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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 03/11/2023

Está aí o primeiro disco da dupla de Landz e Safari.

Afrokillerz sobre UKÄRÄ: “É um álbum sensorial, quase que vemos a música fisicamente”

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 03/11/2023

Depois do lançamento de diversos temas e projectos informais com sucesso, os Afrokillerz apresentam esta sexta-feira, 3 de Novembro, o álbum de estreia, UKÄRÄ. A dupla de Safari e Landz tem vindo a trilhar um percurso bastante próprio na cena da batida de Lisboa, descrevendo o próprio som como afrotech, cruzando as percussões africanas com a música electrónica.

Com a sua música, já actuaram por países como o Azerbaijão, a Ucrânia, o Reino Unido ou a Índia, o que ajuda a ter noção sobre o impacto internacional que estes dois produtores e DJs têm vindo a construir ao longo dos últimos anos. 

UKÄRÄ é um disco maduro que marca mais formalmente o seu percurso discográfico e Landz e Safari procuraram uma estética sensorial, bastante trabalhada ao detalhe, para que estas faixas sejam ouvidas da melhor forma num clube, num carro ou nos auscultadores dos ouvintes. Brevemente, deverá também ser editado em vinil. O Rimas e Batidas entrevistou o duo sobre o álbum.



Vocês já lançaram vários projectos ao longo dos anos. Porque é que assumem este como sendo realmente o primeiro álbum? É por ser um projecto mais sério?

[Safari] Acaba por ser isso. Estivemos uns cinco anos a experimentar antes de lançarmos o álbum. Não sei bem como é que os podemos considerar, porque eram mixes nossos, só com músicas nossas. E o pessoal foi pensando que era um álbum. Mas não, era algo que fazíamos para ir mostrando o nosso processo criativo. Não para ser as músicas que nos iam definir, mas para sermos experimentais e perceberem para onde é que queríamos caminhar musicalmente. E quando chegámos a esse consenso, percebemos: já sabemos o que realmente queremos fazer, como experimentámos tanto, que agora, sim, sentimos que podemos lançar um álbum. 

E com os anos, com a experiência dos projectos, das músicas e dos sets que foram fazendo, o vosso processo criativo evoluiu certamente para que vocês agora sejam mais profissionais, mais sérios.

[Safari] Acaba por ser um conjunto de emoções. Passámos pelo processo de estarmos a fazer a música para agradar aos nossos amigos, que estavam à nossa volta, para os convencermos de que éramos DJs isto falando do início. Depois passámos para uma fase em que fomos descobrir o game, que não é só fazer música, que temos de nos relacionar com as labels; e depois estivemos numa fase em que já somos mais conhecidos pela indústria e voltámos para os nossos amigos. “Ok, estes gajos já estão bué experimentais.” Temos de lhes mostrar algo de que eles gostem.

[Landz] Que foi o Futeceros 3.

[Safari] E depois arriscámos mais no 4. E agora, realisticamente, esquecemos todos: os nossos amigos, as labels, e vamos fazer o que realmente queremos. Mas demos uma série de saltos até chegarmos ao álbum. Como nunca nos sentimos fiéis a nós mesmos, nunca colocámos a hipótese de fazermos um álbum. Só quando começámos a pensar mais em nós e naquilo de que gostamos é que fomos em frente.

E como é que vocês descreveriam este álbum?

[Landz] Tem um pouco de tudo. É uma viagem pela música electrónica. É sentimental, alegre, triste, tem um pouco de tudo. É o upgrade de tudo o que fizemos para trás.

[Safari] É muito mais adulto. Nós não estamos só preocupados em retirar sons, a criar as notas e tudo mais. Também estamos mais preocupados com texturas. Quase que vemos a música fisicamente. As pessoas têm a emoção devido ao tom que a música tem, mas também à quentura da música. Um baixo estar mais saturado, um kick ser mais presente, ter mais textura, mais corpo… A primeira experiência que vão ter com o álbum é que é mais sensorial. Se forem ouvir com uns bons fones, vai ser muito sensorial. E, depois, temos as linhas melódicas. Mas preocupámo-nos mais com as sensações, sentires que um instrumento está mais distante, que está mais em cima ou em baixo… Tivemos uma preocupação com a tridimensionalidade da música, e se calhar não lhe dávamos tanta atenção no passado.

E estavam a falar do processo em relação às labels e este disco sai pela Kazukuta. Quão importante é que o lançamento seja por esta editora?

