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Fotografia: Raquel Moreira
Publicado a: 26/08/2022

Na última sexta-feira de cada mês, Miguel Santos escreve sobre artistas emergentes que têm tudo para tomar conta do mundo da música.

Abram alas para… Sónia Trópicos

Fotografia: Raquel Moreira
Publicado a: 26/08/2022

O nome que um artista escolhe para si é sempre revelador. Ao contrário do nome que nos dão, o nome que acompanha a arte é quase tão importante como a arte em si. Kendrick Lamar apresenta-se com o seu nome de nascença, sem adornos, e a sua música, pessoal e acessível, espelha essa escolha. King Gizzard and the Lizard Wizard escolheram um nome pantagruélico, perfeitamente adequado a uma banda que só em 2017 lançou cinco álbuns — uma instância em que a quantidade está em sintonia com a qualidade. E com o seu nome artístico, Sónia Trópicos mostra-nos que a sua expressão criativa vai para além da música. 

São vários os trópicos artísticos onde a artista natural da Margem Sul se expressa. Com um passado em design e ilustração, Sónia Margarido já fazia algum trabalho de recolha musical, ponderava ideias sem lhes dar especial importância, como revela numa entrevista ao Rimas. Mas em 2020, depois de descobrir a iniciativa Beats By Girlz e com o auxílio deste grupo, a artista começou a explorar algumas ferramentas sonoras digitais e a aprender passo a passo. Nesse mesmo ano, lançava “Solta”, tema que nos embala com a sua ginga tímida e teclas psicadélicas, e que foi incluído por El Nando numa das TURBO Sessions para a Vodafone FM. 

Depois dessa nunca indispensável mas sempre bem-vinda validação, surgiu uma consagração mais definitiva: em 2021, Margarido venceu o concurso Pulsar, promovido pela colectiva Cosmic Burger e destinado a mulheres criadoras na área da música electrónica. A música de Sónia Trópicos é electrónica, mas há muito calor analógico na maneira como soa. Ouvimos elementos em comum com outros artistas portugueses como Pedro da Linha ou os primeiros trabalhos de Conan Osiris, mas há uma estética indubitavelmente sua nas canções que apresenta. A vitória no Pulsar potenciou o seu EP de estreia, Astral Anormal, um dos lançamentos de destaque deste Verão.

Ouvir este EP é assistirmos ao processo de metamorfose de Sónia Trópicos em tempo real. Ao desvendar a sua curta tracklist, vemo-la de volta ao casulo no final de cada música para surgir renovada no tema seguinte. A fenomenal e catártica “Além da Dor” introduz-nos suavemente a este projecto, enquanto “Vadia Metálica” nos aponta noutra direcção, deixando um sabor metálico na boca com o seu instrumental industrial dançável, canção experimental que se transfigura de forma sucessiva, desafogada e sem medo. São duas abordagens diferentes, unidas pelos esforços da sua autora, que tanto nos pode receber com suaves acordes de teclas ou berbequins electrónicos. Tanto nos pode mostrar a que soa uma insurgência electrónica revolucionária (“Recreio de Vampiros”) como uma pista de dança vazia com parcos leds a iluminar um choro cantado (“Safadinha Triste”). É claro que todas estas borboletas são distintas e voam bem alto.

Astral Anormal é um trabalho de emoções fortes e em sintonia com esses sentimentos, espelhando a sua autora. Adequadamente, viaja por vários tópicos e vários trópicos, mostrando que, além da música, o nome do projecto de Sónia Margarido foi um tiro em cheio. 


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