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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 28/03/2021

A sessão de live stream para a Look Closer Sessions revelou um trio seguro em busca de um lugar no futuro.

Bardino ao vivo no Teatro de Vila Real: entre o cosmos kraut e os grooves do jazz-rock

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 28/03/2021

Os Bardino apresentaram-se ontem ao vivo no Teatro de Vila Real, numa sala obviamente vazia, mas onde a equipa da Look Closer Sessions dispôs uma série de recursos técnicos para um live stream de enorme qualidade, tanto visual, quanto sonora. E o Rimas e Batidas, graças a um convite da banda e da entidade organizadora do evento, teve a rara oportunidade (para os dias que correm, claro) de presenciar um concerto no mesmo espaço em que os músicos o apresentaram. Uma vibração especial e particular e um privilégio irrecusável nesta altura.

Nuno Fulgêncio (bateria), Diogo Silva (baixo) e Rui Martins (sintetizadores, piano eléctrico, guitarra eléctrica) apresentaram-se com o entrosamento típico de quem pudesse ali ter chegado já com uma digressão em bom andamento e com ensaios frequentes: oleados, perfeitamente encaixados uns nos outros, nunca cedendo espaço a algum tipo de hesitação.

Com o material do belíssimo Centelha como central nesta apresentação, os Bardino puderam percorrer durante os cerca de 50 minutos de concerto a distância que separa o Zodiak Free Arts Club da Berlim kraut de finais dos anos 60 de Conrad Schnitzler e os clubes de L.A. onde em finais dos anos 70 Jan Hammer tocava com o seu grupo uma mistura de prog, jazz e funk com uma elegância condizente com os fatos leves de seda que cada um certamente vestiria.

Sob um apurado desenho de luzes e em frente de um mural vídeo em permanente e abstracta transformação, os Bardino desfilaram grooves com peso e medida, exploraram as estrelas por via da invenção melódica e harmónica dos synths de Rui Martins e acrescentaram ao seu denso caldo pitadas de dub cósmico, floreados quase house, lembrando por vezes os Cool Hipnoise mais exploratórios de Missão Groove.

A bateria de Nuno Fulgêncio é talvez a chave nesta equação particular em que assenta a linguagem dos Bardino, mas não apenas por causa da sua óbvia e vigorosa capacidade de propulsão rítmica: nas mãos de Nuno, a bateria torna-se igualmente ferramenta expressiva de preenchimento de espaços, até de sugestão de ambientes. Já o baixista Diogo Silva, a partir do seu Fender, mas também do seu Korg Monologue, é o homem que domina os grooves e os transforma em sinuosas aventuras lúdicas para os nossos ouvidos. O teclista Rui Martins, por outro lado, não se limita a combinar imaginativamente synths com Rhodes e também assoma pontualmente à guitarra, revelando aí uma assinalável capacidade de invenção, com improvisos sempre esculpidos com requinte numa bem apetrechada pedaleira que lhe expande a paleta tímbrica e harmónica.

Os Bardino podem ser só três em palco, mas soam tanto a orquestra capaz de assumir lugar na cena da cantina de Star Wars como a grupo de estúdio ao serviço de mais um festival de tensão de John Carpenter, mas também é lícito ler nesta procura de múltiplas referências para enquadrar o seu som um facto muito simples: embora capazes de evocar experiências passadas, e ao vivo talvez até mais do que em disco, os Bardino soam essencialmente a si mesmos, uma banda que cruza sofisticação jazz com pulso rock, que soma à equação toques de dub, sinuosidade funk e embrulha tudo num manto electrónico de fino recorte. Funciona, convém sublinhar, e poderá trazer-lhes futuro.

Este concerto procurou, através de um apelo a doações, recolher bem vindos fundos para a União Audiovisual e até nisso teve um propósito nobre. Mas serviu sobretudo para deixar claro que os Bardino merecem um lugar no mais criativo ecossistema de novas bandas nacionais e que estão preparados para todo o tipo de palcos. Possam eles então reabrir para que as plateias, como aquela em frente à qual o trio baseado no Porto ontem se apresentou, se encham de gente capaz de premiar com aplausos quem entende a música como espaço de livre invenção. Já não há-de faltar tudo.


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