[Landz] Poderíamos ter entregue o disco a outras labels, mesmo nacionais, mas é muito mais fácil entregar o álbum a uma label que se foca naquilo onde queremos realmente caminhar, que é o circuito da música electrónica. E a Kazukuta apareceu numa fase muito boa da nossa carreira e abriu-nos muito a nossa mente, tanto a nível musical como em aspectos de carreira. E hoje temos a plena certeza para onde queremos caminhar e seguir.

[Safari] E não é só o mundo da electrónica, também estamos muito focados no nosso raio. Sabemos que aqui há algumas festas com grande dimensão e público e não o rejeitamos. Agradecemos porque, quantas mais pessoas, melhor. Mas acreditamos que, às vezes, estamos num nicho em que as pessoas não conhecem o nosso trabalho. Elas vão mais porque se calhar as massas que consomem o nosso trabalho vão. Mas, realisticamente, de onde o nosso trabalho vem é para onde estamos a caminhar. Estamos muito focados com o processo que, por enquanto, Portugal nos dá. Acredito que nos vai dar mais porque o movimento cresceu imenso cá.

Obviamente são de uma geração mais nova do que os pioneiros da batida em Portugal e vocês depois encontraram o vosso próprio estilo, e outros artistas e grupos também e levaram a coisa para outros sítios, mas sentem que é um universo em constante expansão e crescimento? A nível de sons? De público? De circuito de festas e DJs?

[Safari] O fado de hoje em dia não é o mesmo do início. E o afrohouse vai pelo mesmo processo. Com a evolução vai-se adaptando aos ouvintes. E não falo de fazermos remixes de músicas conhecidas para que as pessoas conheçam o nosso estilo. Estou a falar da escolha de instrumentos… 

[Landz] Houve uma época muito EDM, afro-latino…

[Safari] Agora, com o regresso do house e do techno, está mais próximo do techno. Ou seja, o afrohouse não está parado, consegue adaptar-se. Há estilos tradicionais, como o semba ou o funaná, que não evoluem e mantêm-se fiéis à tradição. O que não é mau, é justo.

E à medida que o circuito do afrohouse se foi profissionalizando também houve evolução criativa. Sentem que o género ainda está longe do que pode vir a ser em termos de profissionalização? Há muito por fazer e por crescer?

[Landz] Cá em Portugal, o afrohouse ainda não se profissionalizou por completo. Está a fazê-lo, aos poucos, porque há vários artistas a trabalhar para isso. Mas ainda estamos um pouco atrasados em relação a muitos países, onde a música house já é vista como algo superior ou grande… Em Portugal ainda está a crescer. Mas acho que é uma questão de tempo.

[Safari] E a nossa geração já tem mais oportunidades do que a geração passada. Muitos vieram das comunidades e sendo africanos… E nós temos dificuldades mas sabemos que não são assim tão grandes como as da geração passada. Às vezes sentamo-nos com eles e eles dizem: “Vocês estão, talvez, a viver o sonho de muita gente.” E nós sabemos que a geração que vem a seguir a nós, com a idade deles estávamos a brincar ou a tocar em baptizados, e esta geração já está muito mais à frente. 

[Landz] Já consegue tocar em clubs, que era algo que se calhar nós com a idade deles tínhamos que ter alguma ligação ou esforçarmo-nos imenso para mostrar o trabalho a quase toda a gente… Era pegar no trabalho e ir bater às portas. Mas as redes sociais e o digital também vieram facilitar muito.

Vocês lançaram o “Countdown” como single e tem uma participação vocal, da Szon. Enquanto produtores, também gostam de ter esse lado? Porque, obviamente, é diferente fazer um beat que vale por si mesmo ou um que também tem uma voz. Suponho que seja diferente para vocês. O que é que vos agrada mais em ter esse lado da voz?

[Safari] Nós somos mais apegados aos instrumentais. Às vozes também somos, mas se calhar, como vimos muito do instrumental e o trabalhámos imenso… Acho que com as vozes o desafio foi aprender que as duas coisas têm de se tornar uma, o instrumental e a voz. E isso revela-se nas nossas músicas antigas com voz. Parecia que a música era uma coisa e a voz outra. Portanto, foi um processo doloroso e as músicas que estão no álbum são o update dessas tentativas que fizemos no passado. 

Vão ter datas específicas onde se vão focar mais no álbum ao vivo? Ou vão manter uma agenda mais clubbing?

[Landz] Em relação à festa de lançamento do álbum, ainda não temos certezas. Mas por enquanto vamos estando em clubs e vamos também apresentando um bocado do nosso álbum. Mas estamos a pensar em, mais para a frente, fazer uma apresentação como deve ser. 

