes, o álbum com 23 faixas inéditas, participações de Baco Exu do Blues, Yunk Vino, Borges, Jé Santiago, Mc Luanna, Sendy, SV, Emitê Único, Kafé, Duquesa, Leozin, Did Brock, Slipmami, Mc Igu, Ryu the Runner, STEF, M’Dep, Brocasito, Nagalli, DFideliz, A$HP, Ian Trucks, Mattyahu, The Boy e G4 Boyz, e produções de Nagalli, Aziz (produtor de artistas como J. Cole) e Neckklace, atingiu a 7ª posição nos discos estreantes do Spotify e colocou 7 das suas músicas no Top 200.

A foto da capa escolhida por Derek para a sequência do álbum de 2022 representa muito bem a sua popularidade não só no Brasil, mas também na Europa e, principalmente, em países africanos da lusofonia. Ela foi clicada pelo fotógrafo Negrotti, durante a viagem do trapper a Moçambique. Nesse país, por onde passou ele arrastou multidões de fãs.

“Eu não tinha tanta noção de que países africanos me ouviam”, afirma ele na troca de ideia que tivemos sobre o disco, os seus ouvintes fora do país, o trap e a sua empreitada como head honcho do selo musical TRAP THE FATO, que é distribuído pela Universal Music. “Eu estou aprendendo muita coisa desse lado de empreendedorismo porque é um bagulho que eu não tinha experiência”.



Você tem números de ouvintes consideráveis fora do Brasil, principalmente na Europa e em países africanos lusófonos. Recentemente, você também foi para Moçambique e gerou um frenesi com o público lá. Ficou impressionado com a receptividade que teve?

Mano, eu não tinha tanta noção de que países africanos me ouviam, ’tá ligado!? Isso até eu começar a prestar mais atenção nas minhas redes sociais. Sempre tinha muitas mensagens de gente de Moçambique, Cabo Verde e outros países de África que falam a língua portuguesa. Então eu comecei a brisar mais nisso e a me comunicar com esse público, que achava que era pouco. Mas quando fui ver, na prática, percebi que eles consomem muito a minha música. É muito doido pensar nisso, porque são pessoas de realidades totalmente diferentes da sua, com um acesso não tão igual ao do Brasil, de ter possibilidade de conseguir ouvir a nossa música… Tipo, Moçambique tem várias áreas muito humildes e as pessoas não têm nem celular, mas conseguem cantar sua música inteira, ’tá ligado!? Elas conseguem ouvir bastante, conhecem suas músicas, conhecem os álbuns. Por isso, foi muito doido, um choque de realidade muito grande pra mim.

Você tem noção de como sua música chegou até esse público? 

Como chegou eu tenho quase certeza que foi com o “Plaqtudum” (da Recayd Mob), ’tá ligado!? Essa música estourou demais em países do continente africano e em Portugal… Então, o bagulho se popularizou rapidamente. Por isso, acho que começaram a me ouvir  com “Plaqtudum”.

A quantidade de faixas de Trap de Fato Deluxe vai contra os padrões atuais, ultrapassando as 20 faixas. Como foi produzir essa quantidade de músicas e escolher os convidados que estão colaborando?

Foi bem rápido, ’tá ligado, mano!? Tipo assim: Trap de Fato original tem 29 músicas, e eu demorei uns 2 anos pra finalizar — só pra você ter uma noção. Já este, com 23 músicas, gravei 3/4 no mesmo dia, ’tá ligado!? Fui gravando várias no mesmo dia… Foram 5/6 meses gravando na mesma época que a gente estava fazendo bastante show. Então, foi tudo muito rápido porque a gente ia gravando uma música atrás da outra. Quando vi, saquei que dava pra fazer um deluxe

Já estava com uma quantidade que dava para fazer um álbum…

Sim! Eu gravo muitas músicas em um dia. E tem muitas ali que eu fui gravar numa madrugada e ao mesmo tempo fiz mais umas 3.

E como nascem suas músicas? São de vivências, de ideias que surgem ou observações?

