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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 09/10/2019

Notwan e DWARF participam no álbum de estreia do produtor pelo colectivo COLÓNIA CALÚNIA.

Can I sobre UNDERNEATH: “É a exploração sonora do negativo. É um quadro feio com uma moldura bacana”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 09/10/2019

Can I acaba de lançar o primeiro álbum de instrumentais através do colectivo COLÓNIA CALÚNIA. Envolto de vibrações sombrias, UNDERNEATH conta com contribuições de Notwan e DWARF, masterização de Tiago Lopes e uma capa desenhada por Sérgio Faria.

A ideia pode hoje soar estranha, mas o struggle era bem real há coisa de 10 anos. Como muitos outros MCs da altura, Can I deparou-se com as dificuldades de conseguir batidas na Internet e abraçou o clássico eJay para conseguir criar as bases através das quais veiculava os seus escritos.

O percurso foi longo até chegar ao Ableton Live, um dos softwares de eleição por parte considerável da elite da produção à escala global, e o gosto pela instrumentação digital acabou por se sobrepor à escrita de canções de rap. Em Janeiro de 2018 arrancou com a página de Can I no SoundCloud, que teve o EP Uneasy como primeira amostra dos dotes que exibe perante as actuais cenas trap, bass e downtempo e que lhe saem dos pulsos mescladas com nuances de electrónica cerebral e paisagística.

Em conversa com o Rimas e Batidas, o produtor lembrou o trajecto que percorreu até chegar a Can I, apontou algumas das suas influências e explicou a concepção de Uneasy e deste mais recente UNDERNEATH.



Fala-me do projecto Can I: como e quando surge esta necessidade de te expressares musicalmente?

Bem, na verdade, comecei em 2003/2004 como MC, e na altura ainda não existiam beats na net, então houve necessidade de arranjar instrumentais, o que me levou ao eJay. O gosto pelos instrumentais foi aumentando e comecei a explorar mais essa área, passando por todo o tipo de software que existia — FL Studio, Reason, até chegar ao Ableton Live. Can I é o projecto mais recente, que culminou dessa aprendizagem ao longo dos anos e representa uma parte negativa da minha identidade enquanto artista, basicamente as chapadas que a vida me deu transportadas para a música.

O que te tem movido criativamente? Tens artistas de referência ou outras fontes de inspiração que transcendam a música?

Muitas vezes o que me inspira a criar são pormenores. Uma frase de um filme ou um pequeno som que ouço, é o suficiente para começar a magicar uma música na minha cabeça. Mas o que me faz mesmo agarrar no teclado é um dia mau. Tenho especial apreço por bandas sonoras e pela sonoplastia de filmes e jogos. As minhas principais referências provêm muito do rap português, do post-rock, da electrónica, do experimental e basicamente tudo o que seja alternativo. Mas recentemente onde paro mais é em Lorn, Nerve, Tyler the Creator, Son Lux, Manel Cruz…

Há um ano editaste o Uneasy, o teu EP de estreia. De que forma é que esculpiste esses teus primeiros temas? Que tipo de ferramentas, físicas ou digitais, utilizaste na hora da composição?

Uneasy foi um pontapé de entrada e uma forma de identificação como artista, diferente daquilo que já tinha feito anteriormente. É mais melódico, composto com teclado e com poucos samples. O material é o mesmo que usei no álbum: monitores, teclado MIDI, Ableton e VSTs. A maior parte dos meus instrumentais partem de um loop, com uma melodia que acho interessante ou, como fiz neste álbum, um ruído que me deixe desconfortável para introduzir como main sample, uma bateria e um baixo (extra bass sempre). Eu tenho um problema com baixos baixos.

Agora apresentas-nos UNDERNEATH, a tua primeira ingressão num registo mais extenso. Quando é que começaste a formular esta ideia na tua cabeça?

Depois do EP, sabia que queria fazer algo num registo mais extenso e com um género diferente do Uneasy. Quis seguir as linhas pelas quais me cosi até hoje, puxar influências de beats de rap e electrónica. A ideia inicial era uma compilação com MCs a rimar por cima dos beats, mas à medida que ia trabalhando nos instrumentais, não senti necessidade de lhes incluir uma voz. Depois do álbum estar concluído, surgiu a oportunidade de sair através de COLÓNIA CALÚNIA e, para dizer a verdade, já desde o esboço de UNDERNEATH que o associava à sonoridade do colectivo.

Do ponto de vista sónico e técnico, há uma clara evolução e uma maturidade acrescida na forma como finalizaste estas faixas. O que mudou desde que te iniciaste na produção, seja no teu setup ou na forma como constróis cada batida?

Os dois projectos foram feitos com o mesmo gear mas abordados de uma forma diferente musicalmente e também com um diferente mindset. Em UNDERNEATH, em vez de tentar construir uma melodia com um piano clean, agarrei num som mais pequeno e “descortinei-o” até se tornar mais negro e destrutivo, a ponto de conseguir criar uma sonoridade que fosse mais difícil de digerir, mas que ainda assim se conseguisse tirar partido da sua musicalidade. Em termos de bateria, eu quis tanto dar um ritmo simples que possas curtir, como uma batida que não é suposto estar lá. Tens faixas que acabam sem razão aparente quando estão no pico, mas, como na vida, o que é bom acaba mal começa.

Indo ao lado conceptual da obra, existe alguma ideia por detrás deste UNDERNEATH? Que tipo de vibrações procuraste deixar bem vincadas no projecto?

UNDERNEATH é exploração sonora do negativo. É um quadro feio com uma moldura bacana. Tens bons momentos em UNDERNEATH, mas são muito curtos. Imagina um trabalho rotineiro e desgastante de segunda a sexta, das 09h às 18h. UNDERNEATH é aquela meia hora de sexta-feira a partir das 17h30, em slowmotion. Sinto a necessidade de fazer música que reflicta isso mesmo, que não te faça sentir bem e que te deixe desconfortável.

Apesar de ser um álbum assinado por ti, contas aqui também com uma música do NOTWAN e outra do DWARF, nas quais não tiveste qualquer tipo de input. Como é que chegaste a estes dois artistas e de onde parte esta ideia de os deixares cravar a sua própria marca no teu trabalho?

Para mim é muito simples. Eu gosto de trabalhar com artistas que admiro e que tenham projectos me digam alguma coisa. Por isso, faz todo o sentido para mim este tipo de colaborações. Conheço o DWARF desde o secundário, sempre tive em consideração o seu trabalho e sempre partilhámos opiniões sobre os nossos projectos individuais. Já há muito tempo que tentamos fazer algo os dois e não fazia sentido não o ter no meu primeiro álbum. O Notwan foi algo mais espontâneo. Conheci-o de raspão através do DWARF, mas já acompanhava os seus projectos há anos. Tive a oportunidade de o convidar e ainda bem que ele aceitou porque fez uma faixa do car**** e está no meu disco.


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