pub

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 26/11/2021

Na última sexta-feira de cada mês, Miguel Santos escreve sobre artistas emergentes que têm tudo para tomar conta do mundo da música.

Abram alas para… Raquel Martins

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 26/11/2021

Costuma dizer-se que onde se come ficam migalhas, sabedoria proverbial com uma magia única e popular. Mas a verdadeira valência destas pequenas lições passadas de geração em geração é que nos permite abstrair do seu significado literal para o aplicar às mais variadas situações. No caso de Raquel Martins e da sua engenhosa expressão musical, podemos olhar para o que aprendeu com o seu avô — instrumentista nos tempos livres e que tocava, segundo a própria, “sempre numa onda jazz” — como comida para a alma. E se onde se come ficam migalhas, neste caso ficou arte nova e fresca. 

Aos oito anos passou de mirone a intérprete, idade em que começou a tocar as primeiras notas na guitarra. A vontade de escrever canções sempre esteve lá desde o início, mas durante vários anos, Martins via-se apenas como guitarrista. Aos 17 anos, atraída pela música fervilhante que brotava (e brota) de Londres, partiu para a capital inglesa de guitarra às costas e ânsia de se descobrir. Foi nesta cidade e depois de terminar mais uma temporada de estudo das seis cordas que decidiu apostar na sua individualidade: ao seu percurso enquanto guitarrista, que desempenha de forma exímia ao lado de artistas como Poppy Ajudha ou, mais recente, Amaarae, juntou a sua voz suave e aprimorada ao longo dos anos. O resultado está à vista no seu EP de estreia, o inventivo The Way

A virtude da música de Raquel Martins está na sua mistura. Tanto a nível sonoro — há muita coisa a acontecer nas suas músicas, que revela uma atenção ao detalhe e um conjunto sónico com sinergia entre as suas partes — como a nível de influências, a marca musical da artista nortenha é plural e ímpar. “Untrue” consegue encapsular perfeitamente essas influências. Introduz-nos com uma percussão dançável que nos embala suavemente e acompanha uma guitarra perfumada e convidativa, mas depressa a sua atmosfera se altera para algo que nos remete para uma fusão, tema contido que não deixa de expor grandiosamente o seu brilho. Percebe-se que a sonoridade de Raquel Martins está confortavelmente assente no jazz, mas esse conforto permite-lhe abraçar outros horizontes musicais, trazendo a música electrónica e o hip hop para a festa, sem esquecer o delicioso ear candy que sempre foi apanágio da pop, aqui demonstrado sob a forma de riffs intrincados e acordes que soam até ao infinito.

O solo de guitarra de “Show Me” é bastante particular. Além de ser tocado, Martins canta-o à medida que vai dedilhando as notas. É um símbolo de descontracção, de tranquilidade agora atingida por Raquel Martins, que aos 21 anos descobriu a melhor maneira de expressar a sua arte, sendo fiel a si própria. E esta epifania pessoal não passa despercebida a ninguém: Jamie Cullum mostrou este single no seu programa para a BBC Two.

The Way conta a história de uma rapariga portuguesa à descoberta da metrópole londrina, e a explorar-se a si mesma ao fundir as suas influências com a inspiração à sua volta. No final, fica a impressão de que é uma rampa de lançamento para algo maior, e a artista deixa-nos expectantes para a sua próxima fase. Mas como se costuma dizer, a pressa é inimiga da perfeição, e é de bom grado que aguardamos por mais da genialidade de Raquel Martins.


pub

Últimos da categoria: Abram alas para...

RBTV

Últimos artigos