Muitas são de vivência mesmo… Eu gosto de fazer vários trocadilhos porque também gosto de rir pra caralho e também fazer as pessoas rirem. Então, faço vários trocadilhos ali pra eu e meus amigos rirem quando a gente ’tá de boa na sessão de estúdio. É mais a nossa brisa mesmo… É a minha realidade e dos meus amigos. A gente faz umas músicas pra gente ouvir nos nossos momentos juntos. Não tem uma métrica específica. Cada música é uma brisa, ’tá ligado!?

Mas é algo compartilhado pelo personagem Derek ou pela pessoa Derek?

… Tem música que é um personagem, tem música que sou eu, tem outras que eu conto uma brisa [história] que aconteceu com alguém e conto como se tivesse sido eu. São coisas que vão acontecendo na minha vida e eu vou só escrevendo e gravando.

Você tem uma identidade artística que é marcante e no disco tem uma divisão dela com artistas totalmente diferentes. De que forma você une sua personalidade, que é diferenciada, com as parcerias?

Mano, é muito legal isso porque, tipo assim: tem música que eu faço com determinados artistas que as pessoas nunca estão esperando eu gravar ou lançar algo porque é um jeito totalmente diferente de rimar. Por exemplo, eu e o Baco [Exu do Blues] temos jeitos diferentes de rimar. Você não está esperando ouvir um bagulho tão chave, e quando ouve fala: “Caralho, que foda!” Isso porque são dois estilos totalmente diferentes e eles conseguem fazer um bagulho chave. E é isso que eu tento fazer nas minhas mixtapes. É trazer uma identidade muito minha, mas ao mesmo tempo trazer um bagulho totalmente diferente para os meus fãs entenderem que eu consigo fazer outros tipos de músicas com artistas fora do trap de São Paulo.

Percebi muito isso nessa música com o Baco, em que você começa de um jeito e ele muda toda a trajetória logo depois, e a com a Mc Luanna — as suas ideias casaram muito bem com as ideias dela. Essas composições foram feitas em conjunto ou você fez primeiro e depois enviou para eles?

Algumas músicas eu gravei sozinho… Por exemplo: a com a Luanna, a gente gravou na mesma hora. Eu sempre gosto de escrever e gravar no estúdio, nunca escrevo em casa e levo para o estúdio. É algo que surge de forma instantânea.

As letras do trap trazem tanto conteúdo sexual quanto da rua, das gangues, crimes… Você falou que suas músicas refletem suas vivências e ideias. Antes, esses temas no rap eram meio proibidos, o foco era a mensagem e as questões sociais. Mas o trap quebrou um pouco isso possibilitando que o som fosse também para curtir, sem ter muito que pensar.

É doido isso porque eu comecei fazendo rap de mensagem, tipo assim: eu comecei a fazer rap com 14 anos, ouvindo muito rap nacional. Eu mesmo fiz essa transição de parar de falar de algumas coisas pra falar de outras coisas… Parar de fazer uma narrativa assim, principalmente na internet, porque quando você faz o hip hop mesmo, rap de verdade… Você tem que ser de verdade em tudo, nas letras, na rede social, na vida. Você entra num personagem chucro, e eu tive que fazer essa transição, de fazer um bagulho mais leve. Eu me questionei: “Caralho, mano, será que o que eu ‘tô fazendo é legal, ainda mais tendo referência dentro de casa…” Porque meus pais faziam rap também. Quando passei a fazer trap, eu pensei se eu iria agradar o rap e o hip hop. Eu tive essa mudança… Mas, mano, é um bagulho que a gente não deveria deixar se influenciar tanto, tipo o trap e os assuntos que a gente aborda. Acho que não deveria ter uma separada de, tipo: “Ah, isso aqui que ele ’tá falando não é rap.” Eu estou trazendo a minha verdade e as pessoas estão ouvindo e entendendo a minha verdade. Antes eu ficava pensando muito mais como e se eu iria ser aceite (no meio dos guardinhas do rap). Hoje eu não ‘tô nem aí pra isso.

Trap The Fato Deluxe ficou em #7 global, e várias músicas ficaram no top 200, isso com você rimando em português. É possível “jogar” de igual pra igual com os gringos sem usar o inglês como língua principal?