[Safari] Apesar de sermos da electrónica, queríamos fazer algo em menor escala para darmos a conhecer o álbum aos nossos fãs mais próximos. Passa-nos pela cabeça fazermos uma listening party em que as pessoas estão com fones, e estarem realmente a ouvir o álbum, e não a dançar que se calhar é o que muita gente está à espera , e nós paramos as músicas e explicarmos o que fizemos em cada som, sermos mais próximos. É nesse sentido que estamos a pensar. E não quer dizer que vá ser num club, pode ser numa biblioteca [risos]. Mas estamos a pensar nalgo assim, que não seja tanto para curtir. Podem curtir depois. 

Também vos queria falar sobre a importância do formato de álbum. Há muitas pessoas que já só ouvem singles, faixas soltas, que ouvem playlists porque estamos na era do streaming. O formato álbum continua a existir e a ser relevante, mas para vocês continua a ser muito importante para marcar um momento da vossa carreira, para mostrar que estão numa fase mais profissional e séria?

[Landz] Na minha vida inteira, desde que comecei a aventura de ser artista, que sempre sonhei ter um álbum. E acho que é um feito grande para qualquer artista. E também quero muito que haja uma edição física, para mim é a realização de um sonho de infância. 

Não sei se planeiam muito cada passo ou se vão mais fazendo pelo caminho, mas quais são as grandes metas que têm para a vossa carreira? O que é que vos falta fazer e que querem mesmo fazer?

[Landz] Vai sempre faltar-nos algo, porque somos pessoas que nunca estamos satisfeitas com o que já alcançámos. Pensamos muito num passo de cada vez, sem pressas, e neste momento estamos mais focados no álbum. 

[Safari] Em termos musicais, claro que estamos completamente focados no álbum. Mas se olharmos para uma perspectiva de carreira, queremos olhar mais amplamente para o mundo. Queremos atingir o mundo. Não queremos ficar apenas presos a Portugal. E já fomos a sítios como o Azerbaijão, à Ucrânia, à Índia, tivemos uma proposta para a China… E outros países, como a Venezuela. É saber que o mundo também tem portas abertas para nós. E essa é a nossa busca insaciável, no sentido de globalizar mais a nossa marca. Parece difícil, mas acredito que é possível. Não estou a dizer que vamos ser enormes, mas saberem que nós existimos.

Mas, obviamente, tocar nesses países que mencionaste é impressionante. Porque, mesmo os artistas portugueses grandes que tocam em muitos países, normalmente não vão tocar à Índia, ao Azerbaijão ou à Ucrânia. Isso também diz muito de como o afrohouse e a vossa música consegue chegar a circuitos diferentes. Como é que é para vocês actuarem nesses países, distantes da Europa ocidental ou da cultura africana? Suponho que seja diferente.

[Landz] É diferente, mas temos a vantagem que um cantor não tem de a nossa música não ter língua. E nesses países vamos conseguir sempre adaptar-nos, nem que seja com um acapella conhecido desse país, por exemplo. Isso vai-nos safando muito, ao longo destes anos tem-nos safado imenso. 

[Safari] E um país que definiu muito o nosso som foi a Ucrânia. Fomos lá tocar com BPM de 125, e lá tocavam mais entre os 115 e 120. Ou seja, o maior problema não era a nossa música, mas a diferença de velocidades. Portanto, foi começar a observar esse tipo de coisas em cada país.

Quando vão lá fora, têm tocado em festivais de música electrónica, ou eventos mais dedicados ao afrohouse?

[Landz] Temos estado a fazer um pouco de tudo. Festivais, coisas ligadas ao afrohouse, misturas de estilos musicais… Fomos a um festival há pouco tempo mais ligado à música latina e o pessoal também nos abraçou como iguais.

[Safari] Porque num festival há muitos públicos, mesmo que por vezes possam ir só ver um artista. Há uns que se calhar conseguem ouvir música electrónica a noite toda, e outros que não. E o bom, lá fora, é terem palcos de música electrónica. Nós no afrohouse conseguimos ir a vários tipos de eventos, temos abertura para isso. 

[Landz] Falta muito, em Portugal, os festivais terem mais as tendas electrónicas.

E, quando há espaço para a electrónica, diversificar para que música como a vossa também possa entrar, não é?

[Safari] Sim, é por aí. Fazendo um pequeno puxão de orelhas ao game nacional, existe o Brunch Electronik e muitos outros festivais, mas estão muito fechados no techno… Porque não existirem festivais mais amplos de música electrónica, como o Tomorrowland? Temos público para isso.


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