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Publicado a: 30/11/2017

O cartel de rimas dos The Psycho Realm

Publicado a: 30/11/2017

[TEXTO] Gonçalo Oliveira [FOTO] Direitos Reservados

Os anos 80 ficarão para sempre marcados na história dos Estados Unidos da América como a época do boom para o consumo da cocaína. O pó branco conseguiu finalmente nessa época penetrar a fundo na economia em terras do Tio Sam, com Pablo Escobar a figurar no topo da cadeia alimentar dos mais bem sucedidos traficantes de droga. Don Pablo enchia os cofres com milhares de milhões de dólares e, nos EUA, os povos de descendência latina ganhavam “poder de compra” para enfrentar a vida de rua com um maior grau de autoridade.

Em ambiente de gangues, o hip hop tem-se vindo a mostrar enquanto forma de arte predominante. Faz todo o sentido, não estaríamos nós a falar do supremo ofício da cultura urbana, que se expressa em cinco vertentes distintas. A música, enquanto objecto artístico de maior alcance, acaba por ser aquela que demonstra um estatuto predominante. E o hip hop tem-nos feito assistir a diversos fenómenos culturais que nascem precisamente nos bairros, em ambientes tribais urbanos que visam unir as massas, documentar a realidade circundante, pensar os caminhos que muitas comunidades são obrigadas a trilhar.

 



Los Angeles serviu de incubadora para um dos projectos mais importantes do movimento hip hop nascido no seio da comunidade latino-americana. Os Soul Assassins, colectivo criado por B-Real que juntava todas as vertentes da cultura urbana em prol de um bem comum, albergou grupos míticos como os Cypress Hill, Funkdoobiest e, claro, os Psycho Realm.

A dupla formada pelos irmãos Gonzalez, Joaquin “Sick Jacken” e Gustavo “Big Duke”, surgiu no circuito do hip hop na recta final da década de 80. A falta de público para um género musical tão recente àquela data apenas permitia a ascensão mediática de um punhado de artistas, ao contrário do ecossistema perfeitamente funcional e alargado hoje existente. Os Psycho Realm viram-se na sombra das primeiras estrelas que nasciam no panorama do rap, os filhos de Bambaataa sedentos por trazer novas ideias à música que celebra a cultura urbana.

Foi apenas em 1994 que Sick Jacken e Big Duke começaram a ver o seu talento reconhecido, ao assinarem um dos temas presentes na banda sonora de Mi Vida Loca, um filme de Allison Anders que retrata a vida de duas jovens num bairro latino de Los Angeles. “Scandalous” foi o single dos Psycho Realm com maior alcance até à data e colocou o grupo num alinhamento em que constavam também A Tribe Called Quest e os Funkdoobiest.

 



Com os concertos surgiram as melhores oportunidades para que os irmãos Gonzalez se pudessem mostrar a quem os pudesse ajudar a escalar a pirâmide do hip hop. Que o diga B-Real, que não tardou em reconhecer o potencial dos dois MCs numa actuação em Olvera Street no âmbito de um evento para promover a paz entre os bairros. O bilhete dourado valeu-lhes uma entrada directa nos Soul Assassins pela porta grande: além do companheirismo e ajuda oferecidos pelo colectivo do rapper dos Cypress Hill, B-Real fez questão de deixar a sua marca no disco de estreia da dupla ao participar com rimas em quase todos os temas de Psycho Realm. A dupla passava a trio e em 1997 nascia um álbum clássico na costa oeste norte-americana. Também a Sony percebeu a grandeza do projecto que Sick Jacken e Big Duke tinham em mãos e levou-os a assinar um contracto de distribuição. A ligação não durou muito tempo mas foi o suficiente para espalhar ainda mais a crueza implícita em Psycho Realm.

“Stone Garden” foi o tema de maior êxito, o primeiro single a surgir do álbum de estreia da dupla. Sick Jacken, Big Duke contam com a ajuda de B-Real para um ensaio sobre a morte, num exercício em torno das várias formas de ir dar ao mundo dos que não são esquecidos, deixando para trás os corpos por debaixo de uma lápide, formando extensos jardins de pedras. “Love From The Sick Side” colocou o grupo a desabafar o lado mais depressivo do romance, numa autêntica roleta de emoções que levam um homem à insanidade ao deparar-se com a falta de crédito por parte da mulher que ama. O consumo de estupefacientes também salta à vista em Psycho Realm e “Cofessions Of a Drug Addict” é uma ode a isso mesmo. Inalável, injectável ou digestível, há tipos de administração para todos os gostos, cada uma com o seu efeito mas que servem para um propósito em comum: fugir do stress da realidade por alguns momentos.

A carreira dos The Psycho Realm ficou negativamente marcada pela paralisia do corpo de Big Duke, que foi alvejado no pescoço dois anos após a saída do primeiro disco. O grupo ainda voltou a editar novos trabalhos, que foram lançados através de uma editora criada pela dupla, actualmente gerida por Duke. Sick Jancken destacou-se também enquanto artista a solo – além dos álbuns em nome próprio, o rapper ajudou a elevar a palavra dos The Psycho Realm ao colaborar em temas de Evidence, Immortal Technique, La Coka Nostra ou P.O.D.

 


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