Acho que dá. Eu não tinha essa visão, ’tá ligado? De números em relação à música cantada em português e cantada em inglês. Mas hoje em dia dá pra alcançar bons números cantando em português porque é só fazer um trampo bem feito. A gente fazendo o trabalho de uma maneira bem feita, na produção das batidas, na mixagem e masterização, a gente consegue… Se for bom, se tiver um plano de marketing legal, os bagulho bate, não importa se é em português ou não.

Quais suas maiores referências no trap?

Migos era um grupo que eu ouvia todo dia e ficava estudando os caras, seja eles juntos ou solo. São os caras que têm a visão do bagulho e, pra mim, eles são os melhores construtores do trap. E não é só na questão musical, é também na estética e na história… Tem vários artistas que se renderam às músicas mainstream, mas eles continuaram sendo trap.

A estética é importante no trap?

Sim! Não é só você rimar em cima de um beat de trap, fazer uma música e colocar várias minas no clipe. É um conjunto de elementos que fazem o bagulho ser trap, senão qualquer pessoa poderia falar que canta trap, ’tá ligado!? É um conjunto de ideias e fatores que fazem o seu trabalho ser considerado trap. A sua estética tem que ser muito foda. E isso não acontece tanto aqui no Brasil. Aqui, muitos artistas que não têm estética são os mais ouvidos do país. Lá nos Estados Unidos, se o mano não tem estética, mas canta bem, ele não vai conseguir chegar em alguns lugares. Ele tem que ter algo a mais que vai prender a pessoa… Que vai fazer a pessoa ir no show dele, ’tá ligado!? Tipo: “Caralho, mano, eu preciso ver esse cara pessoalmente.” Aqui, muitas vezes não tem porque as pessoas só ouvem no Spotify. Não tem aquela vontade de querer ir no show pra ver como o artista é no palco. Tipo: eu quero ver como é o Travis [Scott] no palco, como que ele vai de um lado pro outro, como ele pega no microfone, como que ele vai pular ali na hora… E tem a estética dele que faz a gente pensar ainda mais nisso. No Brasil tem artistas que têm 30 milhões de seguidores e a pessoa anda na rua e ninguém reconhece ela. Ninguém olha pra ela e diz: “Caralho, mano, esse cara se veste muito bem, o dread dele é muito foda, as fotos dele é foda, quero ver como ele é pessoalmente, eu preciso ver o look dele.” Tudo isso faz um artista de trap. 

É tudo um conjunto de coisas, faz parte do lifestyle

Isso mesmo!

E o que é trap de fato?

Como assim?

De fato, o que é trap pra você… O que significa?

Trap de fato é um movimento que eu criei para as pessoas entenderem o que é o trap. Ainda mais na época que eu fiz (em 2020-2021), vários artistas que são de outros gêneros estavam tentando pegar o mesmo caminho que o nosso e dizendo que era trap. Mas nós sabemos que não é trap, o público sabe que não é trap… Só que precisava alguém dizer o que era trap, e essa pessoa sou eu. Então, quando você ouve a primeira faixa de trap de fato e ouve outro cara que diz que é trap, você consegue distinguir. Essa foi a parada. Esse foi o gatilho que tive, tipo: mano, eu preciso que as pessoas saibam o que é trap. As pessoas estavam denominando uma pessoa que correu pra caralho pra fazer trap e ele não fazia trap… E um mano que até há um ano atrás estava cantando outros bagulhos, estava sendo denominado o maior do trap? Eu como uma pessoa que trouxe o trap para o Brasil, parça, eu não ia deixar isso acontecer, ’tá ligado!?

Você agora também tem um selo em parceria com a Universal Music. De que forma tem trabalhado com seus artistas?

É um bagulho muito doido. Eu estou aprendendo muita coisa desse lado de empreendedorismo, porque é um bagulho que eu não tinha experiência. Também era algo que eu queria e sabia que iria me relacionar bem com meus artistas. Eu consigo ter uma relação muito legal, porque eles me ouvem bastante. Desde sempre me falavam que eu tinha que ter um selo, porque muita gente queria gravar comigo. Assim eu consigo potencializar novos artistas. Então, tá sendo uma parada muito foda.


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