A Orquestra de Dispositivos Eletrónicos é uma iniciativa que, desde 2019, tem lugar no programa anual do Circuito – Serviço Educativo Braga Media Arts. Parte de uma chamada aberta a qualquer pessoa que queira participar da criação musical partindo de instrumentos sonoros menos convencionais, tais como computadores, iPads ou sintetizadores. Esta formação reformula-se a cada nova edição, e a deste ano conta como convidada na direcção de orquestra a harpista e compositora Angélica Salvi.
A propósito da sua participação e antevendo a estreia no gnration este sábado, dia 7 de Junho, como a primeira de três apresentações previstas da ODE para este ano, trocámos umas breves impressões com a maestrina em funções, procurando desvendar o que a abordagem baseada numa outra pedagogia de composição, partindo de um universo amplo e livre, pode trazer ao campo da música.
Esta ODE é uma ideia que vai na 7ª edição e que tem proporcionado à comunidade local, mesmo a não-músicos, uma participação criativa e colectiva na música. Mas quando é referida a palavra “orquestra” pensamos de imediato numa estrutura complexa de fazer música. Qual a tua abordagem a esta outra ideia de orquestrar?
Para mim, orquestrar é simplesmente reunir um grupo de intérpretes para tocar, adaptar ou criar uma obra musical em conjunto. Qualquer objeto ou pessoa que emita algum som é bem-vindo.
A ODE que já contou com a direcção artística de Rui Souza, Ece Canli, Pedro Augusto, Pedro Santos, Lucas Palmeira e Filipe Lopes. Como recebeste este convite e o que te fez aceitar este desafio?
É uma honra fazer parte deste desafio. Aceitei com muita alegria, orgulho e emoção. Toda atividade relacionada à criação musical, especialmente em conjunto, motiva-me profundamente.
Para ti, que estás habituada a um ensino institucionalizado da música e invariavelmente mais formal, como sentes esta abordagem mais livre e aberta — fora do cânone do ensino musical? Pode bem ser um caminho que trará mais praticantes à música e criação sonora?
Decidi utilizar o método do soundpainting, uma técnica de composição em tempo real, para este projeto. É um método que começa a ser utilizado em muitas escolas de música, por isso não me pareceu muito diferente do que costumo fazer. Definitivamente, acho que é um bom caminho para atrair mais praticantes para a criação sonora. É uma linguagem de gestos que também pode ser usada por bailarinos, atores e artistas visuais.
Na verdade, a tua prática enquanto música e compositora aborda muito uma linguagem de dispositivos electrónicos na harpa. Claro que um instrumento não vale por uma orquestra, mas a forma de processar o teu som com recurso à electrónica traz vantagens para esta abordagem. Encontras pontos de ligação no teu processo solitário com o deste colectivo?
Existem pontos de conexão evidentes. Estou familiarizada com pedais de efeitos, programas de criação e produção, assim como com certos sintetizadores. Para mim, trata-se de um mundo sonoro muito familiar, portanto a comunicação com a orquestra tem sido fácil e intuitiva.
Falamos de um conjunto de instrumentações atípicas, ou melhor numa linguagem nada clássica e com muito de novas ferramentas e linguagens. De que forma foste surpreendida dentro dos instrumentos trazidos para serem tocados?
Cada um dos músicos e instrumentos que fazem parte da ODE tem uma personalidade única e extraordinária. Penso que, ao longo dos nossos ensaios, conseguimos descobrir e desenvolver em conjunto novas sonoridades muito interessantes e inspiradoras. Explorar os instrumentos dessa forma é fundamental para encontrar os sons com os quais nos sentimos identificados e poder-nos expressar da maneira mais autêntica possível.
Que possibilidades traz à composição um processo de construção tão aberto e dinâmico? Haverá espaço para a improvisação, para a criação em tempo real?
Sim, haverá espaço para improvisação e criação em tempo real; a técnica do soundpainting serve precisamente para construir sonoridades abertas e dinâmicas.
Para já, sabe-se que haverá uma componente visual desenvolvida por estudantes de Mestrado em Media Arts. O que podes revelar sobre o concerto de apresentação da tua acção como direcção da ODE? Quantos serão em palco? Também vais estar a tocar?
Seremos 11 músicos no palco, com os alunos de Media Arts a tratar do mapping. Eu estarei a dirigir a orquestra, e ainda estou a pensar se vou tocar ou não! Provavelmente vou decidir na hora… Faz parte da improvisação [sorrisos].