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Publicado a: 07/08/2018

BEAT FEST 2018 – Dia 3: Fecho de ouro para ideia com futuro

Publicado a: 07/08/2018

[TEXTO] Rui Miguel Abreu [FOTOS] Paulo dos Passos / Antena 3

O último dia de BEAT FEST prometia Holly Hood, Eva RapDiva, Dillaz e a dupla Mundo Segundo & Sam The Kid. De certa maneira, o cartaz do passado domingo traduzia a ideia mestra do cartaz do nascente evento de Comenda, Gavião: a de que o rap tuga é hoje um prisma multifacetado, com diversas nuances, sotaques, posturas e sonoridades.

Se Holly Hood pode neste contexto representar uma aguerrida nova-escola, a rapper angolana Eva RapDiva — que se apresenta em palco como “filha do rap tuga” — mostra que esta cultura de rimas é universal e estendeu-se, de África ao Brasil, a todos os sítios onde se fala português. Dillaz é outro filho da história do rap nacional e faz a ponte com um futuro que se apresenta cada vez mais brilhante, abraçando a modernidade sem recusar a tradição. E, finalmente, Mundo e Sam representam todo o caminho que foi necessário fazer para aqui chegar, uma história longa de que o presente é a inevitável conclusão.

E se se pensar que ao longo de quatro dias houve espaço neste cartaz para rap do Minho ao Algarve, para trap e boom bap, para DJs e MCs, para talentos emergentes e certezas afirmadas, para rimas afiadas e palavras conscientes, para a força de colectivos e o vigor de talentos individuais, para homens (muitos, é verdade) e mulheres (poucas, ainda, também é verdade…), percebe-se que o futuro só pode ser risonho.

 



A visão do município de Gavião é acertada: na Ribeira da Venda, Comenda, o espaço tem todas as condições para se revelar uma meca para muita gente rumar no Verão; falta a rede telefónica, mas certamente que no ano que vem isso já não será problema. Sobra a sombra e a frescura das águas, a escala que garante conforto, os bons ares e a simpatia das gentes e a arte de tão bem receber.

No arranque do derradeiro dia, Holly Hood levou para o palco o seu inseparável Here’s Johnny que forneceu ao MC da Linha da Azambuja banger atrás de banger que o público recebeu de forma efusiva. Chamou No Money ao palco para “Se Eu Não For Rico” e desfilou os seus principais argumentos — de “Fácil” a “Cala a Boca” — sempre amparado pelo público. O concerto de Holly tem arestas por limar, mas o carácter algo imprevisível do MC em palco é também parte do seu indomável charme. Certo, certo é que empatia com a plateia é coisa que não lhe falta.

 



Eva RapDiva também fez por merecer essa empatia. A Lady Boss aguentou nos ombros o peso da responsabilidade de lhe caber no cartaz a representação de todo um género, levou Tayob Juskow para a secundar nos pratos e Isaías e Tamin para a suportarem nas vozes e mostrou que rimar no feminino não é um handicap, antes pelo contrário. E no momento de entregar um microfone a membros do público para receber combustível para o seu freestyle, a artista que se divide entre Lisboa e Luanda deixou claro que não estava ali de férias e arrancou merecidos aplausos à plateia.

Seguiu-se aquele que foi, sem dúvida um dos momentos mais altos do festival. Aliás, com Dillaz e Mundo Segundo + Sam The Kid a fecharem o cartaz no que a concertos dizia respeito — a noite ainda mereceu ponto final de luxo por Stereossauro –, a tendência de manutenção da fasquia no nível máximo não se inverteu.

 



O homem da Madorna confirmou porque é um dos mais seguros valores da presente geração. Com um som sem mácula servido por Spliff (aliás, uma palavra de louvor para o som neste festival que foi quase sempre de luxo), com as batidas a revelarem todo o seu punch, todas as suas subtilezas harmónicas e melódicas, toda a sua riqueza rítmica, Dillaz desfilou um concerto muito equilibrado entre componente visual, dinâmica física em palco e argumentos puramente artísticos. Com Vulto e Zeca ao lado — e ambos puderam brilhar por direito próprio — o homem de Reflexo começou por garantir “Eu Estou Bem”, foi ao passado buscar “Pedras no Meu Sapato” ou “Não Sejas Agressiva” e de “Pula ou Levas Bléu” a “Mo Boy” só deu rebuçados com recheio de talento puro a uma multidão sabedora, que se entregou a cada palavra. O final foi rematado com “1100 Cegonhas” e “Clima” numa actuação a roçar a perfeição.

Quando Mundo Segundo e Sam The Kid subiram ao palco, secundados por DJ Guze e Cruzfader, já se sabia que a cereja no topo do bolo servido pelo BEAT FEST ia ser plenamente saboreada. O set foi de luxo: começa por reclamar a veterania com recurso ao manifesto “Sou do Tempo”, passa por hinos como “Tu Não Sabes” ou “Sofia”, desfila histórias como “Solteiro”, recupera bangers como “Não Percebes” ou “Escola dos 90” e traz ao palco o brilhante diamante Maze para o devido tempero. “Também Faz Parte” ou “Brasa” são momentos de pura telepatia entre Gaia e Chelas que mantêm o público agarrado de forma firme. Quando se chega a “Poetas de Karaoke” já não há dúvidas: Sam e Mundo são dois dos maiores pilares da cultura que aqui se representou. E é pelas suas gargantas que passam para o público elogios ao cartaz que colocou Comenda, Gavião, de forma clara no mapa do hip hop nacional.

 



A desmobilização começou logo que o quarteto abandonou o palco, mas quem quis aproveitar a festa até ao fim ainda enfrentou o calor da madrugada com as escolhas certeiras de Stereossauro: que a organização tenha escolhido para fechar a festa um DJ que faz da paixão por todas as coisas tugas uma afirmação da sua personalidade só traduz a pontaria que caracterizou todo o evento.

De acordo com o representante máximo da autarquia, esta é uma ideia para se repetir, uma semente que merece crescer, pelo que podemos, com segurança, deixar por aqui um “até para o ano!”

 


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