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Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 24/02/2023

Na última sexta-feira de cada mês, Miguel Santos escreve sobre artistas emergentes que têm tudo para tomar conta do mundo da música.

Abram alas para… India Sky

Fotografia: Direitos Reservados
Publicado a: 24/02/2023

Os primeiros minutos de “Like a Wave” tornam claro o manifesto da música de India Sky: uma sensação de presença que se estende para além das suas notas. A sua progressão e a maneira como arranja os sons e os mistura mostram uma abordagem mais conceptual, cuidadosamente planeada para guiar o ouvinte pela performance que se forma à frente dos seus ouvidos. Não é por acaso que apesar de o seu álbum de estreia ter sido lançado há menos de um mês, o caminhada da artista seja mais vasta e multidisciplinar. 

Além da parte sonora, o percurso desta artista norte-americana multiplica-se por áreas como a dança ou a realização. Depois de concluir os estudos em Ohio em 2008, India Sky Davis fixou-se em Oakland, em 2012, e desde essa altura que o seu trabalho tem sido focado em criar um espaço de expressão artística para a sua arte e para a comunidade queer. Foi nesse ano que fundou a colectiva Topsy Turvy Queer Circus, uma plataforma de dinamização cultural da Bay Area e que conta com um elenco composto exclusivamente por minorias, pessoas trans e queer. A palavra-chave é colaboração, e se a expressão artística de Davis é aparente, também é a maneira como trabalha com as pessoas que a rodeiam, tendo até colaborado com a artista de pop experimental Spellling. Todo este trabalho informa a música de India Sky.

O seu trabalho é populado por paisagens etéreas que dividem o espaço irmãmente com ricos arranjos sonoros. A sua música está cimentada num universo electrónico e pop, e “Bottom of the Sea” – o seu single de estreia – é perfeito para nos receber na inauguração da primeira discoteca no fundo de um oceano e um convincente cartão de visita para a sua música. O primeiro instinto é a dança, mas por trás dos seus acordes expectantes esconde-se algo menos físico e mais espiritual, de deixar-se levar pela corrente. Seguiu-se “Breakdown”, um tema que se mostra mais ambicioso pela mão dos sintetizadores dilacerantes que desaguam numa batida acelerada e rasgada por uma guitarra urgente. É progressiva, delicadamente orquestrada, um longo suspiro que traz à memória toda uma relação que significou tudo e que agora é nada. 

Em Fevereiro de 2023 chega a estreia oficial em longa-duração: Somewhere Over The Mystic Moon surge para abrir horizontes, um projecto que começou como a banda sonora da curta-metragem realizada por India Sky, The Lifecycle of Rainbows, e cinco das nove músicas foram construídas com esse propósito. Mas não é preciso fazerem parte de um filme para se sentir que são encenadas e cuidadosamente construídas. A experiência passada de Davis faz com que a sua abordagem musical seja mais refinada do que alguém que está a dar os primeiros passos da sua carreira musical. Mas ainda que soe mais consolidada, há espaço nesta obra para a experimentação como as curtas “Mirrors” e “The Moon” demonstram, a descoberta da artista destilada em teclas xilofonistas e arpejos subaquáticos. 

Depois de sermos recebidos por uma “Dark Symphony” de cordas desconfortáveis, o álbum termina com a esperançosa “I Pray” e o seu êxtase de gospel digital. É uma viagem cósmica de pouco mais de 30 minutos, com música coreografada com mestria por alguém que está habituada a fazê-lo com pessoas. Trocam-se humanos por sons mas o resultado final é o mesmo: uma obra abrangente, estimulante e curiosamente cativante. É assim a arte de India Sky, veterana na expressão e que aplica agora os seus dotes na música.


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